1. Introdução
Os rios da Amazônia estão sujeitos a um período de enchentes, durante o qual a água transborda dos seus leitos e invade as áreas marginais, inundando-as em diferentes graus de intensidade. A maioria dos rios traz em suas águas consideráveis quantidades de sedimentos e no transcorrer das enchentes esses detritos minerais e orgânicos se depositam sobre as margens, proporcionando grande fertilidade e valor para a produção intensiva de alimentos (Lima, 1986). O processo de sedimentação se repete em todas as inundações e o incremento de fertilidade resultante de novas colmatagens permite a exploração agrícola dessas áreas, anos consecutivos, sem que haja declínio da produtividade que comprometa os resultados econômicos das culturas agrícolas. As primeiras tentativas de utilização agrícola das várzeas da Amazônia brasileira remotam ao início do século XVIII e foram realizadas pelos padres jesuítas, carmelitas e fransciscanos, nas fazendas estabelecidas no estuário amazônico (Lima, 1986). As várzeas litorâneas são aquelas formadas no baixo curso dos rios que desaguam diretamente no Oceano Atlântico, tendo as suas nascentes próximas ou distantes da orla marítima. Estão localizadas na costa amapaense, nordeste do Pará e noroeste do Maranhão. Dentre os rios em que ocorre esse tipo de várzea destacam-se o Araguari, Flechal, Calçõene, Cassiporé, Oiapoque e Uaçá, no Amapá; o Pericumã, Turiaçu e Maracassumé, no Maranhão e Marapanim no Pará (Lima, 1986).
2. Pastagens Nativas
As pastagens nativas têm desempenhado um papel extremamente importante na região Amazônica. Até início da década de 60, antes do advento das rodovias de integração da Amazônia, a pecuária de corte na região era baseada quase que exclisivamente na exploração extensiva das pastagens nativas. Com a abertura das rodovias de integração, que propiciaram a expansão da pecuária em áreas de floresta, as pressões sobre as pastagens nativas foram reduzidas. No entanto, a utilização mais intensiva dos ecossistemas de pastagens nativas poderá contribuir para a diminuição da pressão da pecuária nas áreas de floresta da região (Serrão, 1986). Seghundo a Embrapa, considerando-se o aspecto hidrológico, as pastagens nativas da região Amazônica foram classificadas como pastagens nativas de áreas inundáveis – que incluem as áreas de pastagens sujeitas a inundações permanentes ou periódicas, como as áreas de pastagens das várzeas do baixo e médio Amazonas e os campos da ilha do Marajó – e as pastagens nativas de terra firme, que incluem as pastagens nativas de savanas tipo cerrado (Serrão e Simão Neto, 1975; Serrão e Falesi, 1977).
2.1 Campos Inundáveis do Amapá
As formações pioneiras compreendem áreas sedimentares de formação recente, ocupando uma faixa litorânea desde a fos do rio Oiapoque até o estuário do rio Amazonas. Abrange uma superfície de 17.445 km2. As formações pioneiras compreendem áreas sedimentares de formação recente, ocupando uma faixa litorânea desde a fos do rio Oiapoque até o estuário do rio Amazonas. Abrange uma superfície de 17.445 km2, equivalente a 12,44% do Amapá, sendo representada por duas sub-regiões: mangues e campos inundáveis. Os solos da região são principalmente os Hidromórficos Gleyzados e em pequena escala as Lateritas Hidromórficas (Brasil, 1979). Os Gleyzados desenvolveram-se sobre sedimentos recentes, com textura de franco-argilo-siltoso e argilo-siltoso, mal drenados, de boa fertilidade e moderada acidez. As Lateritas são formadas por sedimentos terciários e quartenários, ocorrendo nos tesos e em áreas baixas inundáveis. Possuem fertilidade natural baixa, elevada acidez e drenagem imperfeita (Peres et al., 1974).
As pastagens dos campos do Amapá são de excelente qualidade, destacando-se a ocorrência de Leersia hexandra, Hymenachne donacifolia, H. amplexiscaulis, Echinochloa polystachia e Oryza perennis. Em locas com influência marítima observa-se a ocorrência da grama-preta (Ericochloa sp.)(Black, 1950; Dantas et al., 1983). Nas partes baixas, em locais sempre alagados, a vegetação tm maior porte e é composta por aninga (Montrichardia arborescens), tiriricão (Scleria sp.), buriti (Mauritia flexuosa) e piri (Cyperus giganteus)(Leite et al., 1974).
Os criadores adotam um sistema ultra-extensivo deixando os animais sujeitos às variações estacionais das pastagens nativas. As propriedades não apresentam cercas divisórias e piquetes, não havendo controle da taxa de lotação e manejo das pastagens. Para a Embrapa Amapá, a criação de bovinos caracteriza-se por um sistema migratório. Durante a estação chuvosa, os animais permanecem nas pastagens nativas dos cerrados, quando ocorre uma significativa perda de peso dos animais, devido à baixa capacidade nutricional das pastagens. No início do período seco, os campos inundáveis começam a secar dando lugar a extensas áreas de pastagens nativas de bom valor nutritivo, para onde os bovinos são transferidos. Nestas pastagens, os animais apresentam rápida recuperação obtendo ótimos índices de ganho de peso. Os bubalinos utilizam principalmente as pastagens da região dos lagos. No período das enchentes os tesos são utilizados como refúgio pelos rebanhos. Os búfalos vêm obtendo melhores índices zootécnicos, devido a sua melhor adaptação ao pastejo em áreas alagadas, consumindo durante o ano todo, pastagens de boa qualidade nutricional. A falta de um manejo adequado tem contribuído para o aumento da ocorrência de plantas invasoras, notadamente o algodão-bravo (Ipomoea fistulosa), a salsa (Ipomoea asarifolia) e dos mururés (Eichornia spp.), as quais predominam em áreas intensamente pastejadas, geralmente próximo aos currais (Mochiutti e Meirelles, 1994).
Trabalhos realiados pela Embrapa Amapá constataram que as práticas de manejo restringem-se a transferência dos animais de uma região para outra; proteção contra animais selvagens e marcação. A mineralização não é utilizada e os poucos casos restringem-se ao sal comum. A estação de monta e o piquete maternidade não são utilizados e a desmama é natural. Entre os bovinos há uma tendência natural de aumento de pariçoes no período de agosto a outubro, enquanto que para os bubalinos a concentração dos nascimentos ocorre de agosto a novembro. A vermifugação é realizada em algumas propriedades, no máximo duas vezes ao ano, principalmente nos animais jovens. Há uma grande incidência de verminose gastrintestinal e pulmonar, notadamente em animais jovens. A dispersão da brucelose é facilitada pela grande quantidade de água acumulada e promiscuidade dos animais, que transitam livremente de uma fazenda para outra. Os bubalinos têm apresentado maior resistência à aftosa, com sisntomas mais brandos, além de recuperação mais rápida (Alves et al., 1992).
A bacia leiteira do Amapá é inexpressiva, sendo o Estado dependente quase que totalmente da importação de leite em pó para o abastecimento local. Atualmente, a produção diária é um pouco superior aos 8 mil litros, o que proporciona uma produção anual de 3.062 milhões de litros (Bressan et al., 2002). A produção média diária por produtor é inferior aos 20 litros. O rebanho é formado por animais mestiços Girolandos, sendo a consagüinidade comum na maioria das proriedades. A produção média é de 3,0 litros/vaca/dia.
Conclusões
As pastagens nativas de savanas mal drenadas e de solos aluviais devem continuar desempenhando um papel relevante no desenvolvimento da pecuária da Amazônia. Apesar de serem ecossistemas frágeis, ecologicamente são mais estáveis, desde que submetidos a práticas de manejo adequadas. O estabelecimento de uma pecuária mais competitiva na região exigirá a adoção de um conjunto de medidas que viabilizem a exploração pecuária, tanto em bases agronômicas quanto econômicas. A seleção de germoplasma forrageiro mais produtivo e adaptado às condições ecológicas da região; a utilização de práticas de manejo de solo (correção e adubação); a integração entre as pastagens nativas e cultivadas e o manejo reprodutivo e sanitário dos rebanhos são práticas que podem contribuir de forma significativa para o aumento da competitividade da pecuária, conciliando produtividade animal com sustentabilidade econômica, social e ambiental
Referências Bibliográficas
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Newton de Lucena Costa - Chefe Geral da Embrapa Amapá