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Presença de curso de água nas suinoculturas catarinenses e sua relação com o efetivo de animais e vínculo produtivo



Julio Cesar Pascale Palhares

Presença de curso de água nas suinoculturas catarinenses e sua relação com o efetivo de animais e vínculo produtivo - Palhares, J.C.P.; Guidoni, A.L.
Um dos conflitos vigentes, em que de um lado se encontram os órgãos públicos e comunidade e de outro os suinocultores e agroindústrias, nas regiões de concentração suinícola é quanto a necessidade de conservação e recuperação das matas ciliares, conflito este que é agravado devido as seguintes características: o tamanho médio destas propriedades é de 20 ha; o relevo acidentado nas regiões do Meio Oeste e Oeste Catarinense, tradicionais produtoras de suínos, onde as áreas que deveriam apresentar estas matas são as mais planas e férteis da propriedade, ou seja aptas à agricultura; ao manejo ambiental vigente, que é o de disposição dos dejetos de suínos no solo, prática proibida pela legislação ambiental nestas áreas; ao uso dos corpos d’água como bebedouros para os bovinos de leite, produção também muito presente nas propriedades suinícolas.
Dois fatos recentes expressam a difícil mediação deste conflito. As negociações ocorridas e que ainda estão ocorrendo sobre o tema na implementação do Termo de Ajustamento de Conduta da Suinocultura AMAUC/Consórcio Lambari, o qual entre outros permitiu que a recuperação se dê de forma escalonada, sendo a exigência inicial de 10 m de mata ciliar, completando-se 30 m ao final do termo. Um outro fato é o movimento liderado por deputados federais de vários estados para que se promovam mudanças no Código Florestal do país no que diz respeito as metragens da mata ciliar.
A importância ambiental destas matas é indiscutível, pois estas retêm a umidade nos solos e funcionam como uma barreira física à poluentes e contaminantes para que estes não degradem a qualidade das águas superficiais. A existência desta barreira torna-se fundamental devido ao intenso uso de dejetos de suínos como adubo, os quais são fontes de nitrogênio, fósforo, potássio, cobre, zinco e outros macro e micronutrientes para as águas além de bactérias como as do grupo coliformes fecais.
O Código Florestal brasileiro determina, a partir de características do curso d’água, a metragem que a mata ciliar deve possuir, sendo um mínimo de 30 m em cada margem.
O objetivo deste trabalho foi diagnosticar a presença de cursos d’água nas suinoculturas catarinenses, relacionando esta presença com o efetivo de animais e vínculo produtivo do suinocultor.
Os dados trabalhados neste artigo foram obtidos da base de dados do Levantamento Agropecuário de Santa Catarina (LAC-2002/2003), através de contrato de parceria firmado entre Embrapa/Epagri no 200.1778/05.
A partir da declaração da presença ou ausência de cursos de água, os suinocultores foram questionados a respeito da largura destes. Para fins deste estudo foram estipulados os seguintes intervalos: cursos de água até 10 m; de 10 m a 50 m ; maior do que 50 m.
Optou-se trabalhar somente com os suinocultores que apresentassem um efetivo de animais maior do que 51 cabeças, sendo os outros planteis desconsiderados, apesar de representarem um grande número de suinocultores, mas com baixa representatividade no total de cabeças no Estado de Santa Catarina. Portanto quanto ao efetivo animal, os suinocultores foram classificados em: de 51 a 100 cabeças, de 101 a 500 cabeças, de 501 a 1.000 cabeças e mais de 1.000 cabeças.
Para classificação do vínculo produtivo considerou-se as seguintes realidades: integrado da agroindústria, parceiro da agroindústria, integrado de particular e independente.
As variáveis e respectivos cruzamentos obteve-se a partir dos parâmetros populacionais no Estado de Santa Catarina: o número de estabelecimentos e respectiva porcentagem por categoria da reposta. Destaca-se que as respostas fornecidas pelos entrevistados tiveram caráter declaratório.
As consultas à base de dados e os cálculo foram realizados através do pacote SAS 2002-2003, versão 9.1.3.
Dos 7.257 suinocultores entrevistados, 4.443 (61,3%) declararam possuir curso d’água na propriedade e 2.806 (38,7%) não possuíam. Esta informação atesta os constantes conflitos sobre a necessidade de matas ciliares em propriedades suinícolas, pois a maioria dos produtores possuem curso d’água, devendo conservar ou recuperar a vegetação ciliar, o que acarreta investimentos e perda de área destinada a agricultura.
Quanto a largura destes cursos d’água, 55,62% estão abaixo de 10 m; 3,98% entre 10 m e 50 m; 0,95% acima de 50 m. Segundo o Código Florestal, a maior parte deste cursos d’água devem possuir uma faixa de 30 m de mata ciliar em ambas as margens. A partir destes dados, políticas governamentais podem ser delineadas, visando financiamentos, assistência técnica, projetos técnicos de manutenção e recuperação que atendam a esta maioria de 4.036 propriedades. Deve-se destacar que estas políticas não devem abranger somente a suinocultura, mas também todas as outras atividades rurais.
Na Figura 1, observa-se a distribuição dos suinocultores que possuíam curso d’água e seu vínculo produtivo. Considerando os integrados e parceiros, ambos vinculados as agroindústrias, estes suinocultores representaram 70% do total. Esta maioria demonstra a necessidade da agroindústria ser co-responsável na manutenção e recuperação das matas ciliares de seus integrados e parceiros, isto além dos benefícios ambientais, propiciaria agregação de valor a marca destas agroindústrias devido a importância que os consumidores conferem a conservação destas áreas. Outro dado importante é que 20% dos suinocultores independentes possuíam curso d’água, informação necessária para o delineamento de estratégias pela Associação Catarinense de Criadores de Suínos, governos municipais e Epagri.
A relação entre o efetivo de animais e a presença de curso d’água pode ser observada na Figura 2. Somando-se o porcentagem de suinocultores com efetivo de 501 a 1.000 animais e com mais de 1.000 animais, tem-se um total de 25% dos respondentes. Se maiores escalas de produção proporcionam maiores ganhos, pode-se concluir que estes produtores seriam mais capitalizados, possibilitando investimentos próprios na manutenção e recuperação de suas matas ciliares. A porcentagem de pequenos suinocultores, com efetivo de 51 a 100 animais, foi expressiva e talvez seriam estes os mais necessitados de linhas de financiamento para conservação da faixa ciliar.
A maior parte dos suinocultores que possuíam curso d’água encontrou-se no intervalo de efetivo entre 101 e 500 animais, demonstrando que se as políticas e estratégias para recuperação das matas ciliares iniciarem-se com esta classe de produtores, a melhoria da qualidade das águas superficiais será significativa, bem como da qualidade de vida das comunidades localizadas no entorno destas produções.
Este diagnóstico pode ser utilizado como subsídio por governos, agroindústrias, associação de produtores e comunidade em geral para o delineamento de políticas e estratégias relativas a manutenção e recuperação das matas ciliares no Estado de Santa Catarina, sendo que análises mais aprofundadas do Levantamento Agropecuário Catarinense possibilitarão identificar quais os municípios mais demandantes em mata ciliar e como está presente a suinocultura nestes. Relacionando-se estes dados com os de qualidade das águas superficiais, gerados por companhias de saneamento e outras instituições, irá se ter um amplo diagnóstico para tomada de decisões.
As informações também servem de subsídio para a implementação de futuros termos de ajustamento de conduta, pois proporciona cenários que devem ser considerados na redação da cláusula referente ao tema.

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