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Pluma de algodoeiro transgênico: destinação final razoável.


Reginaldo Minaré

O Juiz da 3ª Vara Federal de Belo Horizonte, Ricardo M. Rabelo, autorizou, nos autos do Processo nº 2006.38.00.023088-3, o beneficiamento de 140 toneladas de algodão geneticamente modificado resistente ao herbicida glifosato, a comercialização da pluma resultante e determinou que os caroços ou "sementes" retiradas no processo de beneficiamento sejam armazenadas em locais apropriados sob a responsabilidade do cotonicultor.

A decisão do Juiz Federal vai ao encontro do que o setor, representado pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão – ABRAPA, vem requerendo, sem sucesso até o momento, junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA. 

            O MAPA, fiscalizando lavouras de algodão nos meses de abril e maio de 2006, detectou, em amostras coletadas nas lavouras, a proteína cp4-epsps que indica presença de cultivar geneticamente modificada resistente ao herbicida glifosato, evento de transformação genética ainda não autorizado para uso comercial em percentual superior a 1% nas lavouras convencionais.

Identificou também o MAPA, durante a ação de fiscalização, a utilização de sementes de cultivar não inscrita no Registro Nacional de Cultivares – RNC. Com a detecção do organismo geneticamente modificado - OGM e a identificação do uso de semente não inscrita no RNC, os agentes do MAPA lavraram o Auto de Infração.

Após a ação de fiscalização, o MAPA solicitou à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio, orientação sobre possíveis alternativas de descarte ou destruição das lavouras de algodão geneticamente modificado.

Em resposta, a CTNBio aprovou o Parecer nº 587/06 que dispõe sobre "orientação a órgão e entidade de registro e fiscalização", onde apresenta uma série de alternativas para a destruição e descarte das lavouras.

O MAPA, possivelmente por entender que não seria necessário destruir as plantações, não o fez e atualmente elas já foram destruídas no processo de colheita. O que se tem agora é o produto colhido, ou seja, pluma e caroço de algodão.

Nas defesas apresentadas nos processos administrativos, os agricultores autuados solicitaram ao Ministério da Agricultura a permissão para processar o produto colhido, comercializar a pluma e destruir os caroços ou "sementes" em processo de produção de biodiesel ou enterrando-os.

Porém, o fato da CTNBio ter incluído no Parecer 587 a frase -"em hipótese alguma o produto colhido (sementes e fibras) deverá ser utilizado e sim totalmente enterrado"- que claramente destoa do sentido orientador do Parecer, criou dificuldade para o MAPA acatar o pedido comum dos agricultores.

Inconformada com a situação, a ABRAPA, atendendo pleito de seus associados, solicitou à CTNBio a revisão da decisão contida no Parecer 587, especificamente da frase relacionada ao impedimento da utilização da fibra colhida, para assim viabilizar a autorização do beneficiamento do produto colhido e a comercialização da pluma.

Em resposta, por meio da Carta nº 414 de 15/09/06, a CTNBio informou que se manifestou, solicitada pelo MAPA, somente quanto aos procedimentos técnicos para a destruição das plantas que resultassem em dano mínimo ao meio ambiente, e que caberia ao MAPA operacionalizar e fiscalizar os procedimentos.

Diante da resposta da CTNBio, que reafirmou o caráter orientador do Parecer 587 e não reiterou o impedimento à utilização do produto colhido, a ABRAPA solicitou ao Ministério da Agricultura, que autorize o produtor rural que foi autuado a processar o produto colhido em sua lavoura, comercializar a pluma (que não é um organismo geneticamente modificado – OGM) e exigir a destruição dos caroços ou "sementes geneticamente modificadas" (que são OGM), e dos caroços ou "sementes" que não são geneticamente modificadas mas que procedem de cultivar não inscrita no RNC.

Evidente, que atendendo o pleito formulado pela ABRAPA, o Ministério da Agricultura estará agindo dentro da mais estrita legalidade. Visto que o que é solicitado encontra respaldo nas Leis 11.105/05 (Lei de Biossegurança) e 10.711/03 (Lei que dispõe sobre o Sistema Nacional de Sementes e Mudas)

Todavia, o pedido feito pela ABRAPA, Processo nº 70000.007069/2006-43, foi apresentado ao MAPA no dia 21/09/06 e até o momento os agricultores estão esperando resposta.

Atualmente o produto colhido está, em sua maioria, armazenado ao relento, protegido apenas por lona plástica, e com o início do período de chuvas a perda deste produto será inevitável. A liberação da oleosidade das sementes manchará a pluma, e a qualidade do produto ficará comprometida. Além disso, as usinas de beneficiamento de algodão possuem funcionamento sazonal, que se encerra logo após o término da safra que foi concluída no mês de setembro. Uma vez encerrado o período de funcionamento, devido ao contrato de fornecimento de energia e da mão-de-obra contratada para o beneficiamento da safra, suas atividades não são retomadas.

Resta claro, portanto, que a decisão do Juiz Federal não poderia estar revestida de maior cautela, razoabilidade e justiça, visto que autoriza o processamento do produto colhido, a comercialização da pluma e exige que os caroços ou "sementes" sejam devidamente armazenados. Agindo assim, o Juiz atuou no sentido de garantir a biossegurança e minimizar o prejuízo dos cotonicultores.

Cabe ainda observar que em hipótese alguma a decisão judicial caracteriza impunidade. Os agricultores, além de penalizados com a destruição das sementes, estarão sujeitos, no âmbito do processo administrativo, às sanções previstas tanto na Lei de Biossegurança quanto na Lei de Sementes e Mudas.

            Poderia, portanto, o Ministério da Agricultura, em atenção aos princípios da legalidade, eficiência e razoabilidade, firmar entendimento semelhante e evitar maior prejuízo aos agricultores e maior custo administrativo para a solução do problema.

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