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Oportunidades de mitigação das emissões de gases de efeito estufa no setor agropecuário


Caroline Jácome Costa

Um inventário realizado em 2007 pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) com o objetivo de caracterizar os diferentes setores da economia quanto à sua contribuição relativa para as emissões de gases de efeito estufa concluiu que o setor energético é responsável por 86,4% das emissões, seguido pelo setor agropecuário (6,3%), setor industrial (4,5%), geração e tratamento de resíduos (2,7%) e uso de solventes e outros produtos (< 1%).

No Brasil, diferentemente dos países industrializados e em razão da elevada participação de energia renovável (geração de eletricidade a partir de hidrelétricas, uso de álcool no transporte e bagaço de cana-de-açúcar e carvão vegetal na indústria) na matriz energética brasileira, a maior parcela das emissões do principal gás de efeito estufa, o dióxido de carbono (CO2), é resultante da mudança do uso da terra, em particular da conversão de florestas para uso agropecuário, que responde por 75,4% das emissões totais deste gás. Ainda assim, o setor agropecuário é responsável por parcela significativa das emissões de outros dois gases de efeito estufa, o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O). De acordo com o inventário nacional de emissões de gases de efeito estufa, que tem 1994 como o ano base para os levantamentos, o setor agropecuário é responsável por 91,5% das emissões de N2O e 77,1% das emissões de CH4.

As emissões de N2O decorrem, principalmente, da aplicação de fertilizantes nitrogenados e da deposição de dejetos de animais em pastagens e as emissões de CH4 derivam, essencialmente, do processo de fermentação entérica em ruminantes.

Todavia, o setor agropecuário oferece alternativas para a mitigação da mudança do clima, através da adoção de práticas conservacionistas que previnam a erosão do solo, seqüestrem carbono e estimulem o consumo de CH4. Da mesma forma, o manejo racional da fertilização das culturas pode reduzir as emissões de N2O e evitar impactos adversos à qualidade da água. O manejo da dieta e da deposição dos resíduos animais também pode reduzir as emissões de CH4 e N2O provenientes do setor agropecuário.

Sob esse aspecto, a implementação de práticas que favoreçam o seqüestro de carbono sob a forma de matéria orgânica do solo, como o cultivo mínimo, o plantio direto, a rotação de culturas, sobretudo com a inclusão de leguminosas no sistema de produção, permitem o armazenamento de carbono a longo prazo no solo, evitando seu retorno à atmosfera sob a forma de CO2. Estima-se que o tempo médio de residência da matéria orgânica do solo situa-se entre 250 e 1900 anos. Para atingir essa condição, o carbono seqüestrado no solo necessita estar protegido da degradação microbiana, seja formando micro-agregados (250 microns) estáveis, seja adsorvido na superfície interna das argilas que compõem o solo ou complexado sob a forma de compostos organo-minerais. Além dos benefícios relacionados ao seqüestro do carbono em si, tais práticas favorecem a melhor estruturação do solo, aumentando a retenção de água, o controle à erosão e, em geral, envolvem menor utilização de energia no sistema de produção como um todo, o que reduz as emissões de CO2 decorrentes da queima de combustíveis fósseis.

Em relação às emissões de CH4 decorrentes da fermentação entérica em ruminantes, sabe-se que os principais fatores que afetam a produção de CH4 são a quantidade de forragem ingerida pelo rebanho e a sua composição. Desse modo, o manejo adequado da nutrição animal pode modificar a produção entérica de CH4 ao alterar a taxa de degradação da forragem, o tipo de metabólitos intermediários gerados ao longo do processo digestivo e a eficiência do metabolismo das bactérias residentes no trato gastrintestinal dos ruminantes. Dessa forma, alguns trabalhos indicam a possibilidade de redução das emissões entéricas de CH4 através de modificações na dieta dos animais, como a incorporação de compostos com potencial de alterar a flora ruminal, a suplementação com óleos vegetais e o aumento da proporção de concentrado na dieta.

Da mesma forma, o manejo racional da adubação nitrogenada, de modo a atender às exigências das culturas na quantidade, forma e no momento adequado, considerando as peculiaridades de cada região quanto ao regime hídrico, as características do solo e a temperatura local, é a melhor estratégia para reduzir as emissões de N2O decorrentes dos processos de nitrificação e desnitrificação nos solos agrícolas.

Nesse sentido, é preciso que os esforços da pesquisa agropecuária sejam concentrados no sentido de conhecer os impactos dos principais sistemas de produção nas emissões de gases de efeito estufa, aprimorando práticas tradicionalmente adotadas, assim como subsidiando o desenvolvimento e a adoção de novas práticas que sejam técnica e economicamente viáveis. Além disso, a interação entre o solo, o clima e os diferentes arranjos produtivos adotados precisa ser analisada sob uma perspectiva global, que avalie realisticamente a contribuição de cada prática quanto ao seu potencial de mitigação das emissões de gases de efeito estufa, visto que se muitas delas podem, por um lado, favorecer o seqüestro de carbono e a redução das emissões de CO2 podem, por outro lado, elevar as emissões de N2O em razão do estabelecimento das condições ambientais ideais aos processos microbiológicos de nitrificação e desnitrificação.

É possível que, no âmbito dos acordos internacionais que tratam da questão das mudanças climáticas globais, a contribuição do setor agropecuário seja levada em consideração para o estabelecimento de futuros compromissos de redução das emissões de gases de efeito estufa, dada a sua relevância no balanço global.

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