
O noticiário desta semana trouxe destacadamente o desfecho da Rodada de Doha, enfocando principalmente o seu fracasso depois de mais de sete anos de intensas negociações. Apesar de parecer um tema distante do dia-a-dia do produtor brasileiro em geral, e do fornecedor de cana, em particular, os resultados poderiam alargar o mercado para os produtos nacionais do agronegócio e também para o etanol, o que, logicamente, traria ganhos para todas as cadeias de produção.
Apesar das expectativas criadas em torno das negociações, não houve avanços. A rodada de conversações, iniciada em Doha, capital do Qatar, no Oriente Médio, em 2001, tinha o objetivo de liberalizar o comércio de produtos agrícolas, industriais e serviços entre os 153 países-membros da OMC (Organização Mundial do Comércio). Em funcionamento desde 95 e com sede em Genebra, a OMC trata das regras sobre o comércio entre as nações e também funciona como um árbitro em conflitos gerados pela aplicação de acordos comerciais entre seus membros.
A Rodada de Doha deveria ser encerrada em 2004, mas se arrastou até a semana passada. Na mesa das negociações havia uma queda-de-braço entre as grandes nações, como os Estados Unidos e União Européia, interessadas em ampliar espaço para sua indústria, e os emergentes, como os BRICs (sigla para Brasil, Rússia, Índia e China), fortes na produção agrícola e que defendiam a redução dos subsídios à agricultura nos países ricos para que seus produtos se tornassem mais competitivos e ganhassem mercados.
Durante a negociação, os países ricos admitiam uma certa redução dos subsídios aos seus produtores, desde que as nações em desenvolvimento abrissem espaço aos produtos deles. E foi nesse ponto que a rodada desandou. Pela proposta apresentada na OMC, os países em desenvolvimento podiam limitar as importações quando elas aumentassem até 140%. A partir daí, aplicariam uma tarifa 15% acima da máxima. A Índia e a China defenderam uma sobretaxa maior para proteger seus agricultores e suas indústrias, enquanto os Estados Unidos não aceitaram essa flexibilização.
Como o Brasil é um gigante no comércio mundial de produtos do agronegócio, também perdeu com o fracasso da rodada. Havia uma expectativa especial em torno do etanol. O Brasil defendeu a inclusão do biocombustível na lista de produtos ambientais que, por sua contribuição em conter a mudança climática e preservar o meio ambiente, teriam livre acesso a todos os mercados, em vez de serem submetidos às tarifas de importação.
Para entrar nos Estados Unidos, o etanol brasileiro paga uma taxa de US$ 0,54 por galão e uma tarifa regular de importação de 2,5% sobre o valor do produto. Já a União Européia estabelece cotas de importação. Com o fim da rodada, os países terão de partir para outras estratégias para tentar abrir mercados, já que não há previsão de quando ocorrerá nova rodada. O Brasil pode recorrer, por exemplo, a acordos bilaterais, mas também cogita questionar as barreiras sobre o etanol brasileiro na OMC. O certo é que tentar mudar as regras do comércio internacional é mexer em vespeiros. Mas o Brasil não pode recuar na tentativa de abrir espaço. O agronegócio brasileiro tem um potencial extraordinário e quanto maior o mercado, melhor será para todos os elos das cadeias de produção.