CI

O que são substâncias puras, quimicamente definidas, para fins de aplicação da lei da biossegurança?


Reginaldo Minaré

Incisos do artigo 3º da Lei 11.105/05 (Lei de Biossegurança) que disciplina a produção e o uso de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, estabelecem que OGM é o organismo cujo material genético, ácido desoxirribonucléico – ADN e ácido ribonucléico – ARN, foi modificado por qualquer técnica de engenharia genética, e derivado de OGM aquele produto obtido de OGM, mas que não possui capacidade autônoma de replicação ou que não contém forma viável de organismo modificado. Neste mesmo artigo, o inciso IV define engenharia genética como atividade de produção e manipulação de moléculas de ADN/ARN recombinante.

Logo após as definições contidas nos incisos acima mencionados, mais precisamente no § 2º deste artigo 3º, a Lei 11.105/05 dispõe que não se inclui na categoria de derivado de OGM a substância pura, quimicamente definida, obtida por meio de processos biológicos e que não contenha OGM, proteína heteróloga ou ADN recombinante.

Entretanto, analisando as definições que a Lei 11.105/05 e a exceção apresentada no § 2º do mencionado artigo 3º, verifica-se que o legislador não definiu quando se deverá considerar uma proteína como heteróloga para fins de interpretação e aplicação do dispositivo que isenta as substâncias puras, quimicamente definidas, dos procedimentos exigidos pela Lei 11.105/05.

Oriunda da junção do elemento de composição hétero, do grego héteros, que designa a idéia de outro, de diferente, e do também elemento de composição pospositivo logo, do grego lógos, que desempenha função de indicação, de definição, o termo heterólogo pode ser compreendido como propriedade ou substância que são semelhantes na aparência, mas compostas de elementos diferentes pela origem ou pela estrutura e, também, como propriedade ou substância obtida de um ser vivo de outra espécie.

Diante das significações possíveis da palavra heteróloga, uma proteína que for produzida por uma vaca geneticamente modificada, que antes só era produzida pelo homem, pode ser considerada homóloga e heteróloga ao mesmo tempo, ou seja, caso a substância produzida pela vaca não seja diferente daquela produzida pelo homem, poderá ser considerada uma substância homóloga àquela, todavia esta mesma substância, pelo fato de ser uma proteína originária de animal de outra espécie, pode ser considerada heteróloga para a vaca que, por ter recebido gene extraído de outra espécie, passou a produzi-la, por exemplo, em seu leite.

Além das possibilidades acima observadas, cabe ressaltar que quando esta substância pura, quimicamente definida, apresentar em sua composição uma proteína que, por alteração sofrida ao longo do processo produtivo seja, por conter elemento diferente em sua estrutura, apenas semelhante àquela produzida pelo ser vivo doador do gene, no caso do exemplo o homem, será considerada um derivado de OGM por conter uma proteína heteróloga, ou seja, uma proteína diferente. Neste caso, a substância pura, quimicamente definida, pode ser considerada um derivado de OGM tanto por conter uma proteína heteróloga àquela originalmente produzida pelo organismo doador do gene, quanto por ser heteróloga ao animal que a está produzindo.

Analisando o exemplo posto, as definições e a exceção contidas na Lei 11.105/05, pode-se afirmar, com segurança, que: a vaca é um OGM; quando abatida se tornará um derivado de OGM; e que a substância pura, quimicamente definida, que for extraída do leite desta vaca conter uma proteína diferente ou heteróloga àquela que é produzida pelo doador do gene, será considerada um derivado de OGM.

 Todavia, esta mesma segurança na afirmação não é possível quando a substância pura, quimicamente definida, for idêntica àquela produzida pelo doador do gene, pois poderá ser considerada homologa à proteína de interesse mas heteróloga para a vaca que passou a produzi-la.

Diante do que até aqui foi observado, resta claro que a interpretação que apresenta maior razoabilidade é aquela centrada no produto final, ou seja, quando a substância pura, quimicamente definida, não diferir daquela produzida pelo doador do gene, não deverá ser considerada derivado de OGM por ser heteróloga ao organismo que a produziu.

Importante a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio firmar entendimento sobre este tema, visto se tratar de um dos mais promissores segmentos da engenharia genética.

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.