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O perigoso desgaste das instituições



Manoel Carlos Ortolan

Depois do Executivo e do Legislativo, a crise arranha o Judiciário brasileiro. Tudo começou com mais uma das investigações da Polícia Federal, batizada de Satiagraha, termo em sânscrito traduzido como ‘caminho da verdade’. A operação foi deflagrada aos olhos da sociedade na madrugada de 8 de julho, quando o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta foram detidos em suas casas.

As prisões foram acompanhadas pelas câmeras de tevê e começava ali, com o Pitta de pijama, mais um espetáculo à sociedade e uma perigosa queda-de-braço entre instâncias do Poder Judiciário e entre a Justiça e a Polícia Federal. Daniel Dantas foi solto rapidamente, por ordem do presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que suspendeu a prisão preventiva decretada pelo juiz federal Fausto de Sanctis. De Sanctis determinou a segunda prisão e o presidente do STF soltou de novo.

Esse prende e solta colocou a Justiça Federal em rota de colisão com o Supremo. Os procuradores da República chegaram a pedir o impeachment do presidente do STF. Gilmar Mendes criticou a Polícia Federal pela “espetacularização” da operação. E o governo, por sua vez, saiu em defesa da PF. Em resumo: a Justiça se estranhou com ela mesma, com a Polícia e com o governo. Um rolo. Enquanto isso, os delegados responsáveis pela operação foram afastados do caso no auge das investigações. Nesse embate entre figuras importantes, dá para imaginarmos de que lado a corda rompeu.

Há dois aspectos principais nesse emaranhado de acontecimentos e medição de forças. Um deles é que essa polêmica tirou um pouco o foco do objetivo principal, que é a investigação de suposta prática de crimes de lavagem de dinheiro cometidos pelo banqueiro Dantas. O outro é o desgaste que a troca de acusações pode provocar em instituições como o Poder Judiciário, um dos pilares da República.

É que até então as discussões envolviam membros do governo ou do Congresso, e o Poder Judiciário sempre foi considerado de confiabilidade inabalável, único capaz de aplicar correição, a última instância e a esperança do cidadão de bem. Temos o exemplo recente do escândalo do mensalão: alguns parlamentares se livraram da cassação, outros foram reeleitos, mas não escaparam do processo no Supremo Tribunal Federal.

Sem entrar no mérito das discussões - se os juízes ou se o presidente do STF têm razão, se a Polícia Federal exagerou, se o governo determinou o afastamento dos delegados - o que podemos concluir desses episódios é que há uma falta de sintonia entre as instituições, o que pode agravar o descrédito por parte da população.

Sem instituições fortes, não há estabilidade social, política ou econômica e o país perde sua capacidade crítica. Se já não há líderes capazes de indicar caminhos e se entre os Poderes da República ninguém se entende, fica difícil para a sociedade esboçar qualquer reação. E isso é perigoso para o futuro do país.

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