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O estado brasileiro é omisso?


Amado de Olveira Filho

 

            É extremamente complexo, porém, oportuno avaliarmos as intrincadas relações do meio ambiente com o Estado e o setor produtivo brasileiro. Um aspecto que dificulta a relação da sociedade com o Estado quando se trata do meio ambiente é o emaranhado de sua legislação. Levantamento do site www.lei.adv.br dá conta de que de 1951 a 2006 o Brasil editou 153 leis ambientais, já de 1900 a 2006, foram editados 302 decretos também relativos ao meio ambiente.

            Tanto com relação à quantidade de leis, como decretos, os dois períodos são férteis, indicando uma preocupação do Estado com o meio ambiente. Destacam-se, no entanto, o período de 1990 a 1999, quando foram editados 170 decretos e 59 leis. Na verdade desde os anos 80 tivemos um incremento na quantidade de leis e decretos. Estes períodos coincidem com a disparada do processo de ocupação do Estado de Mato Grosso.

            Ainda neste período surge a Constituição Federal de 1988, trazendo em seu bojo, especialmente no caput  do Artigo 225 que "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida,". Desta forma, ficam consolidados todos os esforços iniciados a partir da década de 70 da sistematização do Direito Ambiental. Questionar esta legislação hoje é chegar a uma festa 18 anos depois de seu fim, exceção à famigerada Medida Provisória 2.166/67.

            No entanto, o que causa espécie na maioria dos conflitos estabelecidos é a forma de interpretação e aplicação da coleção de leis e decretos atinentes ao controle ambiental. Olha-se para o agora e ignora-se que de fato foi a partir dos anos 90 que se tomou consciência da necessidade de se buscar a sustentabilidade ambiental na exploração econômica de uma atividade em qualquer setor. Assim, as regiões de Mato Grosso colonizadas nas décadas de 50, 60 e 70 não contaram com qualquer apoio do Estado e de organizações não governamentais na orientação ambiental dos nossos pioneiros.

            Chegando ao nosso Estado os pioneiros colocou em prática o conhecimento trazido. Sabiam tudo de produção agrícola, nada de meio ambiente. Quem sabia? Fizeram cidades, construíram juntamente com os que aqui estavam o Mato Grosso que hoje temos. Geraram impostos pagos ao poder público, permitindo que o Governo do Estado criasse o quadro de carreira de professores, policiais, médicos e técnicos para cuidar da coisa pública. Consolidou um Estado a partir de uma economia sustentada na agropecuária.

            Os pioneiros de várias regiões reúnem-se em Associações dos Pioneiros e se emocionam quando contam como foi difícil a chegada de milhares de famílias oriundas de regiões que já contavam com alguma infra-estrutura num Estado inóspito e com toda a sorte de doenças e moléstias. Muitos morreram, outros voltaram, mas a grande maioria fez história em nosso Estado e puderam testemunhar o seu desenvolvimento.

            Parece poético, mas não é, porque hoje se houve de autoridades públicas que estes produtores são delinqüentes ambientais, que desmataram irresponsavelmente para criar gado e plantar soja e que deveriam estar na cadeia. Invariavelmente surge uma pergunta: Como pode um Estado que goza de todo um aparato legal que vai de resoluções, portarias, decretos, medidas provisórias a preceitos constitucionais para obrigar a sociedade a preservar ou conservar o meio ambiente, não cumprir a mesma Constituição que o faz ser Estado? O que é um país que não se submete ao Direito?

            Cria-se gado e planta-se soja em Mato Grosso por indução do mesmo Estado, que precisando de produtos exportáveis, incentivou, através de vários programas federais, a produção dessas commodities. Porém, o Estado Brasileiro não cumpre a Constituição Federal em relação aos seus milhões de produtores rurais, especialmente seu Artigo 187 que prevê "A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transporte".

            Nos incisos do mesmo Art. 187, se obriga o Estado a desenvolver uma política agrícola que leve em conta os instrumentos credíticios e fiscais, os preços compatíveis com os custos de produção e a garantia da comercialização, a pesquisa, o seguro agrícola, etc. Nada se cumpre. Tudo se cobra. Vivemos num Estado impensável. Não cumprir ou ironizar a íntegra do Art. 187 da Constituição Federal é chegar à festa 18 anos depois de seu fim e, nos fazer acreditar que o Estado brasileiro é omisso. Daí a indignação da classe produtora rural.

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