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MPU x CTNBio: Quem fiscaliza a atuação do fiscal?


Reginaldo Minaré

       O artigo 5º da Lei Complementar 75/93, que trata da organização, das atribuições e do estatuto do Ministério Público da União - MPU, estabelece como uma de suas funções institucionais, a defesa da ordem jurídica. Trata-se do respaldo legal ao clássico papel do Ministério Público de ser o fiscal da lei.

          No exercício de sua competência, o Procurador-Geral da República, no mês de junho de 2005, propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 3526 – junto ao Supremo Tribunal Federal – STF, contestando diversos dispositivos da Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005, que disciplina a construção e o uso de organismos geneticamente modificados – OGM.

            Um dos dispositivos contestados pelo Procurador–Geral é o inciso XX do artigo 14 da Lei 11.105/05, que estabelece competência à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, para identificar, caso a caso, as atividades com OGM e derivados de OGM que sejam  potencialmente causadores de degradação do meio ambiente, cuja realização deve ser precedida do estudo prévio de impacto ambiental.

            Embora uma singela leitura do artigo 225 da Constituição Federal - CF basta para deixar claro, como dia de verão ensolarado em Brasília, que nenhuma inconstitucionalidade existe na forma como o legislador disciplinou a maneira de identificar a necessidade de se exigir ou não o estudo prévio de impacto ambiental de atividade com OGM e derivado de OGM, caberá ao STF julgar a ação proposta pelo Procurador-Geral e decidir se a maneira que o legislador disciplinou a matéria afrontou ou não a CF.

            Até o momento, o STF não julgou a ADI e o que temos é uma Lei de Biossegurança em vigor e uma CTNBio com competência para identificar atividade com OGM ou derivado de OGM que seja potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente e, portanto, passível de exigência de um estudo prévio de impacto ambiental. Sendo necessário o estudo, o processo é encaminhado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA.

            Diante da situação de fato, e considerando que a Lei Complementar 75/93, que trata da organização, das atribuições e do estatuto do MPU, no inciso I do artigo 5º, dispõe ser a defesa da ordem jurídica uma das funções do MPU, espera-se que enquanto o STF não julgar inconstitucional a competência atribuída à CTNBio para identificar atividades com OGM que são passíveis de exigência de estudo prévio de impacto ambiental, o  Ministério Público cumpra o seu papel e trabalhe em defesa da ordem jurídica estabelecida.

            Todavia, o que se espera e que parece ser razoável não é o que efetivamente está acontecendo. Em matéria publicada no jornal Valor Econômico, no dia 13 de novembro de 2006, uma Subprocuradora-Geral da República afirmou que se a CTNBio, ao analisar um projeto de liberação comercial de OGM, dispensar a necessidade de realização de Estudos de Impacto Ambiental - EIA e respectivo Relatório de Impacto no Meio Ambiente - RIMA, será proposta ação judicial para que o juiz mande fazer. Inclusive, foi além a Subprocuradora-Geral, indicou que poderia promover ações criminais, questionou a capacidade dos cientistas que integram o Colegiado e a isenção dos mesmos no momento da avaliação dos projetos.

            Diante do que foi veiculado pela matéria publicada, cabe esclarecer que a ação relacionada à competência atribuída à CTNBio para identificar a atividade com OGM que seja ou não passível de exigência de EIA-RIMA já foi proposta, atualmente tramita no STF e até que seja considerada inconstitucional, a CTNBio não só pode como deve exercer a competência que lhe foi atribuída pelo Poder Legislativo. Resta claro, portanto, que o tema envolve questão constitucional que só será solucionada pelo STF.

            Já ao indicar que poderia promover ação criminal, caso a CTNBio venha aprovar o uso comercial de algum OGM sem julgar necessário a realização de EIA-RIMA, a Subprocuradora-Geral parece olvidar que a nossa legislação penal não trata como crime o exercício de uma competência legalmente atribuída e que ainda não tenha sido declarada inconstitucional pelo STF. Inclusive, seria pertinente consultar o Conselho Nacional do Ministério Público, que tem competência constitucional para avaliar o cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, acerca dos fundamentos das declarações lançadas pela Subprocuradora.

            Sobre a ADI 3526, cabe ressaltar que desde o mês de maio de 2006 o STF está aguardando manifestação do Procurador-Geral da República, visto que nesta Ação de Inconstitucionalidade tem pedido de medida cautelar e, nos termos do artigo 12 da Lei 9.868/99, que disciplina o processo de julgamento de ação direta de inconstitucionalidade, o relator da ação pode, após prestação de informações e manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

            Para concluir, cabe lembrar que o "jus esperneandi" - direito de espernear - é admitido em direito àquele que está a um passo de ver sua pretensão não ser acolhida. Porém, o esperneio deve ser realizado por meio de argumentos pertinentes, reais e jurídico.

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