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Manejo da resistência de plantas invasoras aos herbicidas


José Luis da Silva Nunes
O surgimento de resistência aos herbicidas em plantas invasoras é um fenômeno ligado à seleção de biótipos ou populações não mais controláveis pelos produtos defensivos. Sabe-se que os herbicidas provocam mudanças no tipo e proporção de espécies de plantas daninhas que compõem a população da lavoura. Isso se explica pelo fato do herbicida não controlar igualmente as espécies existentes na área, com isso alguns indivíduos acabam beneficiados e se multiplicam. Desta forma, plantas invasoras que apresentavam baixa ocorrência podem acabar se tornando um grave problema para o produtor. Este é um processo já constatado e relatado para praticamente todos os herbicidas em uso na agricultura.

O ciclo de vida curto, a elevada produção de sementes e a baixa dormência destas, a produção de várias gerações reprodutivas por ano e a extrema suscetibilidade a um determinado herbicida são características bioecológicas que favorecem a seleção de indivíduos resistentes dentro de uma população de plantas invasoras. Além disto, a ampla variabilidade genética permite a adaptação e a sobrevivência dessas espécies em diversas condições ambientais. A resistência de espécies vegetais a ação dos herbicidas está ligada a capacidade natural e herdável de alguns indivíduos dentro de uma determinada população de plantas de sobreviver e se reproduzir, mesmo após a exposição a doses de herbicidas que seriam letais a indivíduos normais (suscetíveis) da mesma espécie. Assim, a ocorrência da resistência aos herbicidas é um fenômeno que ocorre naturalmente nas populações de plantas invasoras, não sendo o herbicida o causador do fenômeno, mas sim o agente selecionador dos indivíduos resistentes, que apresentavam baixa frequência populacional inicial.

O principal fator desencadeador do surgimento destes indivíduos resistentes está associado ao manejo das plantas invasoras através do uso exclusivo de herbicidas e/ou da aplicação continuada do mesmo herbicida ou de herbicidas com o mesmo mecanismo de ação para o controle de uma espécie vegetal durante sucessivos períodos agrícolas.

Porém não é qualquer planta daninha que tem potencial para que biótipos resistentes a determinado herbicida sejam selecionados rapidamente. O tempo para seleção de espécies tolerantes e/ou resistentes pode variar de dois anos (caso dos herbicidas inibidores da ALS) a até mais de 20 anos (caso do glyphosate), enquanto algumas espécies raramente teriam seus biótipos resistentes selecionados. Os gêneros com maior número de biótipos resistentes no mundo são Lolium, Avena, Amaranthus, Chenopodium, Setaria, Echinochloa, Eleusine, Kochia e Conyza. Segundo o “International Survey of Herbicide Resistant Weeds” (2010), já foram registrados apontamentos de 310 biótipos resistentes, em 170 espécies diferentes (101 da classe Magnoliopsida e 69 da Classe Liliopsida), em 50 países. O Brasil conta, atualmente, com o registro de 22 biótipos, sendo pelo menos cinco resistentes ao glyphosate.

Os primeiros casos de resistência na agricultura do país datam da década de 80, com o relato da seleção de espécies tolerantes ao herbicida Metribuzin. Como esse defensivo não apresenta controle satisfatório do leiteiro (Euphorbia heterophylla), selecionou esta espécie nas lavouras onde era utilizado. Esta espécie passou a ser a principal planta daninha a ser eliminada nas lavouras. O problema com o leiteiro foi resolvido com o lançamento no mercado de soja de uma nova molécula herbicida, o Imazaquin, que passou a ser amplamente utilizada pelos produtores de soja.

Então, em meados da década de 90, surgiram os primeiros casos de resistência (Euphorbia heterophylla e Bidens pilosa) e de plantas tolerantes (Cardiospermum halicacabum) relatados no Brasil ao Imazaquin. A experiência vivida com os herbicidas Metribuzin e Imazaquin apresenta características semelhantes ao que está acontecendo atualmente com o glyphosate, ou seja, os aspectos sobre a dinâmica de populações das plantas daninhas e a possibilidade da seleção de espécies tolerantes e/ou resistentes não foram considerados. Além disto, a utilização constante de tecnologias que envolvem Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) na última década, associado ao uso de glyphosate, permitiu reduzir ou eliminar a necessidade de outros herbicidas para o manejo de diferentes espécies de plantas daninhas, o que acabou contribuindo para o aumento da pressão de seleção e o aparecimento de biótipos resistentes a molécula deste herbicida.

Uma das formas de evitar o surgimento de resistência é uso de um manejo racional dos herbicidas, além do uso de herbicidas com diferentes mecanismos de ação, visando diminuir consideravelmente a possibilidade de aparecimento de indivíduos tolerantes e/ou resistentes. Porém, ao ser verificada a ocorrência de plantas invasoras resistentes em uma área, com densidade populacional suficiente para limitar a produção das culturas agrícolas, deve-se proceder à mudança das práticas de manejo utilizadas, com a elaboração de um programa de longo prazo para manejo da resistência (ou Manejo Integrado de Plantas Invasoras Resistentes – MIPIR), através de um sistema integrado de controle de plantas invasoras que envolva métodos culturais, físicos, mecânicos, químicos, etc.

Um plano de integração de práticas de manejo de plantas invasoras que vise prevenir e/ou controlar a resistência deve, necessariamente, prever práticas que envolvam:

1. Estratégias químicas:
a) Realização do manejo apropriado dos herbicidas, utilizando-se herbicidas com pouca atividade residual no solo;

b) Otimização da dose, época e número de aplicações, além da minimização da aplicação de herbicidas específicos, evitando o uso contínuo de herbicidas com mesmo mecanismo de ação;

c) Rotação de herbicidas com mecanismos de ação diferenciados;

2. Estratégias não químicas:

a) Rotação de culturas;

b) Monitoramento após aplicação dos herbicidas, com monitoramento das manchas de plantas daninhas com padrão diferente e eliminação dos focos iniciais de resistência, evitando a produção de sementes;

c) Utilizar práticas não químicas que objetivem o fortalecimento da capacidade competitiva da cultura, representada pelo seu rápido estabelecimento e desenvolvimento;

d) Prevenção da disseminação de sementes através do uso de equipamentos limpos e sementes certificadas.

Desta forma, as principais formas de manejo e prevenção da resistência estão todas relacionadas ao manejo integrado de plantas daninhas, envolvendo técnicas químicas e não químicas de prevenção e controle da resistência de plantas daninhas. Isto porque as estratégias não químicas provocam a mortalidade de ambos os biótipos de plantas daninhas (susceptível e resistente), enquanto as estratégias químicas promovem a morte dos indivíduos susceptíveis. Desta forma, a utilização dos herbicidas deve ser baseada em um planejamento criterioso, observando a utilização dos herbicidas de diferentes mecanismos de ação, visando diminuir os riscos de resistência e manter a diversidade de biótipos no banco de sementes do solo.

O aspecto mais importante no manejo integrado é a recomendação de técnicas em que a pressão de seleção de biótipos resistentes aos herbicidas seja reduzida. Portanto, é fundamental a alternância constante de técnicas normalmente utilizadas, utilizando-as em conjunto (estratégias químicas e não químicas), visando evitar ou retardar o aparecimento de biótipos de plantas invasoras resistentes.

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