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Fertilizantes, o tendão de Aquiles dos biocombustíveis


Eleri Hamer

Afora os arroubos ideológicos e excluindo-se o debate ecológico, boa parte da discussão em torno dos biocombustíveis tem se dado na relação alimentos-biocombustíveis. Muito se tem especulado e discutido, e pouco tem-se concluído em torno do tema, até porque é prematuro fazê-lo.

O engenheiro agrônomo Fernando Penteado Cardoso, com mais de 90 anos, fundador do grupo Manah e presidente da Fundação Agricultura Sustentável (Agrisus), costuma resumir numa frase essa falta de consistência nas nossas discussões: “somos um país em que as pessoas acham muito, observam pouco e não medem praticamente nada”. Dentre os exemplos evidentes temos o tamanho real da produção agropecuária, os impactos sócio-econômicos das mudanças na matriz produtiva e os custos efetivos da falta de planejamento público e privado.

As discussões sobre os biocombustíveis estão pautadas principalmente nos seguintes aspectos: (i) se são realmente limpos, (ii) vão ou não causar desmatamento, (iii) gerarão ou não desenvolvimento rural e (iiii) se causarão fome, afetando a soberania alimentar.

Devemos lembrar que os biocombustíveis não são a única e provavelmente não sejam a alternativa ideal, não abrangem a solução de todos os problemas e não representam uma escolha totalmente limpa, mas são uma grande opção aos esgotáveis combustíveis fósseis, sendo a princípio menos impactantes que estes.

Por outro lado, com essa pretensa idéia de esgotar o assunto, e como disse, normalmente focada na potencial disputa dos biocombustíveis, por terra e capital, com os alimentos, temos passado ao largo de um aspecto que já preocupa muito os produtores rurais e tem sido um dos grandes motivos da sua baixa rentabilidade: O PREÇO DOS FERTILIZANTES. Nesse quesito talvez a relação entre os alimentos e a opção dos biocombustíveis ou agro-combustíveis, como queiram, deva merecer efetivamente atenção especial.

Embora o Brasil ainda tenha muito espaço para ampliar a produção e a produtividade agropecuária, e o crescimento da agroenergia possa perfeitamente se fazer de forma sustentável e mais eficiente do que hoje, integrando os sistemas agrícola e pecuário, devemos nos lembrar que essa demanda por alimentos e energia é mundial, sobretudo na China e Índia, ao passo que as novas alternativas no uso intensivo de fertilizantes na produção agropecuária ainda são ínfimas.

Tomemos a análise por outro lado. Conforme já discutido em artigo recente, o planeta deverá suportar por volta de 8 bilhões de pessoas em 2030. Desse contingente, mais de 90% estarão morando nas cidades (hoje não chega a 60%) e parcela significativa será de idosos, haja vista que a expectativa de vida também é crescente no mundo.

Portanto, teremos crescimento exponencial da demanda mundial por alimentos, fibras e bioenergia, motivado pelo ingresso de novos consumidores. Segundo dados da FAO, apresentam-se três motivos para essa explosão no consumo: o aumento da renda per capita dos mais pobres, a urbanização acelerada e a mudança nos hábitos de consumo. Como exemplo, países como China, Índia e o Sudeste Asiático crescem acima de 6% ao ano e mantém mais de 60% da população em zona rural vivendo de subsistência.

Soma-se a estes fatos os crescentes programas de substituição dos combustíveis fósseis por biocombustíveis, e que eventualmente consomem parcelas dos estoques mundiais de alimentos, auxiliando no aumento dos preços dos produtos agrícolas, e por conseguinte, dos alimentos. Qual a alternativa para essa nova e previsível situação? Obviamente é produzir mais.

Mas como, se existe pouca disponibilidade de áreas para esse fim e que possam atender a colossal demanda? Assim, no curto prazo a alternativa visível está no uso intensivo de fertilizantes, e no médio prazo no desenvolvimento de variedades mais produtivas, principalmente através da biotecnologia.

Desse modo, só esse ano, o consumo brasileiro de fertilizantes aumentou mais de 60% e o preço subiu em média 40%, descarregados completamente nos custos de produção agrícola. Por isso, a preocupação com o futuro dos biocombustíveis e a própria produção de alimentos está na capacidade dos produtores em reduzir os custos médios, principalmente através dos ganhos de produtividade e exploração de economias de escala e escopo.

Assim, enquanto os preços do petróleo se firmarem próximos aos US$ 90 por barril a corrida por combustíveis alternativos tendem a aumentar, e tornam essas alternativas potencialmente atraentes para toda a cadeia e concedam um bom espaço de queima eventual de gordura, mas os fertilizantes podem se tornar o tendão de Aquiles.

Por fim, a esperança da diminuição dos custos pela redução dos preços de fertilizantes, a princípio e infelizmente, deverá ser deixada de lado. Busquemos novas alternativas para isso. Boa semana.
 
Eleri Hamer é Mestre em Agronegócios, Professor de Graduação e Pós-Graduação do CESUR, desenvolve Palestras, Educação Executiva e Consultorias em Gestão Empresarial e Agronegócio. Home-page: www.elerihamer.com.br E-mail: [email protected]

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