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CTNBio em xeque: a ilegalidade do conteúdo da Consulta Pública 63/07 da Anvisa.


Reginaldo Minaré

A correção da divergência de redação existente entre a Lei 8.974/95, dispondo sobre a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, e a Lei 9.782/99, estabelecendo as competências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, é seguramente um dos mais significativos avanços introduzidos pela Lei 11.105/05, Lei esta que revogou a Lei 8.974/95 e reformulou a CTNBio.

A Lei 9.782, datada de 1999, posterior, portanto, à criação e ao estabelecimento de competências à CTNBio, atribui competências à Anvisa para regulamentar, controlar e fiscalizar produtos oriundos da engenharia genética que possam apresentar riscos à saúde humana. Já a Lei 8.974/95 atribuía competência à CTNBio para identificar atividades degradadoras da saúde humana. As palavras risco e degradação dificultavam a harmonização dos dois sistemas normativos, visto que representantes da área de saúde argumentavam, com razão, que não seria aceitável uma atividade degradadora da saúde humana.

A Lei 11.105/05 (Lei de Biossegurança), ao reformular o sistema nacional de biossegurança para a engenharia genética, dispôs sobre as competências da CTNBio e atribuiu à esta Comissão a competência para identificar atividades e produtos decorrentes do uso de OGM e seus derivados que possam causar riscos à saúde humana. Afastou, portanto, o ponto de dissonância entre a Lei 9.782/99 e a legislação de biossegurança e deixou claro que uma vez identificada a atividade ou produto, pela CTNBio, como causadora de risco à saúde humana, fica a ANVISA com plena competência para regulamentar, controlar e fiscalizar a  atividade ou o produto.

Argumentar que seria inaceitável a realização de uma atividade ou comercialização de um produto que poderia causar riscos à saúde humana é, sem dúvida, uma argumentação falaciosa, visto que diversos sistemas de produção e diversos produtos comercializados oferecem risco elevado à saúde humana e não são proibidos e sim regulamentados, controlados e fiscalizados. Pode-se citar como exemplo, o sistema de tratamento de água e a comercialização de medicamento psicotrópico.

Verifica-se, pois, que a Lei 11.105/05 e  a Lei 9.782/99 estão adequadamente sistematizadas, ou seja, a CTNBio identifica a atividade e produto decorrente do uso de OGM e seus derivados que possa causar risco à saúde humana, e a Anvisa regulamenta, controla e fiscaliza estas atividades.

Por força do § 4o  do artigo 14 da Lei 11.105/05, a decisão da CTNBio deve conter resumo de sua fundamentação técnica, explicitar as medidas de segurança e restrições ao uso do OGM e seus derivados e considerar as particularidades das diferentes regiões do País, com o objetivo de orientar e subsidiar os órgãos e entidades de registro e fiscalização, referidos no artigo 16 desta Lei, no exercício de suas atribuições.

Para garantir que o procedimento estabelecido na legislação em vigor não seja exigido em duplicidade,  o § 1° do artigo 14 da Lei 11.105/05 é categórico ao afirmar que quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio vincula os demais órgãos e entidades da administração. Na mesma linha, o § 6o do artigo 16 da Lei 11.105/05 estabelece, de forma categórica, que a ação do órgão de registro e fiscalização está vinculada à decisão técnica da CTNBio, sendo vedada exigência técnica que extrapole a condição estabelecida na decisão da Comissão no aspecto relacionado à biossegurança.

Constata-se, destarte, que o sistema estabelecido é claro e objetivo. Todavia, esta clareza e objetividade não são percebidas pelo Poder Executivo Federal, visto que até nesta área, um dos mais promissores segmentos da biotecnologia moderna, falta-lhe coordenação, profissionalismo e comando em suas ações.

Recentemente a Anvisa publicou, Diário Oficial da União de 13/07/2007, Consulta Pública n° 63, propondo estabelecer regulamento técnico que disponha sobre os procedimentos para a avaliação de segurança, para o consumo humano, de alimentos contendo ou consistindo de OGM e de alimentos contendo ou consistindo de produtos derivados de animais alimentados com OGM ou com seus produtos derivados.

De ilegalidade afogueada e manifesta, esta Consulta Pública é mais uma demonstração de descaso, de  parco conhecimento ou de disposição de espírito que inspira e alimenta ação desleal, o que não é de admirar, visto que em matéria de competência administrativa para a condução da biotecnologia moderna no País esta Administração Pública Federal não merece ter nota superior a zero.

Reginaldo Minaré

Advogado e Mestre em Direito

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