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Critica à visão unidimensional sobre os transgênicos


Reginaldo Minaré

            Que a inovação tecnológica é um instrumento que permite os Estados ou regiões menos favorecidas reduzirem o fosso que as separam daquelas mais desenvolvidas, ou pelo menos impedirem que este fosso seja aprofundado, não é uma novidade.

            Todavia, a relevância crescente que o conhecimento e a preparação de mão-de-obra técnica e especializada vêm ocupando no campo do planejamento e desenvolvimento econômico, alçou a inovação tecnológica ao mais alto patamar da agenda de prioridades dos países que conhecem e reconhecem o processo por meio do qual a tecnologia e a inovação, da investigação ao sucesso comercial, influenciam o desenvolvimento.

            Durante as últimas décadas do século passado o topo dessa agenda foi ocupado pelo desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação, mas nesta primeira metade do século XXI ninguém tem dúvida de que este espaço está e permanecerá ocupado pelas biotecnologias.

            Contudo, setores baseados no conhecimento não se desenvolvem de forma simples, ou seja, não basta querer desenvolver para o desenvolvimento acontecer. Principalmente nos países menos desenvolvidos, é preciso muita preparação para estabelecer as condições adequadas ao florescimento da capacidade de inovar. É necessário, além de superar problemas relacionados à defasagem científica e tecnológica, racionalizar as limitações impostas pela regulamentação e planejar o ambiente institucional para a adequada operação das empresas, principalmente as pequenas e médias, das universidades e dos institutos de pesquisa.

            Atento a essas necessidades o Constituinte de 1988 estabeleceu no artigo 218 da Constituição Federal – CF: que o Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas; que a pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional e que o Estado apoiará a formação de recursos humanos nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia. São, portanto, diretrizes constitucionais que pavimentam o caminho para que uma administração pública inteligente estabeleça as condições necessárias à criação de um ambiente inovador.

            Todavia, analisando o que é estabelecido pela CF, causa surpresa ver que no Brasil alguns representantes do Ministério Público Federal - MPF, alheios ao comando constitucional, vem atuando de forma sistemática para retardar ao máximo a liberação comercial dos organismos geneticamente modificados, produtos oriundos da biotecnologia moderna, sem qualquer preocupação com desenvolvimento da competitividade do sistema produtivo nacional e regional. Quem fizer uma pesquisa nas ações judiciais envolvendo transgênicos e uma pesquisa na página da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio encontrará uma série de questionamentos feitos por representantes do MPF, todos com conteúdo negativo ou restritivo aos transgênicos,  procurando criar condições para impedir a liberação comercial destes produtos.

            Entretanto, certamente a pessoa que pesquisar não encontrará nenhuma atuação do MPF, por mais singela que seja, no sentido de investigar se o que dispõe o artigo 218 da CF está sendo adequadamente cumprido ou se alguns dispositivos da Lei 11.105/05 – Lei de Biossegurança – estão ou não sendo cumpridos.

            Por exemplo, não se vê o MPF atuar no sentido de exigir que Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, vinculado à Presidência da República, cumpra o que é previsto no artigo 8o da Lei de Biossegurança, formule e implemente a até hoje inexistente Política Nacional de Biossegurança – PNB. Também não se tem notícia de atuação do MPF no sentido de exigir a execução do artigo 31 da Lei de Biossegurança, que determina que a CTNBio e os órgãos e entidades de registro e fiscalização dos Ministérios da Agricultura, Meio Ambiente e Saúde façam a revisão de suas deliberações de caráter normativo, elaboradas antes da publicação da Lei 11.105/05, para promover sua adequação às disposições da nova Lei.

            Que o MPF atue no sentido de fiscalizar o funcionamento da CTNBio ou de qualquer outro órgão é o que se espera desta instituição cuja principal função é fiscalizar a aplicação da lei. Estranha-se, porém, quando a atuação dos membros desta instituição se torna unidimensional, como vem ocorrendo no caso dos transgênicos.

            Neste contexto, é preciso lembrar o que já foi ensinado pelos representantes da Escola de Frankfurt, ou seja, que para fugir da consciência unidimensional, que pode permitir a instrumentalização do ser humano e gerar graves prejuízos, é necessário manter uma postura crítica e construir um reservatório de possibilidades, atitudes e idéias.

Reginaldo Minaré

Advogado e Diretor Jurídico da ANBio

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