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Tendências 18/06/2012



Argemiro Luís Brum
O óbvio Ululante

Nos causa estranheza a surpresa do governo e de muitos órgãos de imprensa, assim como de alguns analistas, quanto à demora de nossa economia em engrenar uma marcha de crescimento mais sustentável, após os 7,5% alcançados em 2010. Isso porque era óbvio, e assim foi dito naquela oportunidade, que nosso país não possui, infelizmente, estrutura para crescer anualmente mais do que 4%. Sem essa estrutura, a inflação sobe e a estabilidade da economia fica comprometida, obrigando o governo, se esse estiver consciente e não agir de forma populista, a frear novamente a economia, via alta de juros, para manter a estabilidade.


Portanto, o cerne do problema atual não está na inflação em si, mas na incapacidade nacional de produzir o suficiente, para uma demanda que vem sendo estimulada. Isso se resolve, em primeiro lugar, com investimentos produtivos, lá onde realmente a sociedade necessita. Ora, para investir, necessário se faz termos poupança, particularmente agora que a poupança externa produtiva rareou. Mas, não basta apenas a poupança das famílias e das empresas. É preciso, em especial, a poupança do setor público, do governo em todas as suas instâncias.

E essa, como todo mundo já sabe, não é feita (nunca foi feita!). A ponto de o Estado consumir a poupança privada para manter a máquina pública funcionando, mal e incompetentemente. Hoje, a dívida pública nacional ultrapassa a R$ 1,8 trilhão e continua crescendo. Já ultrapassa em mais de cinco vezes a dívida externa, e nada é feito para contê-la. Ou seja, sem reformas estruturais no funcionamento do Estado brasileiro, para torná-lo eficiente, poupador e investidor, não há espaço para maior crescimento econômico sustentável. Isso no que diz respeito à questão estrutural do país.

O óbvio Ululante (II)

Quanto às questões conjunturais, já que o país também não está conseguindo nem mesmo alcançar o crescimento de 4% ao ano (em 2012 a tendência, segundo o mercado, é de repetirmos o pífio crescimento de 2,7% de 2011), as causas são conhecidas e foram previstas. O país chegou ao seu limite de endividamento, após o “pacote” de estímulos de 2010.


Hoje, a população “dita de classe média”, além de não possuir uma renda suficiente para o nível de preços praticados no país, já está fortemente endividada e, pior, com uma inadimplência em crescimento. Assim, pouco adianta o governo insistir com crédito facilitado, juros mais baixos, redução pontual e setorial de impostos e outros mecanismos de curto prazo.

O consumo não decola como antes porque o cidadão brasileiro está aprendendo que não pode “dar o passo maior do que as pernas”. Com o agravante de que a geração de empregos caiu fortemente e, pior, o desemprego começa a crescer Brasil afora. Parcialmente, o governo espera que a desvalorização do Real dê um impulso ao combalido setor exportador nacional. Porém, vender mais ao exterior depende muito da recuperação da economia mundial. Essa, todavia, só vem dando sinais de piora desde quando a crise estourou, em 2007/08.

O óbvio Ululante (III)

A grande lição de tudo isso pode ser dividida em duas partes: 1) conseguimos enfrentar bem, até aqui, a crise mundial, porque realizamos parte do dever de casa ao estabilizarmos a economia a partir do Plano Real em 1994, do Proer alguns anos depois, da consolidação do tripé de sustentação da estabilidade em 1999 (câmbio flutuante, meta inflacionária e superávit primário), e da continuidade desse conjunto de mecanismos mesmo com as mudanças de governo, as quais consolidaram a democracia no país; 2) todavia, esses instrumentos se esgotaram como alavancas para irmos mais longe, fato que nos obriga agora (e já estamos 18 anos atrasados, no mínimo) a realizarmos a segunda etapa dessa dura transição.


Trata-se de efetuarmos as reformas estruturais em nossa economia, a começar pelo funcionamento do Estado. Quanto mais tempo deixarmos de realizá-las, mais vulneráveis ficaremos daqui em diante, gestando um processo de crise que não mais terá como estopim a economia externa, como tem sido até aqui, mas sim terá seu estopim internamente, repetindo momentos dos anos de 1980 e início dos anos de 1990. Com o agravante de que podemos ficar isolados, descobrindo que o mundo não se interessará muito em nos “salvar” se continuarmos insistindo em não fazer o dever de casa completo.

E, se decidir nos auxiliar, colocará exigências pesadas de ajustes, no estilo das que vêm sendo realizadas na Grécia e Espanha, por exemplo. Aí, aqueles que se aproveitaram do Estado gastador e causador do problema, irão mais uma vez espernear, repetindo o que vimos há duas décadas.

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