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Regulamentação da Biotecnologia no Paraná. Exemplo a não ser seguido


Reginaldo Minaré
O Partido da Frente Liberal – PFL, no dia 21 de dezembro de 2005, propôs junto ao Supremo Tribunal Federal – STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 3645 – em face da Lei 14.861, de 26 de outubro de 2005, do Estado do Paraná, que regulamenta o direito à informação quanto aos alimentos e ingredientes alimentares que contenham ou sejam produzidos a partir de Organismos Geneticamente Modificados - OGMs.

Matéria sujeita à aplicação da regra constitucional que disciplina a competência legislativa concorrente entre União, Estados e Distrito Federal. Área onde existindo regra geral da União, caberá aos Estado e ao Distrito Federal legislar de forma suplementar para atender peculiaridades existentes em seu território, a Lei Estadual nº 14.861/05 está sendo contestada no STF por atropelar a regra geral já estabelecida pela União.
Sobre rotulagem de alimentos e ingredientes alimentares que contenham ou sejam produzidos a partir de OGMs, dispõe a Lei Federal 11.105/05, em seu artigo 40, que os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter informação nesse sentido em seus rótulos, conforme regulamento. Já o regulamento que dispõe sobre o tema, Decreto nº 4.680/03, estabelece em seu artigo 2º que na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGMs, com presença acima do limite de um por cento do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica do produto.
Consta-se, portanto, que a regra geral estabelecida pela União é rotular alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal, que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados, com presença acima do limite de um por cento do produto.
Ignorando a regra geral estabelecida, o Governo do Paraná publicou a Lei nº 14.861/05, cujo artigo 2º estabelece que na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGMs, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica desse produto.
Verifica-se que a Lei Estadual não contempla o limite de um por cento, e aborda o tema de forma geral exigindo rotulagem para todos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGMs, independente do limite estabelecido pela regra geral da União Federal.

Considerando que o artigo 10 da Lei 14.861/05 exigia que a mesma fosse regulamentada por Decreto do Governador do Estado, até 90 dias após sua publicação, poderíamos até entender prematura a decretação de inconstitucionalidade da Lei pelo STF antes da publicação do Decreto. Visto que, conhecendo o objeto da ADI 3645, o Governador poderia sanar a inconstitucionalidade da norma reconhecendo o limite de um por cento por meio do Decreto. Inclusive, dispor sobre o limite de um por cento no texto do Decreto seria o caminho adequado, visto que a norma federal que dispõe sobre o limite também é um Decreto. Estando, portanto, o assunto disciplinado por Decreto no âmbito da União e do Estado, seria mais prático para o Poder Público administrar o assunto, que diz respeito ao estabelecimento de um índice que pode ser modificado a qualquer momento de acordo com o avanço da tecnologia aplicada ao processo de identificação. E modificar um Decreto, como é sabido, é bem mais fácil do que modificar uma lei seja ela estadual ou federal.
Todavia, isso não ocorreu. O Decreto foi publicado no dia 22.03.2006 - Decreto nº 6.253/06 - e sua redação reafirmou o que foi estabelecido pelo artigo 2º da Lei 14.861/05. Inclusive, foi além. No artigo 6º caput e § 6º do Decreto, o Governador afirma ficar proibida a venda de produtos sobre os quais recaia denúncia fundamentada de que contêm OGM e que não contenham no rótulo a devida designação, e que sendo a situação comprovada por análise, os produtos deverão ser destruídos, sendo vedado qualquer aproveitamento condicional do produto para alimentação humana e animal.
Diante, portanto, da publicação do Decreto, que não corrigiu a inconstitucionalidade, e considerando que o conflito não se instala no âmbito das normas infraconstitucionais, mas diz respeito a uma ofensa a regra constitucional aplicada à competência legislativa concorrente, o STF certamente declarará inconstitucional a Lei 14.861/05. Importante lembrar que recentemente o STF declarou inconstitucional em sua totalidade a Lei nº 14.162/03, do Governo do Estado do Paraná, contestada por meio da ADI 3035, que afrontava a mesma regra constitucional e proibia o cultivo de OGMs no Estado.
Sem dúvidas, é o Governo do Estado do Paraná dando exemplo de como não proceder em matéria de competência legislativa concorrente e de condução de política direcionada à biotecnologia, área que já foi reconhecida pelos países desenvolvidos como estratégica para as economias baseadas no conhecimento.

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