CI

Quem está prejudicando os agricultores: os que não os subsidiam ou os que não os educam?


Polan Lacki
Uma  observação  empírica  sobre  a  causa  mais  profunda  do  êxito  ou  do  fracasso  dos  agricultores:  O  objetivo  deste  artigo  é  demonstrar  que  o  fator  mais  decisivo  para  que  um  produtor  rural,  pequeno/médio/grande,  rico/pobre,  com  crédito  ou  sem  crédito,  com  terra  própria  ou  arrendada,  tenha  êxito  econômico  é  sua  eficiência  técnico-produtiva,  gerencial  e  comercial;  e  esta,  por  sua  vez,  depende  de  que  possua  conhecimentos  úteis  que  sejam  aplicáveis  na  solução  dos  seus  problemas.
Em  meus  45  anos  de  atuação  como  engenheiro  agrônomo  extensionista,  realizada  em  19  países  da  América  Latina,  sob  governos  de  direita  e  de  esquerda,  civis  e  militares,  democráticos  e  ditatoriais,  "estatizadores"  e  privatizadores,  nunca  encontrei  um  agricultor  realmente  eficiente  que  se  queixasse  de  falta  de  rentabilidade. 
Os  múltiplos  exemplos  que  vi  com  meus  próprios  olhos  em  todos  esses  países  me  ensinaram  o  seguinte:  o  êxito  econômico  dos  agricultores  inexoravelmente  tem  que  ser  sinônimo  e  conseqüência  de  sua  capacidade  para  evitar,  corrigir  ou  eliminar  os  erros  e  ineficiências  que  ocorrem  nas  distintas  etapas  do  negócio  agrícola.
No  Brasil  durante  mais  de  cinco  décadas  uma  grande  quantidade  de  "deformadores"  da  opinião  pública  e  pseudo-defensores  dos  pobres  rurais,  causou  e  continua  causando  um  enorme  dano  aos  agricultores.  Esses  maus  conselheiros,  em  vez  de  dar  ênfase  à  "imprescindibilidade"  e  urgência  de  melhorar  a  formação  e  capacitação  dos  produtores  rurais  para  desenvolver  suas  potencialidades  latentes  e  suas  capacidades  de  solucionar  seus  próprios  problemas  produtivos  e  econômicos:
1)  Continuam  dizendo  aos  agricultores  apenas  aquilo  que  lhes  agrada  ouvir,  como  por  exemplo,  que  eles  são  muito  eficientes  e  que  as  causas  que  originam  seus  problemas  econômicos,  estão  fora  e  muito  longe  de  suas  propriedades  e  comunidades.  Que  estas  causas  estão  nos  governos  dos  países  ricos  que  subsidiam  e  protegem  seus  agricultores,  que  estão  nos  governos  de  seus  próprios  países  que  não  os  subsidiam  nem  os  protegem,  que  estão  no  imperialismo,  no  neoliberalismo,  na  globalização  dos  mercados  e  nos  tratados  de  livre  comércio.  E  que,  consequentemente,  as  soluções  não  podem  ser  adotadas  por  nossos  agricultores  e  sim  pelos  governos  dos  países  ricos,  pela  Organização  Mundial  do  Comércio,  pelo  Banco  Mundial  e  o  FMI.  E,  domesticamente,  pelo  Banco  Central,  pelo  Banco  do  Brasil,  pelo  Ministério  da  Fazenda  e  pelo  Congresso  Nacional. 
Ao  dizer-lhes  que  seus  problemas  são  causados  por  esses  supostos  inimigos  externos,  que  os  agricultores  não  têm  a  mínima  possibilidade  de  eliminar,  tais  mensagens  estão  conduzindo-os  ao  fatalismo  e  à  passividade,  porque  indiretamente  estão  dizendo-lhes  que  continuem  esperando,  pois:
a)  se  os  agricultores  não  são  os  causadores,  tampouco  poderão/deverão  ser  os  solucionadores  de  seus  problemas  e;
b)  se  as  causas  de  seus  problemas  estão  fora  de  suas  propriedades  e  comunidades,  as  soluções  também  deverão  ser  buscadas  fora  de  suas  porteiras.
2)  Mas  estes  maus  conselheiros  não  dizem  aos  agricultores  o  que  eles  deveriam  ouvir,  como  por  exemplo:
Primeiro:  Que,  comparativamente  a  outros  fatores,  esses  "bodes  expiatórios"  têm  uma  incidência  mínima  no  êxito  ou  no  fracasso  econômico  dos  agricultores.
Segundo:  Que  a  curto  e  médio  prazo,  são  extremamente  remotas,  para  não  dizer  nulas,  as  probabilidades  de  que  esses  supostos  inimigos  externos  sejam  eliminados. 
Entre  outras,  pelas  seguintes  razões:
-  mesmo  que  sempre  digam  o  contrário,  nas  suas  atitudes  os  governos  dos  países  ricos  estão  demonstrando  que  continuarão,  até  onde  for  possível,  protegendo  e  subsidiando  seus  agricultores  e;
-  ainda  que  não  o  reconheçam  publicamente,  os  debilitados  e  endividados  governos  dos  países  pobres  estão  demonstrando  que  não  dispõem  de  força  política  para  impedir  que  os  países  ricos  continuem  a  fazê-lo;  e,  o  que  é  pior,  não  dispõem  dos  recursos  financeiros  para  imitá-los  subsidiando  seus  próprios  agricultores.
Enquanto  os  produtores  rurais  não  forem  advertidos  de  que  estas  pseudo-soluções  demagógicas  e  “paralizantes”  são  absolutamente  inviáveis  e  ineficazes:
-  continuarão  perdendo  tempo,  esforços  e  irrecuperáveis  oportunidades  de  progredir,  porque  suas  atenções  estarão  dirigidas  aos  supostos  inimigos  externos  que  eles  não  podem  eliminar,  em  vez  de  concentrá-las  na  eliminação  dos  inimigos  internos  que  são  as  ineficiências  existentes  em  suas  próprias  propriedades  que  eles  mesmos  poderiam  e  deveriam  corrigir  e;
-  continuarão  perguntando-se  "o  que  nossos  governos  podem  fazer  por  nós?"  em  vez  de  perguntar-se  "o  que  nós  mesmos,  com  o  apoio  de  uma  educação  ÚTIL  proporcionada  pelos  nossos  governos,  podemos  fazer  para  nos  tornar  muito  mais  eficientes;  e,  graças  a  isto,  menos  dependentes  das  ajudas  paternalistas  governamentais  e  menos  vulneráveis  aos  subsídios  e  medidas  protecionistas  dos  países  ricos?".
Terceiro:  Que  seria  muito  mais  frutífero  e  produtivo  que  o  nosso  sistema  de  educação  rural  formasse  e  capacitasse  os  agricultores  para  que  eles  aprendam  a  eliminar  as  ineficiências  tecnológicas,  gerenciais  e  organizativas  que,  com  demasiada  frequência,  estão  presentes  nos  distintos  elos  do  agronegócio.  Porque  é  devido  a  elas  que  seus  custos  unitários  de  produção  são  desnecessariamente  altos  e  os  preços  de  venda  de  seus  produtos  são  desnecessariamente  baixos.  E,  sejamos  objetivos  e  realistas,  é  exatamente  nesta  diferença  –  entre  o  custo  do  Kg  produzido  e  o  preço  obtido  na  venda  do  Kg  comercializado  –  que  está  a  origem  da  falta  de  rentabilidade;  e  é  devido  a  esta  falta  de  rentabilidade  que  eles  estão  tão  dependentes  de  ajudas  paternalistas  de  seus  governos  e  tão  vulneráveis  às  medidas  adotadas  pelos  países  ricos.
Quarto:  Que,  estes  erros  podem  e  devem  ser  corrigidos  com  conhecimentos  e  não  premiados  com  subsídios.  E  esta  correção  depende  muito  mais  da  capacidade  dos  agricultores  que  das  ajudas  paternalistas  que  eles  reivindicam.  Quanto  maior  for  a  eficiência  tecnológica,  administrativa  e  comercial  dos  agricultores,  maior  será  sua  rentabilidade.  Consequentemente,  corrigir  as  ineficiências  da  agricultura  e  da  pecuária  deve  ser  o  ponto  de  partida  se  queremos  enfrentar  os  problemas  econômicos  dos  produtores  rurais  com  seriedade,  realismo  e  objetividade.
É  evidente  que  os  agricultores  não  são  os  culpados  pelos  erros  que,  involuntariamente  e  sem  perceber,  estão  cometendo.  Na  realidade  eles  são  vítimas  do  nosso  inadequado  e  descontextualizado  sistema  de  educação  rural,  desde  as  escolas  fundamentais  rurais,  escolas  agrotécnicas  e  faculdades  de  ciências  agrárias,  até  os  serviços  de  extensão  rural.
Com  pouquíssimas  exceções,  estas  instituições  não  estão  proporcionando,  nem  aos  extensionistas  e  nem  aos  agricultores,  os  conhecimentos  “teórico-práticos”  e  úteis  que  ambos  necessitam  possuir  para  corrigir  as  ineficiências  e  solucionar  os  problemas  da  agricultura.  Sem  sombra  de  dúvida,  a  baixa  qualidade  da  educação  agrícola  é  a  principal  causadora  da  pobreza  e  do  subdesenvolvimento  imperante  nas  zonas  rurais. 
Portanto,  o  melhoramento  da  sua  qualidade  deverá  ser  a  grande  e  urgente  prioridade;  porque,  concreta  e  objetivamente,  não  existem  motivos  para  continuar  postergando-o  e  apresentando  justificativas  para  não  fazê-lo.  As  instituições  de  educação,  e  especialmente  os  educadores  que  nelas  trabalham,  estão  convidados  a  corrigir  as  profundas  debilidades  e  ineficiências  existentes  no  sistema  de  educação  rural. 
Este  não  pode  continuar  omitindo-se  como  se  não  estivesse  causando  os  sofrimentos,  angústias  e  fracassos  de  milhões  de  famílias  rurais  que,  por  falta  de  uma  educação  mais  funcional,  instrumental  e  adequada  às  necessidades  de  vida  e  de  trabalho  no  campo,  seguem  submersas  na  falta  de  oportunidades,  na  desesperança  e  na  frustração. 
O  sistema  educativo  deve  assumir  a  responsabilidade  de  proporcionar-lhes  uma  educação  que  lhes  permita  deixar  de  ser  o  grande  problema  para  transformar-se  na  grande  solução  para  os  problemas  da  agricultura  e  do  desenvolvimento  nacional.
Como  executar  na  prática  esta  proposta  educativo-emancipadora?
Na  seção  "Artigos  do  autor"  da  página  web  http://www.polanlacki.com.br  e  http://www.polanlacki.com.br/agrobr 
No  Livro  dos  Pobres  Rurais estão  disponíveis  os  seguintes  textos:
a)  Os  que  descrevem  as  medidas,  muito  simples  e  de  baixo  ou  zero  custo,  que  todos  os  agricultores    poderiam  adotar,  por  mais  escassos  que  sejam  seus  recursos,  por  mais  adversas  que  sejam  suas  condições  físico-produtivas  e  por  mais  débeis  que  sejam  os  apoios  de  seus  governos;
b)  Os  que  propõem  que  e  como  fazer  para  adequar  o  sistema  de  educação  ao  que  as  famílias  rurais  realmente  necessitam  aprender  para  tornarem-se  mais  auto-dependentes  e  mais  “auto-gestionárias”.
Até  aqui  estão  descritas  as  sugestões  destinadas  a  simplificar,  “descomplicar”,  "desideologizar"  e  despolitizar  a  solução  dos  problemas  da  agricultura,  fazendo-o  com  as  ferramentas  da  ciência,  da  tecnologia,  da  administração  rural  e  da  prática  da  auto-ajuda  entre  os  produtores  rurais.
E  quem  deverá  fazê-lo:  os  ministros  e  outras  altas  autoridades  ou  os  próprios  educadores?
-  O  ministro  e  os  secretários  estaduais/municipais  de  educação,  os  reitores  das  universidades,  os  diretores  das  faculdades  de  ciências  agrárias  e  das    escolas  agrotécnicas  e  os  diretores  dos  serviços,  públicos  e  privados,  de  assistência  técnica  aos  agricultores.
-  E,  muito  mais  que  as  autoridades  mencionadas  no  item  anterior,  os  próprios  educadores;  porque  existem  medidas  "eficientizadoras"  e  “melhoradoras”  da  educação,  cuja  adoção  absolutamente  não  depende  de  recursos  adicionais  nem  de  decisões  políticas  das  altas  autoridades  educativas.

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.