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Produção de Animais cruzados exige manejos diferenciados



Guilherme Augusto Vieira

Estudos apontam como o consumo e qualidade da água, sombreamento de pastagens e usos de suplementos nutricionais influenciam na produção de animais F1

 

Vieira, Guilherme A.[1]

Moraes, Júlia V.S. de[2]

 

INTRODUÇÃO

 

A pecuária brasileira passa por grandes transformações em seus processos produtivos com a introdução de novas tecnologias (biotécnicas reprodutivas e usos de suplementos) e sistemas de produção.

Segundo a ASBIA[3] (2023), em 2023 foram comercializadas 22,5 milhões de doses de sêmen no Brasil. Desse total, 17,1 milhões de doses foram da pecuária de corte. Atualmente, o Angus é a raça taurina com o maior número de touros em coleta no Brasil, sendo 232 touros ativos em coleta, dos quais 157 de origem nacional, que representam a seleção genética de 36 selecionadores da raça em todo o país (ABA, 2024).

O aumento de touros em coleta da raça Angus, evidencia uma tendência da pecuária nacional em produzir animais cruzados (heterose) via cruzamento industrial, com produção de animais diferenciados, altamente produtivos e ajustados ao ambiente de produção a pasto e intensivo.

O cruzamento industrial é realizado utilizando-se uma fêmea zebuína (Bos indicus) e um macho taurino (Bos taurus). Essa técnica objetiva o aumento no ganho de heterose[4]  e complementaridade das características esperadas para desenvolver a produção de uma carne mais nobre em ambientes mais rústicos, gerando resultados produtivos

Almeja-se, com o cruzamento industrial, ganho genético na geração F1, a produção de animais precoces, altamente produtivos, mais pesados, adaptados as condições ambientais dos trópicos (produção a pasto e intensivo), carcaças bem-acabadas e carne de ótima qualidade

Entretanto, para que o cruzamento industrial tenha resultados efetivos quanto aos objetivos propostos, é necessária uma escolha criteriosa de seleção e melhoramento genético tanto dos machos quanto das fêmeas, nos quesitos precocidade (crescimento e desenvolvimento dos animais), ganho de peso e adaptação ao meio ambiente. Para que isso ocorra, é de bom alvitre consultar técnicos e empresas especializadas para uma boa orientação.

O processo produtivo do cruzamento industrial não pode ser executado de maneira isolada. É preciso entender que as estratégias nutricionais, sanitárias e manejos ambientais fazem parte do processo.

Com o objetivo de analisar os fatores que contribuem para uma produção de animais cruzados efetiva, o presente artigo abordará os fatores ambientais e nutricionais.

1.FATORES FUNDAMENTAIS PARA A PRODUÇÃO DE ANIMAIS CRUZADOS

Neste item, serão abordados os fatores que interferem na produção de animais cruzados, como consumo e qualidade da água, sombreamento de pastagens e uso de suplementos nutricionais (oral e injetáveis).

  1. O consumo e a qualidade da água como fatores de desempenho

A água é o principal nutriente na alimentação animal e a substância de maior participação no organismo dos seres vivos. A qualidade da água, bem como o baixo consumo, podem levar a queda de produção de leite, a um menor ganho de peso, dificul­tar a regulação térmica, aumentar a incidência de do­enças, ocasionando sérios prejuízos para a produção animal 

O consumo de água é regulado por fatores extrínsecos, como a temperatura ambiente, a tempe­ratura da água, a umidade relativa e o consumo de sódio, assim como também por fatores intrínsecos, como a pro­dução de leite, peso corporal e raças. Os animais taurinos consomem mais água que os animais zebuínos, especialmente com a elevação da temperatura ambiente.

         Os estudos comprovaram que, quanto maior o consumo hídrico, maior eficiência alimentar e aumento do consumo de matéria seca e consequente ganho de peso.

Estudos realizados recentemente compararam o consumo  de água por parte de animais mestiços de Nelore e Hereford quaanto o consumo de água, ganho de peso diário em bebedouros e açudes  Ao final, constatou-se que os animais que tiveram acesso ao bebedouros artificiais apresentaram um consumo superior (29%) aos que beberam água nos açudes. Quanto ao ganho de peso diário, os animais do grupo de consumo de água nos bebedouros tiveram um GMD de 467g ante 362g dos animais que acessaram o consumo nos açudes.

1.2 Os animais cruzados e o conforto ambiental

Os animais, assim como os seres humanos sob estresse térmico, quando expostos a temperaturas elevadas e umidade relativa do ar baixa, têm suas atividades comprometidas, o que ocasiona alterações sobre o consumo de alimento e água, crescimento/desenvolvimento, produção de leite e reprodução, bem como afeta seu comportamento (atividades físicas, postura corporal, busca por sombra).

Nas produções de pecuária de corte e leite, uma das maneiras de proporcionar o conforto térmico aos animais é o sombreamento de pastagens (sistema silvopastoril[5]) e o sombreamento artificial através de telas de polietileno, este, usado principalmente em confinamentos.

O uso de sistemas silvopastoris (SSP), apresenta efeitos benéficos, tais como a incorporação de nutrientes e o incremento da atividade microbiana do solo, a melhoria do conforto térmico e, consequentemente, comportamento dos animais. O desenvolvimento dos animais proporcionado pelo conforto térmico, harmoniza um melhor consumo de forragens e consequente aumento da produção de carne e leite.

Os animais mantidos no sistema silvopastoril, pastejam mais do que os animais do sistema convencional.

Estudos realizados para avaliar comportamento de três grupos de animais: zebuínos (nelore), cruzados (caracu) e taurinos (angus vermelhos mocho), disponibilizados em áreas com pastejo sombreado artificial e tela artificial, áreas com tela artificial e água para imersão e outra área com água para imersão. Ao final, os resultados demonstraram que os animais da raça angus, utilizaram os recursos de proteção com maior frequência durante o dia. Ficavam em ócio e em ruminação grande parte do dia. Os animais caracus, utilizaram os recursos de proteção de frequência mais moderada e pouco utilizaram os recursos de imersão.

Os animais da raça Nelore, nas condições do trabalho, pouco utilizaram ou não utilizaram os recursos de proteção, mesmo nas horas mais elevadas do dia. O trabalho demonstrou que o pastejo ocorria de maneira mais intensa ao amanhecer e o entardecer.  Concluiu-se que os bovinos utilizam o sombreamento como mecanismo de defesa contra as altas temperaturas e radiação solar e que o uso da água é um mecanismo secundário.

1.3 Uso de suplementos orais (rações e proteinados) e injetáveis na produção de bovinos

Na produção extensiva, teoricamente as forragens devem ser capazes de fornecer os nutrientes necessários para atender às exigências dos animais em pastejo, quais sejam energia, proteína, vitaminas e minerais. Entretanto, produção pecuária no Brasil apresenta períodos secos, solos com baixa fertilidade, fatores que levam a baixa qualidade nutricional das pastagens, baixo valor nutricional, em questão ao teor de proteína, energia e minerais, principalmente no período seco do ano, fator esse que acaba afetando o desempenho desses animais criados em sistemas extensivos, sendo necessário uma suplementação nutricional para otimizar o ganho de peso e complementar a dieta com o que o pasto não fornece.

Atualmente, existem vários tipos de suplementos utilizados pelos produtores com a finalidade de suprir as deficiências nutricionais das pastagens e melhorar o ganho de peso diário (GPD), a se destacar: suplementos minerais proteicos energéticos, uso de rações concentradas nas dietas dos animais a pasto e confinamento e suplementos injetáveis com estimulantes orgânicos .

Recentes estudos avaliaram o uso de suplementos proteico energéticos no período chuvosos em animais mestiços e nelorados, constatando que os animais apresentaram incremento no ganho de peso, mesmo com altas taxas de lotação, ressaltando que a suplementação e as exigências nutricionais, bem como a qualidade das forragens, devem ser ajustadas.

Em trabalhos de revisão, buscou-se medir o comparativo do desempenho produtivo de animais da raça Nelore e animais cruzados advindos do cruzamento industrial nos sistemas de produção semi-intensivo e confinamento. Após análise dos resultados, chegou-se à conclusão, nos trabalhos analisados, que os animais da raça Nelore de genética superior, se adaptam melhor a sistemas semi-intensivos a pasto quanto ao desempenho produtivo, enquanto os animais cruzados apresentam índices de ganho de peso superiores em relação ao Nelore, em sistemas intensivos de confinamento.

Atualmente, o mercado oferece suplementos injetáveis com estimuladores orgânicos que contém em sua formulação minerais e aminoácidos, cuja proposta é aumentar o metabolismo, auxiliar no crescimento e na suplementação de aminoácidos. Outros suplementos injetáveis apresentam em suas formulações vitaminas A, D, E, Complexo B, minerais e aminoácidos essenciais. Alguns suplementos injetáveis podem conter proteínas em sua formulação.

Os aminoácidos são compostos de ligações peptídicas que desempenham papéis importantes no organismo, como a síntese de proteínas, de hormônios, formação muscular, melhora do desempenho físico e diminuição da perda muscular. Tem, como objetivo, corrigir as deficiências nutricionais da alimentação animal, promover ganho de peso, estimular o crescimento e terminação de bovinos.

. Ao concluir o artigo, constatou-se que o cruzamento industrial é uma importante ferramenta utilizada pelos produtores para a produção de animais cruzados, precoces, com bom desenvolvimento muscular, carcaça bem-acabada e carne de qualidade, desde que sejam obedecidos critérios de seleção genética. A oferta de água de boa qualidade, aliada ao conforto térmico através de sombreamento de pastagens e o uso de suplementos, suplementos injetáveis e rações, propiciam a uma produção efetiva de animais nelorados e cruzados.

 

  • Referências bibliográficas encontram-se a disposição com os autores;

Os estudos foram realizados em parceria com a Noxon Saúde Animal ( Megabov

 

[1] Médico Veterinário, Professor Universitário, Doutor em História das Ciências. Coordenador das plataformas Farmácia na Fazenda e www.semiconfinamento.com.br, Autor do livro Como montar uma farmácia na fazenda e dos manuais semiconfinamento e confinamento. Contato com autor: [email protected]

[2] Acadêmica de Zootecnia – EMVZ da Universidade Federal da Bahia

[3] ASBIA - Associação Brasileira de Inseminação Artificial. Disponível em: https://asbia.org.br/index-asbia/

[4] Entende-se por heterose como o aumento do vigor (desempenho) dos animais híbridos em comparação com as raças puras parentais usadas no cruzamento industrial, resultando em ganho genético decorrente de combinação de características extremas entre as raças (Artman et al., 2014; Tayarol, 2024).

 

[5] Sistema Silvopastoril, consiste na consorciação entre árvores e pastagens, manejo animal na mesma área (Andrade & Pissara, 2011; Souza, 2017).

 

 

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