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O que o gás da Bolívia tem a ver com o seu bolso?



Cláudio Boriola

Desde a última segunda-feira estamos acompanhando com tensão e algum desconforto o desenrolar da inesperada nacionalização iniciada no setor energético da Bolívia. Nesta data, o presidente da Bolívia, Evo Morales, colocou o seu exército para ocupar as instalações de empresas petrolíferas estrangeiras e, conseqüentemente, a Petrobrás.

 

Na verdade, essa nacionalização não é tão inesperada assim. Bolivianos partidários de Morales já manifestaram essa vontade no ano passado, quando ainda eram oposicionistas ao ex-presidente Carlos Mesa. Na época estavam em discussão as tributações impostas às empresas. Enquanto uns defendiam o aumento dos tributos, Morales já falava em nacionalização das riquezas minerais. Meses depois, eleito com 54% dos votos, Morales conta com intenso apoio popular, especialmente nas camadas mais pobres da sociedade boliviana. É daí que vem a segurança para realizar um ato tão radical quanto esse.

 

O Presidente Lula pretende, dentro do possível, reagir de forma diplomática, negociando cada passo da retomada das instalações. Mas a Petrobrás já fala em resolver o impasse no Tribunal Internacional, sediado em Nova Iorque, caso não haja consenso.

 

Mas até que ponto essa briga de cachorros grandes pode afetar o nosso dia-a-dia? Resta esclarecer que não houve um corte no fornecimento, mas sim o aumento do preço. Como cerca de 51% do gás natural consumido no país vêm da Bolívia, um aumento é esperado caso a situação não seja resolvida logo. Quem utiliza o botijão de gás pode ficar mais sossegado, já que estamos falando de outro produto completamente diferente. O gás de botijão (gás butano) é produzido no Brasil a partir do Petróleo. Também há uma certa expectativa entre os motoristas que utilizam o Gás Natural Veicular (GNV) em seus automóveis, principalmente entre os taxistas. Segundo a ABGNV (Associação Brasileira do Gás Natural Veicular), a frota de carros movidos a gás deve chegar a 1,3 milhão até o fim do primeiro semestre de 2006. A entidade aproveita para tranqüilizar os usuários e diz que a possibilidade de aumento é remota. A Comgás, distribuidora do combustível em São Paulo, tem um contrato fixo assinado pela Petrobrás, que não permite alterações de preço para o gás. Caso haja o aumento por parte da Bolívia, a Petrobrás deve absorvê-lo totalmente, sem passar nada para o consumidor final.

 

Entidades como a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o PT (Partido dos Trabalhadores), apóiam a decisão do presidente boliviano. Para elas, trata-se da questão da soberania nacional que está em jogo, e os países sul-americanos precisam acabar com a submissão que existe por parte das elites sociais. Ok, bacana... Discurso bonito! Eles só estão esquecendo que o custo dessa atitude pode recair sobre os bolsos dos brasileiros que, com certeza, estão bem longe de ser a “elite social” do mundo. Na ótica de Morales, da CUT e do PT, “o que está dentro do meu país é meu!” Então, que tal o Brasil nacionalizar algumas empresas multinacionais que atuam aqui? Microsoft, Shell, Sony... Acho que seria um ato suicida, não é? Então, é isso que está acontecendo no nosso país vizinho. Sob a ótica capitalista, sistema em que vivemos e do qual não temos como nos esconder, a propriedade privada deve ser mantida e é intocável.

  

Vale lembrar também que o interesse é recíproco. Da mesma forma que o Brasil tem enorme dependência do gás natural boliviano, o país de Morales também depende do consumo brasileiro: 75% do total produzido são exportados para cá, enquanto somente 10% ficam no país para consumo interno.

 

Para o Brasil, pode restar uma lição. Nós sempre nos preocupamos mais com a Europa e os EUA do que com os nossos vizinhos sul-americanos. Talvez um estudo mais aprofundado sobre nossos hermanos venha a ser útil e evitar que atitudes como essa venham prejudicar o Brasil dos ganhos fáceis no futuro.

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