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O Gestor 24x7


ANDRE MARQUES VALIO
Uma indústria de commodities, seja ela uma agroindústria, uma mineradora ou uma petrolífera, representa alta intensidade de capital e produção de produtos padronizados onde a sobrevivência depende de alta eficiência operacional e regimes de trabalhos em turnos que preenchem 24 horas por dia em 7 dias da semana sem parar mesmo em feriados (santos ou não) e muito menos em jogos do Brasil em Copas do Mundo.

No caso da agroindústria, existem ainda dois fatores complicadores para a gestão: a) Incertezas na previsão climática; b) alta intensidade de mão-de-obra.
Uma usina sucroenergética de médio porte (2.5 milhões de toneladas de cana/ano), que tenha 100% das operações agrícolas mecanizadas terá um contingente de aproximadamente 2 mil colaboradores nos processos operativos, divididos de 20 a 25 frentes de trabalho em 3 turnos de 8 horas por dia.
A operação de abastecimento de fábrica é o que chamamos no jargão empresarial de "just in time", o que na prática significa que 1 carga é descarregada na fábrica a cada 3 minutos, num fluxo de perfeita sincronia, já que cada minuto de atraso significa prejuízo R$700 como mínimo quando falamos de uma indústria de porte médio.
Além disso, a cana é altamente perecível, pois a partir de 12 horas após ser cortada ela começa um processo de rápida deterioração que culmina com a sua perda de viabilidade para a fabricação de açúcar ou etanol entre 48 e 72 horas, dependendo da época do ano.
A tecnologia atual permite modelagens matemáticas altamente sofisticadas para a otimização logística destes processos. Aliás, as principais tecnologias são oriundas de modelos desenvolvidos na Segunda Guerra Mundial para aumentar a eficiência em movimentação e combate das tropas (e por isso podemos dizer que a operação agrícola na produção da cana-de-açúcar tem mais similaridade com uma guerra do que com a produção de outras grandes culturas que são muito menos perecíveis).
Por turno, temos entre 600 e 700 pessoas trabalhando todos os dias, mas mesmo assim os principais gestores da operação trabalham apenas de segunda à sexta entre às 6 e 18h. O resto do tempo, são informados do status da operação por ligações telefônicas, SMS, email ou pelas modernas tecnologias de chat via celular (Whatsapp por exemplo).

A única saída para garantir a eficiência da operação mesmo quando o gestor não está pessoalmente a frente dos trabalhos é DELEGAR!
Mas como delegar?
A melhor e mais segura forma de delegar é quando o gestor é líder e quando é reconhecido como tal perante todos da equipe.
O primeiro passo para que o gestor seja líder é que ele seja confiável e confiante.
A maior parte dos gestores age como um capataz dos tempos do engenho e a palavra de ordem é: "Eu mando aqui!". E por qualquer sintoma mínimo de instabilidade na sua equipe, ele trata seus subordinados com palavras duras e que podem, num momento de exaltação, atravessar a linha limítrofe entre o racional e o assédio moral.
Eu presenciei a ação de muitos "capatazes". Todos tinham em comum a arrogância respaldada no medo que impunham ao time e nunca no respeito e admiração.
Existem pelo menos 11 características marcantes no comportamento que diferem um líder de um "capataz". Neste blog pretendo tratar cada uma delas, inclusive trazendo a todos os estudos de caso que tenho feito ao longo da minha trajetória profissional.
Mas para o artigo de hoje, a pergunta mais importante é: Um "capataz" (figura tão comum na agricultura brasileira) é capaz de delegar?
A resposta é óbvia para mim: NÃO!
Numa operação 24x7, é mandatório o ato de "DELEGAR". Mesmo que o gestor possa ficar 18 ou 20 horas por dia junto à operação (o que eu já vi acontecer com significativa freqüência), mas quando ele não estiver, o caos vai imperar.
O famoso ditado - "quando o gato sai, os ratos fazem a festa" - é uma analogia explícita do comportamento de um time que não tem liderança.
Seja por "vingança", seja por "maldade" ou seja por qualquer outro desvio moral, o fato observado quase que em 100% das situações analisadas, é que na ausência do "capataz" a produtividade do trabalho reduz-se visivelmente. E o interessante é que o efeito é contagioso, pois os colaboradores vêem na figura do chefe a imagem e os valores da empresa. Então, com o fortalecimento gradativo da aversão ao chefe significa também, no médio prazo, uma baixa (e até nula) admiração pela própria companhia.
Já na outra extremidade do espectro, as equipes que têm um líder de verdade, apresentam um padrão homogêneo de produtividade em todos os turnos, independente da presença física de um comandante, pois todos trabalham mais motivados e felizes pois se sentem como time.
Portanto, o Gestor 24x7 existe, basta a ele ser Líder.

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