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Estudo de Caso: Neymar


ANDRE MARQUES VALIO
Hoje vou contar a história de Neymar (apenas uma mera coincidência com o já famoso craque de futebol, ainda mais porque o nosso herói já existia muito antes do jogador aparecer para a mídia).
Neymar nasceu em uma família humilde que migrou para o Estado de São Paulo para tentar a vida nas lavouras das grandes culturas paulistas (café, cana e laranja). Principalmente nas famílias mais sofridas é que surgem os homens de maior envergadura moral, talhados à ferro e fogo.

Antes de eu conhecer o Neymar ele já despontava como um trabalhador diferenciado. Ele iniciou a carreira ainda jovem no corte de cana, mas não ficou lá nem por um mês. O encarregado da atividade precisava de alguém para "medir os eitos" dos cortadores e, como o Neymar sabia ler, escrever e era muito bom em números, ele foi selecionado para ser medidor. Mais uma vez se destacou e, ainda na mesma safra, recebeu uma nova promoção: passou a exercer a função de fiscal de turma, onde a sua atividade era liderar uma equipe de 40 cortadores de cana e garantir o máximo rendimento na atividade. Como Neymar era muito jovem, não obteve muito sucesso na função, pois ele ainda não tinha a maturidade necessária para exercer voz de comando.
Para preservar o Neymar como profissional, o Gerente Agrícola da usina o transferiu para a operação de tratores, passando então a ter o cargo de "tratorista". E foi aí que o Neymar se apaixonou... ele gostava tanto do seu equipamento que passou a acompanhar de perto os mecânicos durante as manutenções preventivas e corretivas do seu tão querido objeto de desejo e, sempre que possível, colaborava com a "mão na chave" para melhorar a disponibilidade mecânica e não ficar parado. Ao finalizar a safra, por ter demonstrado interesse pela mecânica, ele foi alocado para auxiliar aos mecânicos na reforma de entressafra dos equipamentos.
Em sua segunda safra, Neymar não voltou para os tratores, pois foi convidado a operar uma colhedora de cana, máquina extremamente mais complexa, com muito mais comandos e movimentos. E Neymar mais uma vez tirou de letra, mesmo quando a expectativa para a formação de um bom operador de colhedoras é estimada em três safras.
Às vésperas de começar a terceira safra, houve a abertura de vaga para mecânico de tratores e, ao saber disso, Neymar correu para se candidatar, pois viu nesta vaga uma oportunidade de crescimento ainda maior, já que havia na cidade um curso técnico em mecânica oferecido pelo Senai e que ele estava muito interessado em fazer.
Para permitir ao Neymar estudar, o Gerente da Oficina Automotiva fixou o seu expediente no turno A (das 7 às 15h), pois assim era possível assistir as aulas no período noturno.
Na sua quarta safra, o Neymar foi mais uma vez promovido, passando a exercer a função de mecânico de colhedoras, o que exigia dele mais conhecimentos especializados e ele era a pessoa ideal para o cargo, pois tinha conhecimentos tanto de operação quanto de manutenção, o que não é fácil de se encontrar no mercado.
Foi então que eu conheci o Neymar. Ele estava indo para a sua quinta safra na usina, tinha acabado de concluir o curso técnico em mecânica e havia sido aprovado no vestibular de Engenharia Mecânica. Ele me procurou para me pedir uma bolsa de auxílio para pagar a faculdade.
Naquela época, a empresa passava por um sério arrocho orçamentário e toda a política de fornecimento de bolsas de estudos havia sido temporariamente congelada. Mas eu fiquei muito sensibilizado com a história do garoto. Eu o vi como um pai vê a um filho quando este lhe conta seu sonho.

Eu já estava acostumado a lidar com pessoas, afinal naquele momento eu comandava um exército de 3,5 mil indivíduos, eu tinha aprendido a identificar quando eles são sinceros e quando não são. E no caso em questão, não havia dúvidas.
As políticas da companhia eram muito claras e não havia margem de manobra para solucionar o caso de forma convencional. Mas ao mesmo tempo eu encarava o Neymar como um “high potential” e, mais do que isso, ele era alguém extremamente leal e confiável, o que é raro nos dias de hoje.
Eu possuia uma vaga em aberto para líder de mecânica, e a diferença salarial era suficiente para ele pagar 60% do valor da mensalidade escolar. Mas promovê-lo apenas para lhe dar salário não seria correto, além do mais porque em todos os processos seletivos da minha área eu fazia questão de que fossem conduzidos com total lisura, seja em recrutamentos internos ou externos.
Havia outros candidatos com mais experiência para a função e ainda não sabíamos se o Neymar já tinha superado a experiência fracassada de liderança.
Divagando no meu dilema, decidi falar ao Neymar:
AMV: “Garoto, eu não tenho como te ajudar agora com a bolsa. Você sabe da situação difícil que nos encontramos e neste ano está inviável. Mas eu te garanto que vou lutar por uma bolsa pra você no próximo exercício. Até lá você vai ter que bancar o curso sozinho.”
Neymar: “Mas Dr., eu tenho uma esposa e uma filha linda… Não sou sozinho, e é por isso que eu quero estudar. Quero crescer e dar um futuro melhor para elas, e quero muito que minha filha sinta orgulho de mim!”
AMV: “Tem uma vaga em aberto para líder de mecânica. Candidate-se a ela. O processo é transparente e você terá que demonstrar conhecimentos em 3 disciplinas: manutenção mecânica, operações agrícolas e gestão de pessoas. Se você vencer o processo, você conseguirá pagar a faculdade.”
Mesmo com a idéia que eu dei, não fiquei feliz, pois para mim a educação e a qualificação são investimentos, e transferir ao colaborador não era uma alternativa para uma empresa que almejava ser referência nacional em qualidade e produtividade.
Mas Neymar saiu da minha sala otimista, porque sabia que embora tivesse menos experiência, poderia compensar isto com seu diferencial, que era o domínio da operação agrícola. Ele não se importava se a maior responsabilidade viria acompanhada de remuneração e/ou benefícios maiores, mas ele estava focado em dar o seu melhor, de demonstrar a todos que ele merecia crescer.
E não é que ele tinha razão? Foi aprovado no processo e passou a ocupar o cargo de líder, em seguimento a sua carreira vencedora.
Neymar tinha vários motivos para se decepcionar com a empresa, pois tinha ganhado mais responsabilidade mas não iria usufruir financeiramente deste benefício. E, pelo contrário, teria que apertar o ainda já tão comprometido orçamento familiar para continuar os estudos. Mas ele acreditava em sua sorte, pois mesmo com todas dificuldades, a vida sempre sorriria para ele, cedo ou tarde.
Hoje, o “turnover” nas empresas é endêmico e crescente, justamente pela intolerância, tanto de trabalhadores quanto de empregadores que pensam de forma imediatista, como se não existisse o amanhã. Já o Neymar pensava no longo prazo.
Atitudes positivas que fazem do Neymar um campeão:
  1. Perseverança
    Acreditar e investir em si mesmo
    Estar sempre atento às oportunidades
Mas essa saga não termina aqui. Amanhã, mostrarei porque Neymar merece ter a sua história contada e compartilhada neste blog.

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