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Crise: O abuso da especulação financeira



Argemiro Luís Brum
Já é sabido de todos que a crise mundial, que nos atinge desde 2007/08, tem na origem a excessiva desregulamentação do setor financeiro internacional. Através dela, o processo desembocou na economia real a partir do estouro dos empréstimos conhecidos como subprime junto ao setor imobiliário dos EUA. Hoje, passados mais de cinco anos de seu início, a crise continua e não tem data para terminar. Todavia, poucos sabem dos principais desdobramentos que a especulação financeira realizou e que colaboraram em muito para a crise chegar à dimensão que aí está. Dentre esses desdobramentos, vem à tona nos últimos meses a confirmação de grandes manipulações na taxa de juros Libor. Essa taxa interbancária se equivale a nossa Selic, com a diferença de que ela é “gerenciada” pelo Banco Central da Inglaterra e serve de referência, dentre outras coisas, para os contratos de dívida externa entre países, assim como negociações de ativos bursáteis pelo mundo afora. Pois bem, segundo Rama Cont, diretor de pesquisas do CNRS/Paris-França (cf. Le Monde, 03 e 11/07/2012), entre 2005 e 2009 um grupo de bancos internacionais, liderados aparentemente pelo Barclays (mais uma vez ele) abusou de manipular a referida taxa de juro. Junto com ela igualmente foi atingida a Euribor (taxa interbancária europeia, igualmente muito importante e que serve de referência aos produtos financeiros negociados em Bolsa). As duas juntas são referência para nada mais nada menos do que US$ 500 trilhões em negociações de ativos pelas Bolsas do mundo. Sim, isso mesmo, eu escrevi US$ 500 TRILHÕES! A cada dia, as 11 horas da manhã (hora inglesa), a Associação dos Banqueiros Britânicos e a Federação Bancária Europeia solicitam a um grupo de bancos a que preço eles irão emprestar dinheiro aos seus pares. A média das respostas permite de calcular a Libor e a Euribor. Não foi difícil, para os traders do Barclays, e de outros bancos, compreenderem que ali estava uma chance de ganhar dinheiro fácil. Bastava baixar ou aumentar as suas taxas submetidas diariamente às duas entidades citadas, fato que lhes permitia antecipar o comportamento da Libor e da Euribor no mercado. Como é a Tesouraria dos bancos e não os traders que decide, de forma independente, a submissão destas taxas às federações bancárias, buscou-se subornar alguns responsáveis internos desta pelo processo para que o dispositivo se colocasse em prática a partir de 2005.
Crise: O abuso da especulação financeira (II)
O mundo ainda não conhece a amplitude das fraudes que nesse período foram cometidas pelos envolvidos. Porém, é certo que tais ações auxiliaram no estouro e continuidade da crise mundial, com consequências que se mantêm, mesmo após a sua descoberta, em princípios de 2010, e agora realmente divulgadas. Ao manipular as taxas citadas os bancos escondiam a real saúde do setor bancário (seu risco de crédito), informando uma realidade que já não existia a partir de 2007, quando do estouro da crise pelo seu lado virtual. Assim, os traders envolvidos aumentaram seus lucros entre 2005 e 2007 particularmente, deixando o problema para o resto do mundo. Por outro lado, ao anunciarem taxas interbancárias mais baixas à realidade, especialmente a partir de 2007, não alarmavam o mercado que já estava combalido pela crise que eles ajudaram a gerar. Por enquanto, o Barclays é o primeiro banco a ser condenado pelo ato, porém, outros tantos estão sendo julgados. O problema é que a consequência de tais atos ajudou a colocar a humanidade em crise, com a eliminação de empregos, empresas, poupanças e mesmo vidas aos milhares. É disso que se trata quando se fala de que o mundo precisa criar um novo sistema de regulação sobre suas finanças. O mesmo precisa impedir que tais crimes se perpetuem e fiquem escondidos atrás da singela e hipócrita frase “eu não sabia de nada”, como muitos diretores dos bancos envolvidos nesse escândalo afirmam. Estranhamente, uma frase muita conhecida dos brasileiros por ocasião do escândalo do mensalão.

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