CI

Citricultura: novo estágio eufórico?


Evaristo Marzabal Neves

Devido às características de sua competitividade mundial, concentrada em 2
regiões do mundo (Estado de São Paulo no Brasil e Florida nos EUA), costuma-se ouvir
que o mercado citrícola é mais previsível do que o de outras commodities do agronegócio.
Por exemplo, para a soja tem-se 3 grandes países competidores (EUA, Brasil e Argentina) e
outros com produções menores, mas que estão no mercado e, por sua vez, em cada um
desses países, a produção se distribui em diversos estados e/ou regiões. Em 1996,
escrevemos um artigo que ao evidenciar essa característica da citricultura anunciávamos
que o suco concentrado de laranja é, mundialmente, uma commodity sui generis, condição
que permanece até hoje.
O fato de São Paulo e Florida predominarem na produção mundial de laranja e
serem os detentores da hegemonia da produção de suco, facilita o entendimento da sua
balança mundial de oferta e demanda.
Num mercado competitivo, a previsão de um preço futuro de um produto se
baseia no balanço mundial da oferta e demanda. Nesta, se a informação é fidedigna, tem-se
boa sinalização do futuro.
Imagine uma balança onde os pratos representam a oferta e a demanda e o fiel é
o preço. No prato da oferta doméstica, a disponibilidade anual é representada pela
somatória do carry-over (estoque de passagem ou remanescente, transferido do ano
anterior) mais a produção e mais as importações realizadas. No outro prato, tem-se a
demanda representada, principalmente, pelo consumo e exportações. Pois bem, ajustada a
igualdade, o que sobra é o estoque de passagem.

Como é que ficou a balança da oferta e demanda norte-americana após a
passagem dos furacões Charley (13/08/04), Frances (05/09), Ivan (16/09) e Jeanne
(25/09/04) na Florida?
Naturalmente que a projetada oferta americana para 2005 teve que ser revista,
pois para uma produção esperada de cerca de 240 milhões de caixas, estimou-se uma queda
próxima à 150 milhões de caixas. Tudo bem, se o carry-over existente é suficiente para
atender a demanda, mas se é preciso, urgente, lançar mão dos estoques para satisfazer os
consumidores, vai faltar laranja; então, aumentam-se as importações. Foi o que ocorreu,
pois é conhecido que no fechamento da última safra (01/07/2004 a 30/06/2005), os EUA
aumentaram em 49% suas importações do Brasil (cerca de 200 mil toneladas contra 134 mil
toneladas na safra anterior).
Como a temporada de furacões e tempestades tropicais está apenas começando
na Florida e com a detecção de focos de cancro cítrico em uma ou outra região produtora
floridiana, especula-se no mercado que a safra 2005/2006 deverá registrar uma colheita que
oscilaria entre 185 a 215 milhões de caixas, considerada insuficiente para reposição de
estoques de controle e manutenção. Este é um sinal de que a procura mundial por suco
concentrado estará aquecida em 2006. Analistas de mercado sinalizam uma demanda
insatisfeita até 2008.
Esta é a situação presente da citricultura da Flórida. E a balança oferta-demanda
brasileira? Como anda? Estaria o Brasil se preparando ou preparado para o momento em
que os sinais evidenciam uma expectativa de oferta de suco aquém da demanda mundial
para os próximos anos?
A grande incógnita no prato da oferta brasileira é a imprecisão da produção. Não
se chega a um acordo, pois não se têm números concretos. Já se leu que para o Instituto de
Economia Agrícola (IEA/SAAESP), a previsão de safra (tomando todo o Estado de São
Paulo) bateria nos 349 milhões de caixas; para o mercado, há sinalização de 326 milhões de
caixas; a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Citros (Abecitrus) estima
uma produção oscilando entre 301 a 310 milhões de caixas na região que abastece a
indústria (Cinturão Citrícola do Estado e Triângulo Mineiro) e, para a Associação Brasileira
de Citricultura (Associtrus), não vai além de 290 milhões de caixas. Se não chegar a 310
milhões de caixas, ter-se-ia um registro da menor produção desde a safra 1993/94. Como a
indústria vem prevendo um processamento de 260 milhões de caixas, o mercado interno
passará com uma oferta menor (por outro lado, preços melhores para os citricultores), já
que o cálculo feito é uma “conta de subtrair” (total da safra menos a fruta que vai para a
indústria).
Pela imprecisão de informações sobre a produção, a incógnita é saber qual o
carry-over (estoque de passagem) para 2006.
Como para o mercado o custo de informação é quase zero e a comunicação é
imediata, as respostas são rápidas. O mercado vem sinalizando preços acima de US$ 1.500
por tonelada de suco concentrado. A Bolsa de Nova Iorque registrou valores próximos a
US$ 1.600/t nos preços do contrato para vencimentos em setembro. Nos contratos de
opções desta Bolsa, os investidores apostam em preços superiores a US$ 1.600/t entre
fevereiro e março de 2006 e, o preço do suco em Roterdã (Holanda) saltou de US$ 680/t em
janeiro para US$ 1.300/t em julho, crescimento de 91%. Em São Paulo, citricultores estão
fechando contratos por 3 safras a US$ 3.80/cx e na terceira semana de julho, segundo o
CEPEA-ESALQ, a laranja para indústria esteve, na média, cotada a R$ 8,60/cx, cerca de
US$ 3.70/cx (R$ 8,60 ÷ R$ 2,33 = R$ 3,69).
Para um estágio eufórico como este, como é que a indústria brasileira vem se
preparando? Para a Valio Inteligência Competitiva (Market Report, vol 2, Edição 17,
18/07/2005) “A indústria brasileira está se preparando para o provável excelente momento
das exportações de suco que deverá acontecer a partir de 2006 e deverá perdurar até 2008.
As 4 gigantes do setor (quatro “Cs”) estão, inclusive, se movimentando rumo ao Nordeste
(Sergipe e Bahia) aproveitando-se da disponibilidade de indústrias processadoras e matériaprima
nesta região para alavancarem sua produção e obter suco com “ratio” mais elevado.
Têm sido muito comuns às propostas de realização de ‘Toll Processing’ e aquisição de
grandes volumes de frutas junto aos empresários dessa região”. Explicando o “Tool
Processing”: é um acordo contratual onde produtores arrendam parte da capacidade de
indústria e processam sua fruta. No final, efetuado o processamento, os produtos derivados
(sucos e sub-produtos) são dos produtores que são livres para sua comercialização, se
utilizando ou não da própria estrutura comercial e exportadora da indústria.
A citricultura brasileira, em particular a paulista, poderá estar vivendo um novo
estágio eufórico. Momento apropriado para um “cachimbo da paz”, principalmente entre
citricultores e indústria, pois bem organizados e informados, sem deixar prevalecer o
oportunismo, os setores produtivos e o cinturão citrícola paulista, compartilhando o
momento favorável, têm muito a ganhar na formação de capital e crescimento de renda, na
geração de emprego, na captação de divisas e, o que é muito importante, no revigoramento
da citricultura e na ativação do setor terciário regional em seu comércio, seus serviços,
transporte e, em todas as empresas e organizações do “antes da porteira” e do “pósporteira”
ligadas à citricultura. São mais dólares irrigando as regiões produtoras, agregando
e adicionando valor e melhorando o Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios citrícolas.

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.