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Campanha contra transgênicos se aprofunda no ridículo e falseia informações


Reginaldo Minaré

Após entregar denúncia desprovida de fundamentação ao Comitê de Cumprimento do Protocolo de Cartagena da Organização das Nações Unidas, afirmando que no Brasil o Governo permanece inerte diante dos plantios ilegais de transgênicos e que não foram realizados estudos sobre riscos do milho transgênico, as organizações não governamentais que promovem a campanha “Por um Brasil livre de transgênicos” - e já contribuíram enormemente para aprofundar o atraso do Brasil no campo da engenharia genética - direcionam suas ações contra o Projeto de Decreto Legislativo – PDS 90, de 2007, que tramita no Senado Federal.

O PDS 90/07, de autoria da senadora Kátia Abreu, tramita na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado Federal, está pronto para a pauta, com relatório favorável do senador Marconi Perillo.

No Boletim da campanha “Por um Brasil livre de transgênicos” nº 395, de 30 de maio de 2008, os articuladores da ação afirmam que “ruralistas tentam derrubar rotulagem de alimentos transgênicos”, e pedem que cartas sejam enviadas aos senadores para impedir a aprovação do PDS.

Diante de mais essa ação danosa ao interesse nacional, é necessário demonstrar que o material da campanha falsea informação para influenciar o indivíduo e a coletividade e, assim, conseguir que sirvam a seus interesses. Visto que afirmar que por meio do PDS nº 90/07 os ruralistas estão tentando derrubar a rotulagem de alimentos transgênicos é léria pura, é fala astuciosa que objetiva iludir, enganar.

O que se pretende realizar com o PDS nº 90/07 é afastar do ordenamento jurídico duas ilegalidades flagrantes, manifestas precisamente no artigo 3º, do Decreto nº 4.680, de 24 de abril de 2003, que regulamenta o direito à informação quanto aos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, e na Portaria nº 2.658, de 22 de dezembro de 2003, do Ministério da Justiça, que regulamenta o disposto no § 1º, do artigo 2º, do Decreto nº 4.680, de 24 de abril de 2003.

O citado artigo 3º exige que os alimentos e ingredientes produzidos a partir de animais alimentados com ração contendo ingredientes transgênicos deverão trazer no painel principal, em destaque, a seguinte expressão: "(nome do animal) alimentado com ração contendo ingrediente transgênico" ou "(nome do ingrediente) produzido a partir de animal alimentado com ração contendo ingrediente transgênico". Efetivamente, trata-se de um dispositivo que não merece ser levado a sério e sobreviver no ordenamento jurídico.

Primeiro, porque para que o dono de uma pizzaria possa informar em seu cardápio que o presunto utilizado na pizza foi produzido com a carne de um porco que foi alimentado com ração que continha ingrediente transgênico, será necessário construir um sistema de rastreabilidade que onerará sobremaneira a cadeia produtiva, elevando o preço do produto final ao cliente apenas para que esse consumidor tenha uma informação que sem a qual a relação de consumo continuará tal e qual.

Segundo, a Lei 11.105/05 exige rotulagem especial apenas nos produtos que contenham organismos geneticamente modificados ou produtos derivados desses organismos. Um animal que é alimentado com ração contendo farelo de milho geneticamente modificado não se torna um animal transgênico e, consequentemente, o que é exigido pelo artigo 3º do Decreto nº 4.680/03 está na contramão do que é estabelecido na Lei 11.105/05.

No que diz respeito à portaria nº 2.658/03, do Ministério da Justiça, a situação não é diferente. Na referida Portaria foi definido com símbolo que comporá a rotulagem dos produtos transgênicos um triangulo com a letra T ao meio, com o T sempre grafado em preto e quando na versão colorida ostentará um fundo amarelo, signo que mais lembra um sinal de trânsito indicador de perigo, de alerta, do que o rótulo de algum alimento. Efetivamente, aplicar um símbolo dessa natureza no rótulo de um produto alimentar que já teve sua biossegurança avaliada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio é afrontar o inciso III do artigo 4º do Código de Defesa dos Consumidores, que assegura a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e a compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico.

Evidente, portanto, que os senadores não estão tentando derrubar a rotulagem de alimentos transgênicos. Visto que afastadas as ilegalidades absurdas que este arcabouço normativo infralegal ostenta, o Decreto nº 4.680/03 continuará, juntamente com a Instrução Normativa Interministerial nº 1, de 1º de abril de 2004, disciplinando, nos termos do artigo 40 da Lei 11.105/05 e do Código de Defesa do Consumidor, a rotulagem de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou que sejam produzidos a partir de OGM ou derivados.

Decididamente, essa campanha “Por um Brasil livre de transgênicos” não deve convencer nem seus integrantes. Será que eles desejam que o Brasil não tenha animais transgênicos produzindo hormônio de crescimento humano, fator IX de coagulação sangüínea, insulina, antitrombina humana III, animais modelos para experimentos e animais com gene silenciado para permitir o xenotransplante? Que são avanços significativos da engenharia genética, utilizados pela medicina, para melhorar a qualidade de vida de pessoas acometidas por doenças até então de difícil controle e tratamento.
 
Brasília, 03 de junho de 2008.
 
Reginaldo Minaré
Advogado e Diretor Jurídico da ANBio
[email protected]

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