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Camisaria Friedman


Gilberto R. Cunha

Thomas L. Friedman é colunista de assuntos internacionais (foreing-affairs) do jornal The New York Times. Ganhador de pelo menos três dos cobiçados prêmios Pulitzer (1983, 1988 e 2002), por suas reportagens e comentários. Também é autor de livros que alcançaram grande sucesso de crítica e de público: “From Beirut to Jerusalém” e “The Lexus and the Olive Tree”, por exemplo. O segundo, editado em 2000, nos Estados Unidos, pela Anchor Books, repercutiu mundialmente, sendo traduzido para 20 línguas.

Em “The Lexus and the Olive Tree”, Thomas L. Friedman, valendo-se das habilidades de comunicação do jornalismo e da vasta experiência acumulada em trabalhos realizados ao redor do mundo para o The New York Times, analisa, de maneira original e atraente, o sistema internacional que dá forma e caráter aos tempos atuais: a globalização.

O livro de Friedman trata do conflito e das contradições que estão nos bastidores do embate travado entre um novo sistema econômico global (the Lexus) e as forças conservadoras atreladas a aspirações nacionais e a identidade cultural dos povos (the Olive Tree). Em essência, busca deixar claro que não é possível compreender o mundo de hoje, sem um entendimento desse novo sistema, que, por diferentes razões e meios, influencia cada vez mais as políticas domésticas e as relações entre países.

Que é efetivamente a globalização? Como ela afeta os indivíduos e as nações? A globalização pode anular as individualidades? Encontrar respostas para esses questionamentos não é tão simples quanto aparenta. Auxiliar nessa busca, nos parece que seja o propósito que motivou Thomas L. Friedman a escrever “The Lexus and the Olive Tree”.

O mundo, nos últimos 200 anos, passou por dois períodos de globalização. O primeiro ciclo, iniciado em meados dos anos 1800 (época das migrações; quando por aqui chegaram os italianos), sob domínio da Inglaterra, foi quebrado pela I Guerra Mundial (1914), pela Revolução Russa (1917) e pela Grande Depressão (anos 1930); e culminou com a II Guerra Mundial, em um mundo separado física e ideologicamente, após 1945. Sobreveio a Guerra Fria, com as denominações, embora ultrapassadas ainda familiares, de países de primeiro mundo (desenvolvidos do lado ocidental) e de terceiro mundo (subdesenvolvidos). Ficando, por exclusão, como segundo mundo, os aliados do bloco socialista pró ex-União Soviética. A queda do Muro de Berlin, em 1989, marcou o fim da Guerra Fria. Surgiu, sob a égide dos Estados Unidos, um novo sistema internacional, permeando as fronteiras nacionais, com base na integração de capital, tecnologia e informação, chamado de globalização. E, com ele, uma aldeia global separada em países desenvolvidos e países em desenvolvimento.

Foi a tecnologia digital, especialmente, que, superando as distâncias, possibilitou a globalização da economia. E, no rastro do crescimento de uma economia mundial única, sobreveio a busca de novas formas de governança (a criação da OMC, por exemplo). As forças do mercado global acabam proporcionando os incentivos necessários para que cada nação, voluntariamente, use aquilo que Thomas Friedman denominou de “uma camisa de força dourada”. A “camisa de força dourada” de Friedman corresponde a um conjunto de políticas que implicam em liberalização do setor privado da economia, diminuição da burocracia, manutenção de uma taxa de inflação baixa e eliminação de restrições de capital externo para investimento.

Um país que se negue a vestir a “camisa de força dourada”, ou tente se livrar dela, fica sujeito ao risco de uma debandada eletrônica de capitais. Com isso, um mundo em que o capital se move internacionalmente, acaba não conseguindo manter o crescimento da sua economia e passa a sofrer todas as conseqüências decorrentes. É por essa razão que, no âmbito político, quase sempre, nem governo nem oposição estão preparados (e dispostos) a assumir os riscos de se livrarem da “camisa de força dourada” da economia global. As diferenças entre os partidos, quando no poder, acabam se reduzindo a diferenças menores sobre como melhor se ajustar ao figurino da “camisa de força dourada” de Friedman.

Mesmo não sendo uma sentença definitiva, no mundo de hoje, parece que estamos fadados a ser cada vez mais governados pela nossa própria criação: a economia global. Não é por nada que as camisas da “marca Friedman” são especialmente apreciadas pelos condutores das políticas econômicas dos países em desenvolvimento.

(Gilberto R. Cunha é pesquisador da Embrapa Trigo e membro da Academia Passo-Fundense de Letras.)

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