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Agronegócio - Lições, caminhos e descaminhos


Eleri Hamer
            A moda pegou. É como lei no Brasil. Algumas pegam outras não. Essa pegou. Temos especialistas em Crise no Agronegócio em todo lugar. Têm tantos que já estão afetando o market share dos 180 milhões de técnicos da seleção brasileira em época de copa do mundo. Basta encontrar um grupo de pessoas numa conversa que o assunto é o mesmo: e a crise como está? Será que vai demorar para passar? Pelo menos no interior ou em cidades onde o agronegócio é claramente mais importante que nos grandes centros, essa é a realidade.

Por isso e além de que todos nós brasileiros estamos direta ou indiretamente envolvidos nela, vale a pena que façamos algumas reflexões, sem a intenção atrevida de concluir por outros, mas de contribuir e quem sabe alimentar algumas discussões.

A começar, somos muito ruins em marketing internacional, mas conseguimos ser ainda piores no marketing interno. O Brasil é um país que depende significativamente do rural, mas a nossa população é urbana.

Para relembrar, principalmente nos grandes centros, onde estão mais de 100 milhões dos consumidores e eleitores nacionais pouco se sabe da origem dos produtos que se consome todo dia. Tem gente que pensa que caldo de galinha se cria na caixinha e o galinho na embalagem é só enfeite.

Muitos produtos brasileiros não perdem em nada para os importados, mas são preteridos em favor destes. O vinho é um exemplo clássico disso, embora muitos ainda tomem vinho suave de garrafão e achem ótimo. E o quê falar do café brasileiro que concorre com o colombiano? Prova de que entendemos pouco do que é produzido no nosso chão, ou não sabemos vende-lo.

Para piorar, alguns "entendidos" no agronegócio ainda se referem à produção rural como dissociada do agronegócio. O que pensar do resto da população?  Como vamos obter o apoio da população para a crise se entre nós ainda existem dúvidas?

Por outro lado, existem muitas controvérsias e vários estudos fornecem diferentes informações sobre a importância do agro na economia. Mas alguns dados médios interessantes podem ser analisados sobre a distribuição da riqueza nas cadeias de produção. No caso do pão francês, por exemplo, aquele que você consumidor busca toda manhã na padaria, somente 8% diz respeito ao valor referente a farinha, valor esse que fica com o produtor; no vinho são entre 15 e 20%; frango: 10%; no caso do algodão, dados gerais dão conta que numa camisa 100% algodão, menos de 10% é o valor que fica com o produtor.

Isso nos faz refletir um pouco a perda de recursos e de importância relativa da agricultura na riqueza. É Claro que ninguém mais necessita explicar para nós a importância absoluta da agricultura na economia brasileira. De que na cadeia toda, são exatamente estes que fazem contribuir com boa parte da riqueza do país.

O que é certo é que segundo dados do CEPEA, em 2005, 28,5% foi a parcela que a produção agropecuária representou no PIB do agronegócio, sendo portanto significativa. Porém, isso equivale dizer que diretamente, a produção rural contribuiu com menos de 8% do PIB brasileiro, embora o agronegócio significasse 1/3 de todo o PIB nacional.

Em resumo, o agronegócio e importante? É. Mas a agricultura está perdendo cada vez mais a sua parcela de significância. E isso é muito ruim para a representação econômica, política e outras mais. Prova disso me parece ser a dificuldade em sensibilizar o governo de que a agricultura, ou a parte dela, está passando por uma fase que necessita de ajuda. Controlada, mas necessita de auxílio.

Neste sentido, sabemos que o governo tem grande culpa no cartório, mas o nome dele vem acompanhado de outros. Junto com ele estão também a abundância de crédito, concedida para um setor que historicamente não suporta os custos do mercado, e nesse sentido os setores privado e público não fizeram a lição de casa. No embalo da boa fase dos preços iniciada no final de 2001 relegou a um segundo plano a análise séria das capacidades de gestão e de endividamento do produtor.

Por fim, embora inevitavelmente devam assumi-la tecnicamente, boa parte dos produtores, não todos obviamente, precisam reconhecer a sua contribuição. No excesso de confiança, muitos produtores entraram no efeito manada das commodities, sem se preocupar com os aspectos básicos da economia e da administração. Em suma, de um modo geral, o produtor melhorou tecnicamente de tal forma que é modelo para o mundo todo, mas esqueceu-se de evoluir concomitantemente nos aspectos gerenciais.

A propósito, todos precisam de compensações. O que os produtores vão melhorar se as reivindicações forem atendidas? Qual vai ser a parte dos produtores? Que lições tiraremos de tudo isso?

Penso que está na hora do setor primário do agronegócio se capacitar gerencialmente. Entender melhor dos fundamentos da administração. Entender de custos, finanças, alianças estratégicas, relacionamento interpessoal, gestão familiar e outros. E aí sim, podemos mudar a terminologia de produtor para um autêntico empresário rural.

Refiro-me principalmente aos médios e pequenos que necessitam readaptar o seu modo de produzir para não serem excluídos. Não estou me referindo aos grandes produtores que na maioria possuem estruturas de gestão profissionalizadas, embora ainda muitos tomem decisões baseadas no feeling ou no vizinho, e deixem de lado os dados gerados por suas equipes. Num contra-senso de pagar para não usar.

Está na hora de investimentos maciços em cursos, treinamentos e desenvolvimento de equipes. Capacitar gerencialmente as equipes e principalmente os produtores rurais é a alternativa para permitir que um maior número de produtores sejam capazes de sair dessa crise vivos, produzindo.

Toda crise tem aspectos positivos e inevitavelmente vai haver uma depuração que fará com que a eficiência média do setor melhore ainda mais. Pena que muitos serão excluídos, o que só confirma que a agricultura é uma atividade concentradora de renda. Não há capacidade competitiva para todos.

Para melhorar a compreensão sobre o agronegócio, sugiro a boa música de Chico Buarque: "o Malandro", falando da cachaça e sua cadeia.

Boas inspirações.

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