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Como usar plantas armadilhas para o controle de pragas?

As plantas-armadilhas atraem pragas para que estas não ataquem a cultura principal.


Material feito com a participação do pesquisador Eduardo Rodrigues Hickel da Epagri. Nossos agradecimentos!

 

O que são as plantas / culturas armadilhas?

As culturas-armadilhas são plantas cultivadas para atrair pragas como insetos ou nematoides, de forma que essas pragas não ataquem a cultura principal. As pragas podem ficar concentradas em uma parte específica do campo, onde estão as plantas armadilhas, facilitando a destruição destas.

As plantas armadilhas devem ser mais atrativas para a praga que a cultura principal, e devem ser posicionadas em locais onde possam interceptar as pragas, como por exemplo nas bordas da lavoura. Por exemplo, podemos citar o uso de alfafa para atrair percevejos que atacam o algodão, fazendo com que a praga não prejudique a cultura, e posteriormente eliminar os pulgões da alfafa.

O uso de culturas-armadilhas é uma prática ecológica para o manejo de pragas através da manipulação do habitat. Este método era bastante comum antes do surgimento dos inseticidas, e atualmente é um método bastante útil no manejo integrado de pragas. A prática reduz o uso de inseticidas, podendo reduzir o custo de produção e diminuir o impacto no meio ambiente.

 

Culturas armadilhas convencionais

É a prática mais geral de culturas-armadilha, na qual se planta a cultura-armadilha ao lado da cultura comercial, sendo a cultura-armadilha mais atraente para uma praga, seja para alimentação ou oviposição, prevenindo que a praga chegue na cultura principal.

 

Culturas armadilhas sem saída

São plantas altamente atraentes para as pragas, mas nas quais eles ou sua prole não conseguem sobreviver. Atuam como um sumidouro das pragas. Como exemplo podemos citar a Crotalaria juncea para a broca-das-vagens (Maruca testulalis), ou a erva-de-santa-bárbara (Barbarea vulgaris var. arcuata) para o controle da traça-das-crucíferas (Plutella xylostella). Além do uso de plantas inadequadas para o desenvolvimento dessas pragas, as plantas podem ser transformadas em culturas-armadilhas sem saída através da aplicação de inseticidas ou engenharia genética.

 

Culturas armadilhas geneticamente modificadas

É a manipulação genética de plantas armadilhas, como por exemplo a soja modificada para expressar proteínas de Bacillus thuringiensis (Bt) que controlam algumas pragas. Essas plantas também podem possuir características das modalidades acima, como por exemplo o uso de batatas Bt para atrair besouros da batata, atuando também como cultura armadilha sem saída.

As plantas armadilhas geneticamente modificadas também podem ser usadas para o controle de patógenos transmitidos por insetos. Por exemplo, quando um pulgão que carrega um vírus perfura uma planta transgênica não infectada, o vírus é rapidamente removido do estilete da praga.

 

O que determina o sucesso de uma cultura armadilha?

Características da espécie de praga como o estágio visado pela cultura-armadilha, a capacidade da praga em direcionar seu movimento, o comportamento migratório e a capacidade de localização do hospedeiro.

Quanto ao estágio de desenvolvimento, fêmeas adultas de Lepidoptera, por exemplo, selecionam as plantas para depositar seus ovos, mas são as larvas, que possuem mobilidade limitada, que causam os danos. Nesse caso, para selecionar uma cultura-armadilha com sucesso, é necessário entender a preferência de oviposição. Já o besouro Phyllotreta spp. adulto seleciona as plantas hospedeiras e causa danos, e nesse caso deve-se conhecer a preferência alimentar dos adultos.

A capacidade da praga em encontrar a hospedeira (planta armadilha) deve ser considerada. Por exemplo, estudo feito com mosca-branca mostrou que essa praga possui capacidade limitada em detectar hospedeiros, sendo inadequado nesse caso o uso de culturas armadilhas. Essa praga possui uma dispersão passiva, aleatória e em alta altitude. Nesse caso, culturas armadilhas mais altas que a cultura principal, cultivada nas bordas podem servir como cultura-barreira.

Já espécies de pragas maiores, que geralmente possuem uma melhor capacidade de direcionar o seu deslocamento, como Coleoptera e Lepidoptera, são mais adequados para o uso de culturas-armadilha.

Quanto ao arranjo espacial da cultura armadilha, deve ser levado em conta os padrões de colonização do campo pelo inseto. O cultivo armadilha pode ser perimetral (no entorno da cultura principal), ou em faixas ou blocos. Também pode ser "atrai-repele", com o cultivo armadilha fica em volta do cultivo principal e este é consorciado com uma cultura repelente.

Quanto à capacidade de localizar o hospedeiro, a inibição do movimento é um parâmetro importante que influencia o sucesso da cultura-armadilha para insetos que reconhecem o hospedeiro após o pouso.

A proporção de cultura-armadilha no campo também é muito importante. Proporções baixas podem nao proporcionar um controle significativo, ainda que a cultura-armadilha seja altamente atraente. De forma geral, as diretrizes para cultura-armadilha recomendam cerca de 10% da área total cultivada com a cultura armadilha. Claro, esse valor varia conforme cada sistema de produção, e deve-se balancear a perda de área da cultura principal e benefícios da cultura armadilha.

Entre os exemplos mais eficientes do uso comercial de culturas armadilhas, as pragas envolvidas são das ordens Coleoptera, Hemiptera, Lepidoptera e Homoptera. Nos casos de sucesso com culturas armadilhas, elas forneceram soluções sustentáveis e de longo prazo para o controle de pragas.

 

Cultura-armadilha no arroz irrigado

Conversamos com o pesquisador da Epagri Eduardo Hickel que nos contou um pouco sobre o seu trabalho com o percevejo-do-grão (Oebalus spp.) no arroz. Trata-se de uma praga de difícil controle, que se alimenta de grãos durante o verão, e no inverno permanece em hospedeiros alternativos.

Essa praga se alimenta apenas de grãos, assim, o uso de um cultivo armadilha hospedeiro, produzindo sementes entre novembro e dezembro, pode ser usado para o controle da população de inverno desta praga. Dessa forma, em lavouras de arroz, pode-se utilizar em uma área pequena, uma cultivar de ciclo curto de arroz, semeada mais cedo para atrair a praga, permitindo o controle localizado.

O pesquisador também afirma que a eficácia de um cultivo armadilha depende da abrangência: no caso de pequenas áreas de cultivo, pertencentes a vários produtores, a técnica deve ser adotada pelos diferentes produtores. Caso um produtor realize a técnica sozinho, a sua lavoura ficará sujeita à receber pragas das áreas vizinhas não controladas. Já no caso de grandes propriedades, o produtor consegue ter maior controle das populações de percevejo da área.

 

Quais as limitações do uso de culturas-armadilhas para o controle de pragas?

Um dos fatores que limita o uso de culturas-armadilhas é que estas plantas são bastante específicas para as espécies de pragas, sendo menos práticas do que outras práticas do manejo integrado, e muitas vezes é difícil obter uma planta mais atrativa do que a cultura atacada pela praga. Dessa forma, algumas táticas envolvem usar a cultura para atrair as pragas, facilitando o controle, como vimos anteriormente no caso do arroz.

Além disso, o cultivo de culturas armadilhas exige uma porção da área, que não será cultivada com a cultura comercial, resultando em menor produtividade total. Também é necessário organizar a logística e necessidades das culturas-armadilhas, como datas de plantio, manejos culturais etc. Outro fator é que a taxa de sucesso de sistemas de culturas-armadilhas tendem a ser muito variáveis.

O uso de culturas-armadilhas requer conhecimento técnico das espécies vegetais e das pragas alvo, e em alguns casos podem exigir até a cooperação entre fazendas, visto que as pragas podem ultrapassar os limites das propriedades.

 

Referências:

Abate T. 1988. Experiments with trap crops against African bollworm Heliothis armigera in Ethiopia.Entomol. Exp. Appl. 48:135–40

Aslam M, Gebara F. 1995. Host plant preference of vegetables by cotton whitefly, Bemisia tabaci (Genn.). Pak. J. Zool. 27:269–72

Badenes-Perez FR, Shelton AM, Nault BA. 2005. Using yellow rocket as a trap crop for the diamondback moth, Plutella xylostella (L.) (Lepidoptera: Plutellidae). J. Econ. Entomol. 98:884–909.

Hickel, Eduardo. (2018). Cultivo armadilha para manejo integrado do percevejo-do-grão em arroz irrigado. Agropecuária Catarinense. 31. 10.22491/RAC.2018.v31n1.3. 

Jackai LEN, Singh SR. 1983. Suitability of selected leguminous plants for development of Maruca testulalis larvae. Entomol. Exp. Appl. 34:174–78

Shelton, A. M., Badenes-Perez, F. R. (2006). Concepts and applications of trap cropping in pest management. Annual review of entomology, 51, 285–308.

Silva, M. T. B. da. Comportamento de Sternechus subsignatus (Boheman) em dez espécies vegetais de verão para rotação de culturas ou cultura armadilha no plantio direto. Ciência Rural [online]. 1997, v. 27, n. 4 [Acessado 22 Agosto 2024], pp. 537-541. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0103-84781997000400002>. Epub 14 Maio 2008. ISSN 1678-4596. https://doi.org/10.1590/S0103-84781997000400002.

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