A agricultura favorece pragas, doenças e plantas daninhas?
Entenda como a agricultura favorece a população de pragas, doenças e plantas daninhas
Um ecossistema equilibrado dificilmente fica suscetível à populações de pragas, doenças ou plantas daninhas capazes de causar prejuízos significativos em uma população de plantas, já em um ambiente alterado, com recursos naturais e mecanismo de funcionamento do ecossistema afetados, a ocorrência destes indivíduos indesejados é favorecida.
A agricultura é uma atividade que causa diversas mudanças e perturbações ambientais em um ecossistema, através do desmatamento, monocultivo, tratos culturais, colheita etc.
Os agroecossistemas comparados a um ecossistema natural, possuem:
- menor variabilidade genética;
- menor diversidade de espécies
- menor heterogeneidade do habitat;
- interações tróficas mais simples;
- menor ciclagem de nutrientes.
A transformação de uma paisagem nativa em agroecossistema envolve remoção das plantas e animais na área, o que reduz a biodiversidade eliminando espécies benéficas e importantes na área, como decompositores, polinizadores e predadores de pragas. Um ambiente mais aberto (clareira, pousio, solo descoberto) favorece o estabelecimento de espécies pioneiras e colonizadoras, que possuem alta capacidade reprodutiva, podendo se tornar pragas.
O preparo mecanizado do solo modifica a estrutura química e física do solo, modificando a porosidade, conteúdo de água no solo, ciclagem de nutrientes, insolação, temperatura, umidade relativa do ar e cor da paisagem. Isso resulta em perdas de solo, nutrientes e água, modificações na microbiota do solo, escorrimento superficial, erosão e lixiviação. Esses fenômenos alteram as interações entre plantas, animais, microbiota e ambiente, favorecendo espécies adaptadas a essas condições, que podem se tornar pragas.
Quanto à monocultura, a maioria dos cultivos agrícolas é feita através do monocultivo (apenas uma espécie vegetal), por um período relativamente longo. Nesses cultivos, as pragas que se alimentam de determinadas espécies de plantas não encontram barreiras no caminho (como outras espécies) para encontrar a planta desejada, no caso, a cultura. O mesmo serve para esporos de fungos, por exemplo, que na ausência de outras plantas, atingem com maior facilidade a cultura de interesse. Além disso, ocorre menor resistência ambiental (baixa diversidade e quantidade de predadores, resistência das plantas etc.) para que as pragas possam se reproduzir. Mais ainda, a grande disponibilidade daquele alimento na lavoura faz com que as pragas não precisem competir pelo alimento, reduzindo a taxa de mortalidade. Soma-se a isso o fato de que, o cultivo de uma mesma planta por um longo período de tempo, faz com que a população de pragas vá aumentando com o tempo. O grande número de indivíduos de pragas e doenças ocasiona maior probabilidade de mutações e heterogeneidade genética, o que também favorece esses indivíduos indesejáveis. Ainda, a ausência de outras espécies vegetais que servem de hospedeiros para inimigos naturais das pragas resulta na ausência destes inimigos naturais, favorecendo mais ainda a população de pragas.
O aumento na incidência de pragas, doenças e plantas daninhas resulta em maior uso de defensivos químicos (inseticidas, herbicidas, fungicidas etc.), podendo resultar em um uso excessivo ou inadequado desses produtos, o que resulta em uma pressão de seleção em pragas, doenças ou plantas daninhas. Ocorre que estes produtos eliminam parte da população alvo, mas pode deixar vivos alguns indivíduos que possuam algum gene de resistência a esses defensivos. O posterior desenvolvimento e multiplicação desses indivíduos resistentes irá gerar uma população mais resistente ao defensivo.
O uso contínuo de outros métodos de controle também causa pressão de seleção às pragas, doenças e plantas daninhas, não eliminando indivíduos mais resistentes, por alguma característica genética, que podem se multiplicar, originando grandes populações de indivíduos resistentes. Por isso, é importante o uso de diferentes formas de controle destes problemas.
Quanto à nutrição, em uma planta desequilibrada nutricionalmente ocorre acúmulo de substâncias que reduzem a resistência à doenças. Como exemplo, podemos citar:
- Nitrogênio: alta concentração do nitrogênio reduz a produção de compostos fenólicos e lignina nas folhas, diminuindo a resistência à doenças;
- Potássio: em quantidades adequadas propicia bons resultados na redução do ataque de doenças. Caso haja deficiência desse nutriente, ocorre acúmulo de aminoácidos solúveis que servem de nutrientes à fungos e bactérias;
- Cálcio: também possui bastante importância, a presença do nutriente no tecido das plantas é fundamental para a estabilidade da membrana celular e para a inibição da degradação da parede celular causada por patógenos;
- Silício: é um micronutriente que atua como uma barreira física contra patógenos;
- Boro e zinco: são fundamentais para a integridade de membranas celulares, além de atuar na produção de substâncias que influenciam na resistência da planta às doenças;
Visando uma nutrição equilibrada, devemos aplicar tanto os macronutrientes quanto os micronutrientes mais importantes para a cultura.
Essas e outras características tornam o agroecossistema menos estável, mais sujeito a perturbações e desequilíbrios, podendo resultar em surtos populacionais de pragas, doenças ou plantas daninhas.
Porém, existem métodos de produção agrícola mais ecológicos que podem causar menor impacto sobre o ecossistema. O que pode favorecer o surgimento de pragas, doenças e plantas daninhas é o modelo de cultivo, e não a agricultura em si. É fundamental entendermos a ecologia envolvida na regulação da população de pragas, doenças e plantas daninhas para um bom manejo da produção agrícola. Existem diversas práticas nesse âmbito, e práticas que reduzem os impactos no ecossistema em uma produção agrícola. Como exemplo podemos citar a diversificação da produção vegetal, uso de culturas de cobertura e adubos verdes, uso de cultivares geneticamente resistentes, rotação de culturas, manejo de plantas invasoras, uso de vegetação marginal e corredores biológicos, manejo da época de plantio, uso de adubos orgânicos, manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas etc.
Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo
Referências:
GLIESSMAN, S.R. Agroecologia: Processos ecológicos em agricultura sustentável. 3ª ed. Porto Alegre: Editora Universidade UFRGS, 2005. 653p.
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VITOUSEK, P.M.; D’ANTONIO, C.M.; LOOPE, L.L.; WESTBROOKS, R. Biological invasions as global environment change. Am. Scient. 84:468-478, 1996.