Controle (manejo integrado) da ferrugem-asiática da soja (Phakopsora pachyrhizi)
Leia sobre o controle da ferrugem-asiática da soja.
As ferrugens são doenças causadas por fungos, que atuam como parasitas biotróficos, o que significa que precisam da planta viva (hospedeiro) para sobreviver e se reproduzir. A ferrugem asiática é causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, que é facilmente disseminado pelo vento e pela presença de soja na maior parte do ano.
Quanto aos sintomas, a doença aparece principalmente nas folhas de soja, se iniciando pelo terço inferior da planta, se manifestando através de pontuações escuras minúsculas, com cor esverdeada ou cinza-esverdeada. Ocorrem também partes mais elevadas na face inferior das folhas. Com o progresso da doença, os esporos ficam alaranjados, as folhas ficam amareladas, secam e caem, resultando em uma desfolha, que prejudica a formação de grãos, reduzindo significativamente a produtividade, podendo chegar a até 90% de perdas.
Tais sintomas ocorrem em qualquer estádio de desenvolvimento da planta, porém, a partir do fechamento do dossel, o que resulta em maior umidade e maior sombreamento na lavoura, os esporos do fungo encontram um melhor ambiente para o desenvolvimento, ocorrendo maior incidência da doença.
A infecção do fungo depende da disponibilidade de água livre na superfície da folha, sendo necessário pelo menos 6 horas de molhamento para ocorrer infecção, em condições de temperaturas ótimas (15ºC a 25ºC) ou mais de 8 horas para temperaturas fora dessa faixa.
Além da soja, a ferrugem pode atacar cerca de 150 espécies de leguminosas, incluindo o feijão-comum e soja-perene, além de plantas daninhas como a leiteira, kudzu, beiço-de-boi e corda-de-viola, o que dificulta o controle da doença.
Controle da ferrugem-asiática da soja
Ainda existem poucas cultivares resistentes, os fungicidas vêm perdendo a eficiência devido à resistência do fungo, e para isso deve-se fazer a integração de diferentes medidas de manejo. Ressaltamos a importância do monitoramento da lavoura para definir o momento ideal de controle, o que reduz os danos e o desenvolvimento da resistência do fungo. O Consórcio Antiferrugem é uma ótima ferramenta para monitorar os focos da doença próximos à região de cultivo, e para registrar a ocorrência da doença na sua propriedade, ajudando no combate ao problema.
Vazio sanitário e período de semeadura
Em grande parte do Brasil, as condições são favoráveis para a sobrevivência do fungo durante o ano todo. O vazio sanitário é a ausência de plantas de soja no campo por um período mínimo de 60 dias durante a entressafra. Como o fungo é biotrófico, acaba-se eliminando a ponte verde para a sobrevivência do fungo, quebrando o ciclo de vida do patógeno.
Como resultado, ocorre o atraso das primeiras ocorrências de ferrugem-asiática na safra, reduzindo a possibilidade de ocorrência da doença no início do desenvolvimento da cultura nas primeiras semeaduras, o que pode diminuir o número de aplicações de fungicidas.
O uso de irrigação e clima favorável nas principais regiões produtoras de soja no Brasil possibilita a semeadura da cultura desde o início de setembro até o fim de fevereiro, o que permite diversas possibilidades aos produtores. Porém, semeaduras tardias não são recomendadas, pois recebem inóculos da ferrugem das áreas semeadas no início da safra, o que resulta em incidência precoce da doença e aumento do número de ciclos do fungo em uma mesma safra, o que resulta em aumento do número de aplicações de fungicidas, causando a perda de eficiência desses produtos ao longo do tempo.
Dessa forma, deve-se evitar a semeadura tardia que alonga o período de cultivo da soja, visando reduzir a pressão de seleção de resistência do fungo aos fungicidas. Alguns estados definem datas limites de semeadura de soja para reduzir tais problemas.
Escape / evasão
É a prevenção da doença através da fuga em relação à presença do patógeno / condições ambientais favoráveis a ele. É feito através da semeadura de cultivares precoces no início da época recomendada. Tal prática faz com que os sintomas da doença, quando ocorrem, aconteçam a partir da fase de enchimento de grãos. O potencial de dano da doença reduz conforme a doença incide mais tarde na lavoura. Conforme as semeaduras avançam, os esporos dos fungos passam das primeiras áreas semeadas para as áreas tardias, antecipando a doença e exigindo maiores números de aplicações de fungicidas.
A semeadura em setembro só é possível nos estados em que o vazio sanitário termina em setembro, em condições adequadas de umidade do solo ou com irrigação. Conforme o site Consórcio Antiferrugem, as primeiras ocorrências da doença vêm sendo relatadas em novembro, dezembro e em alguns estados apenas em janeiro.
Resistência genética
O uso de cultivares geneticamente resistentes à ferrugem-asiática é uma importante ferramenta para o controle da doença. Essa prática reduz as perdas de produtividade, reduz o surgimento de resistência do fungo, reduz o custo de produção e diminui o impacto ambiental. As cultivares resistentes e suscetíveis apresentam diferentes lesões quando atacadas pelo fungo.
As cultivares suscetíveis apresentam lesões TAN, de coloração marrom-claro, com grande quantidade de uredósporos, resultando em rápido aumento do número de lesões nas folhas, resultando em um amarelecimento e desfolha prematura da planta.
Já as cultivares resistentes apresentam lesões RB (Reddish brown), de coloração marrom-avermelhada, maiores que as lesões TAN. Essas lesões produzem pouco ou nenhum uredosporo, e não causam amarelecimento e queda de folhas tão intensa.
Folhas de soja infectada com o fungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem asiática da soja, ilustrando as lesões resultantes da infecção. Em A, no verso da folha (face abaxial) lesões de resistência (RB-Reddish Brown) e em B, detalhes das lesões (pústulas contendo as urédias) de suscetibilidade (TAN).
Imagem: Catelli, L. L. / Embrapa.
Vale ressaltar que cultivares resistentes não são imunes à ferrugem-asiática, visto que o fungo também consegue causar lesões nessas cultivares. Dessa forma, mesmo com o uso de cultivares resistentes, deve-se adotar outras medidas de controle da doença. Usar apenas as cultivares resistentes como forma de controle pode acelerar a quebra de resistência dessas cultivares.
Controle químico da ferrugem-asiática da soja
O uso de fungicida é recomendado assim que surgem os primeiros sintomas na lavoura. Já o controle preventivo deve considerar os fatores que ocasionam o surgimento da ferrugem asiática, como as condições climáticas favoráveis, presença do fungo na região e idade da planta, bem como a logística de aplicação, custo de controle e presença de outras doenças.
Os fungicidas podem ser:
- Sítio-específicos: ativos em apenas um(a) único(a) enzima / proteína / ponto da via metabólica do patógeno necessário para a sua sobrevivência. Podem ser absorvidos pelas plantas e tendem a ter propriedades sistêmicas;
- Multissítios: atuam em diferentes pontos metabólicos do fungo, e possuem menor risco de resistência do patógeno comparados ao sítio-específicos. Não é absorvido pela planta, sendo pulverizado nas partes suscetíveis do vegetal, e forma uma camada protetora na superfície da planta que pode ser facilmente lavada com a chuva.
Os principais fungicidas registrados e em fase de registro são avaliados anualmente pela rede de ensaios cooperativos, e os resultados da sua eficiência são publicados no site do Consórcio Antiferrugem. Tais informações devem ser utilizadas em programas de controle da doença.
Os três principais fungicidas sítio-específicos registrados para a ferrugem asiática apresentam adaptação do fungo. A frequente exposição do fungo aos mesmos fungicidas e o aumento do número de aplicações contribuem para a seleção de fungos mais resistentes aos fungicidas. Nas bulas, o intervalo de aplicação foi reduzido de 21 dias para 14 dias devido a resistência do fungo P. pachyrhizi. Caso ocorra a seleção de novos isolados do fungo ou outros mecanismos de resistência, a eficiência desses produtos será ainda menor.
Além disso, essas mesmas aplicações têm contribuído para selecionar populações resistentes dos fungos Cercospora kikuchii (crestamento foliar de Cercospora), Corynespora cassiicola (mancha-alvo) e Colletotrichum truncatum (antracnose).
Como estratégia para aumentar a eficiência de controle, têm sido utilizados fungicidas sítio-específicos misturados com fungicidas multissítios. Para frear o aumento da resistência dos fungos, têm sido recomendadas algumas estratégias:
- Uso de misturas comerciais de fungicidas com diferentes modos de ação e sem resistência cruzada;
- Uso de dose e intervalo de aplicação recomendados na bula, ajustados para a epidemia da doença, evitando extenso intervalo entre aplicações;
- Aplicar preventivamente conforme a presença do fungo na região e condições ambientais favoráveis ao fungo, aplicando próximo ao fechamento da lavoura quando existirem relatos de ferrugem-asiática na região.
Conforme as recomendações do Comitê de Ação a Resistência a Fungicidas do Brasil (FRAC):
- Estrobirulinas: devem ser aplicadas sempre combinadas com triazóis, triazolintione e/ou carboxamidas;
- Triazóis e triazolintione: indicada a associação com estrobilurinas;
- Carboxamidas: devem ser combinadas com estrobilurinas.
Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo
Referências:
BEDENDO, I. P. Ferrugens. In: AMORIM, L.; REZENDE, J. A. M.; BERGAMIN FILHO, A. (Ed.). Manual de fitopatologia: princípios e conceitos. Piracicaba: Agronômica Ceres, 2018. v. 1. p. 355-360.
BROMFIELD, K. R.; HARTWIG, E. E. Resistance to soybean rust and mode of inheritance. Crop Science, v. 20, p. 254-255, 1980.
GODOY, C. V.; ALMEIDA, A. M. R.; COSTAMILAN, L. M.; MEYER, M. C.; DIAS, W. P.; SEIXAS, C. D. S.; SOARES, R. M.; HENNING, A. A.; YORINORI, J. T.; FERREIRA, L. P.; SILVA, J. F. V. Doenças da soja. In: AMORIM, L.; REZENDE, J. A. M.; BERGAMIN FILHO, A.; CAMARGO, L. E. A. (Ed.). Manual de fitopatologia: doenças das plantas cultivadas. 5. ed. Ouro Fino: Agronômica Ceres, 2016. v. 2. p. 657-675.
GODOY, C. V.; SEIXAS, C. D. S.; MEYER, M. C.; SOARES, R. M. Ferrugem-asiática da soja: bases para o manejo da doença e estratégias antirresistência. Embrapa Documentos - 428, Londrina, PR, 2020.
MCGRATH, M. T. What are fungicides? The Plant Health Instructor, 2004. DOI: 10.1094/ PHI-I-2004-0825-01.