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Problemas do uso de agrotóxicos / defensivos falsos ou contrabandeados

Leia sobre os problemas causados pelo uso de agrotóxicos / defensivos falsos ou contrabandeados.



A compra de agrotóxicos no Brasil só é permitida com a receita agronômica elaborada por um profissional capacitado. O receituário contém diversos detalhes, como o nome do produtor, da propriedade, a localização, a cultura, o diagnóstico, o produto a ser utilizado, a recomendação de uso etc.

Porém, em alguns outros países, como o Uruguai, a legislação é menos restritiva. Nesse país, apenas os produtos de maior periculosidade, que representam uma minoria no total de marcas comercializadas, exigem receituário agronômico. Essa diferença de legislação faz com que muitos produtores optem por comprar os produtos no país vizinho e trazerem para o Brasil, sendo a entrada no país com o produto um crime. No Uruguai, é possível também comprar alguns defensivos proibidos no Brasil. Apesar do produtor poder comprar os agrotóxicos fora do Brasil, a repressão da lei resulta em aumento do número de contrabandistas e/ou falsificadores, diminuindo o risco para quem compre. 

Além disso, as práticas também são incentivadas pela diferença de preço: tais produtos no Uruguai e Paraguai são muito mais baratos que no Brasil, encorajando os produtores a cometer tais crimes. Este é provavelmente o principal motivo para o contrabando de agrotóxicos.

Tais práticas podem se enquadrar nos seguintes crimes:

Sanções legais às práticas associadas ao comércio e contrabando de agrotóxicos no Brasil (Lei nº 7802/89).
Criminalização Prática
Crime ambiental Venda sem receituário 
Crimes ambiental e de falsificação  Falsificação ou adulteração de agrotóxico em território nacional 
Crimes ambiental e fiscal Descaminho de agrotóxico de comercialização regular (sonegação de impostos ou de direitos alfandegários)
Crimes de contrabando e ambiental Contrabando de agrotóxicos de marcas "genéricas", elaborados com substâncias registradas e permitidas pela ANVISA
Contrabando de agrotóxicos elaborados com substâncias proibidas pela ANVISA
Crimes de contrabando, ambiental e de falsificação Contrabando de agrotóxico falsificado

Fonte: Adaptado de DORFMAN E REKOWSKY (2011)

 

Os estados com alta produção agrícola, que fazem fronteiras com o Uruguai e Paraguai, são os estados que mais possuem casos de apreensões de agrotóxicos ilegais (contrabando, falsificação ou ingredientes ativos não autorizados). São eles: Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.

O Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF) estima que os agrotóxicos ilegais representam cerca de 25% do mercado total de agrotóxicos no Brasil. Estima-se que o contrabando represente 65% a 70% dos agrotóxicos ilegais, e o restante é representado por falsificação e desvio de finalidade de uso.

 

 

Características dos agrotóxicos / defensivos ilegais

Foi feito um estudo em laudos periciais da Polícia Federal realizados entre 2008 e 2018. Os laudos possuem informações sobre os tipos de produtos apreendidos, análises químicas, país de produção e distribuição etc. Abaixo, vamos observar os principais resultados dessa análise.

 

Autenticidade de agrotóxicos apreendidos pela Polícia Federal.
Autenticidade Descrição Detalhe Distribuidoras estrangeiras (provavelmente contrabandeados) Distribuidoras brasileiras (provavelmente não contrabandeados)
Produtos Percentual Produtos Percentual
Autêntico Continha os mesmos ingredientes ativos descritos no rótulo   935 93,1% 183 73,5%
Falso Continha ingredientes ativos diferentes dos descritos no rótulo Falsificação parcial 14 1,4% 7 2,8%
Falsificação total 45 4,5% 57 22,9%
Não continha agrotóxicos Continha drogas ilícitas ou químicos associados 6 0,6% 0 0%
Continha outros produtos 4 0,4% 2 0,8%
Total 1014   249  

Fonte: de Moraes, 2021

 

Os 10 ingredientes ativos mais apreendidos foram:

  1. Imidacloprido (15,1%);
  2. Metsulfurom-metílico (13,7%);
  3. Benzoato de emamectina (10%);
  4. Tiametoxam (9,8%);
  5. Fipronil (8,3%);
  6. Acetamiprido (6,1%);
  7. Clorimurom-etílico (5,2%);
  8. Tebuconazol (4,4%);
  9. Glifosato (2,9%);
  10. Cletodim (2,7%).

Dentre os produtos apreendidos, cerca de 2,3% eram proibidos no Brasil. Quanto à presença de rótulos, cerca de 0,9% dos produtos em embalagens rotuladas possuíam ingrediente proibido no Brasil, porém, para produtos sem rótulo, esse percentual aumenta para 6,7%. Além disso, os produtos sem rótulo tendem a ter um risco ambiental maior (risco ambiental I ou II) do que os produtos com rótulo.

Quanto ao país de produção dos agrotóxicos contrabandeados e apreendidos no Brasil, temos:

  1. China (77,1%);
  2. Paraguai (7,5%);
  3. Uruguai (7,2%);
  4. Índia (3,0%);
  5. Argentina (1,4%).

 

Consequências do uso de agrotóxicos falsos ou contrabandeados

O uso de agrotóxicos falsos ou contrabandeados colocam em risco a saude da população e do meio ambiente, causa danos à cadeia de produção e comercialização de produtos agrícolas, aproxima produtores do crime, resulta na destinação incorreta de embalagens e resíduos, na sonegação fiscal, no descrédito dos agrotóxicos, diminui a qualidade dos produtos agrícolas brasileiros, o que desvaloriza esses produtos no mercado mundial, dentre outros.

Estudos feitos com amostras de agrotóxicos ilegais evidenciaram:

  • Produtos líquidos muito diluídos;
  • Produtos com concentrações de ingrediente ativo muito acima de produtos registrados no Brasil;
  • Produtos com concentrações muito menores do que as indicadas nos rótulos.

Vale destacar que a maioria dos produtos contrabandeados não são falsos. Porém, nessa prática inexiste a garantia do produto, e os produtos adulterados podem causar consequências. Laudos periciais apontam que produtos acondicionados em embalagens sem rótulos costumam ser mais tóxicos do que produtos em embalagens rotuladas.

Como consequência na lavoura, esses produtos podem causar resultados desastrosos. Devido a menor eficiência agronômica, os produtos não causam o efeito devido, resultando em ônus financeiro e possibilidade de promover organismos resistentes.

Já os produtos com concentrações de ingrediente ativo maiores do que o indicado na bula, ou muito maiores do que os produtos registrados no Brasil, podem causar efeitos tóxicos na lavoura, diminuindo ou até eliminando totalmente a produtividade, além de causar dano ambiental e prejuízos à saúde do produtor e do consumidor.

A maioria dos produtos apreendidos são autorizados no Brasil, porém, uma pequena porcentagem não é. Resíduos do Carbofurano, produto que já foi bastante apreendido e é proibido no Brasil, causam risco agudo à efeitos neurotóxicos, e pode causar toxicidade no desenvolvimento de seres humanos, causando danos comportamentais e danos ao feto durante a gravidez sendo essa uma consequência na saúde dos consumidores. Ainda neste quesito, o Aldicarbe é outro produto que causa tais danos, sendo relacionado à alta incidência de intoxicações humanas e envenenamento de animais, causados pelo desvio de uso do produto.

No transporte, esses produtos são contrabandeados de forma precária em embarcações, caminhões, aviões ou outros meios de transporte, sendo muitas vezes abandonados no ambiente, em lagos, estradas ou em locais próximos à população. Além disso, por vezes são transportados em cargas de alimentos, podendo contaminar esses produtos.

Assim, observamos que o contrabando de agrotóxicos infelizmente é uma prática comum, que traz prejuízos ao estado brasileiro, ao ambiente, à população, à saúde, ao produtor e ao produto agrícola. A prática muitas vezes se associa a atos de corrupção e violência. A legislação e as autoridades brasileiras buscam coibir o crime, porém, a diferença de preços dos agrotóxicos em outros países estimula muito o produtor a consumir tais produtos sem perceber a cadeia de danos causados por essa prática.

 

Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo

 

Referências:

BRASIL. ANVISA. Agrotóxico utilizado como chumbinho é retirado do mercado brasileiro. Ministério da Saúde, 2015. Disponível em: < https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticiasanvisa/anos-anteriores/agrotoxico-utilizado-como-chumbinho-e-retirado-do-mercado-brasileiro>. Acesso em: 17/05/2022.

BRASIL. ANVISA. Termina prazo de descontinuação do uso de Carbofurano. Ministério da Saúde, 2018. Disponível em: < https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticiasanvisa/2018/termina-prazo-de-descontinuacao-do-uso-de-carbofurano>. Acesso em: 02/04/2024.

DE MORAES, R. F. Contrabando de agrotóxicos no Brasil: O perigo é real? uma análise com base em laudos periciais de produtos apreendidos (2008-2018). Texto para Discussão, 2021.

DORFMAN, A.; REKOWSKY, C. J. GEOGRAFIA DO CONTRABANDO DE AGROTÓXICOS NA FRONTEIRA GAÚCHA. Revista Geográfica de América Central, Heredia, Costa Rica, v. 2, 2011.

FRAGA, W. G. IDENTIFICAÇÃO E DETERMINAÇÃO DOS PRINCIPAIS INGREDIENTES ATIVOS EM AGROTÓXICOS ILEGAIS APREENDIDOS PELA POLÍCIA FEDERAL DO BRASIL. Orientador: Dra. Fernanda Vasconcelos de Almeida. 2012. Dissertação (Mestre em Química) - Instituto de Química da Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2012.

IDESF. Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras. O Contrabando de Defensivos Agrícolas no Brasil. 24 de junho de 2019. Disponível em: . Acesso em: 04/07/2021.

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. (2019). CONTRABANDO DE AGROTÓXICOS NO BRASIL: O PERIGO É REAL? UMA ANÁLISE COM BASE EM LAUDOS PERICIAIS DE PRODUTOS APREENDIDOS (2008-2018) (Texto para Discussão nº 2630).

LEMOS, Vanessa Ferreira; CARVALHO, Ana Carolina Brouwers; ORTIZ, Rafael Scorsatto. Perfil nacional de apreensões de agrotóxicos pela Polícia Federal. Revista Brasileira de Criminalística, v. 7, n. 1, p. 21-25, 2018.

MALAQUIAS, K. A. O. INTELIGÊNCIA TERRITORIAL NO MONITORAMENTO DA ENTRADA DE AGROTÓXICOS ILEGAIS NO BRASIL. Orientador: Prof.ª Dra. Simone Machado Goulart. 2022. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Química) - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, Itumbiara, GO, 2022.

MCCOY, Terrence. In agricultural giant Brazil, a growing hazard: the illegal trade in pesticides. The Washington Post, Fev. 2020. Disponível em:<https://www.washingtonpost.com/world/the_americas/in-agricultural-giant-brazil-a-new-and-growing-hazard-the-illegal-trade-in-pesticides/2020/02/09/2c0b2f2e-30b3-11ea-a053-dc6d944ba776_story.html>. Acesso em: 02/04/2024.

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