CI

Rotulagem de OGM: regra excessiva e injusta


Reginaldo Minaré

                     Publicado em 24 de abril de 2003, o Decreto nº 4.680, que disciplina a rotulagem de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados – OGM, representa de maneira fiel o discurso do presidente Lula e de grande parte dos integrantes do Partido dos Trabalhadores ao longo do primeiro ano à frente do governo federal. Falando e agindo como se até aquele momento, especialmente no campo da regulamentação da engenharia genética, tudo que havia sido feito deveria ser substituído, mudaram o decreto que regulamentava a rotulagem de OGM e enviaram ao Congresso Nacional projeto de lei propondo novo marco regulatório para a realização de atividades com OGM e derivados de OGM.

O decreto, que não dependia da aprovação do Congresso Nacional, foi publicado pelo presidente Lula contendo integralmente em sua redação o que julgou ser necessário à boa administração do tema. Já o projeto de lei que objetivava instituir novo marco regulatório para as atividades com OGM e transformar a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio em mero órgão figurativo, foi integralmente modificado pelo Parlamento, o que resultou no fortalecimento da CTNBio e na instituição de uma Lei de Biossegurança bastante eficaz e funcional.

Por um lado temos uma Lei de Biossegurança razoável que não obstaculiza o desenvolvimento científico e tecnológico. Por outro, um decreto que regulamenta a rotulagem de transgênico fortemente impregnado por comandos de origem ideológica e não técnica e que, claramente, tem por objetivo dificultar o processo de comercialização de OGM e seus derivados, amedrontar e desestimular o consumidor no momento da compra de um produto que contém ou foi produzido a partir de OGM.

Estabelecido pelo Decreto nº 4.680/03 e complementado Portaria n° 2.658/03 do Ministério da Justiça, o sistema de rotulagem de OGM mantém dois comandos de fundo ideológico que, por agredirem a razoabilidade e a racionalidade, dificultam e até impedem sua efetiva aplicação. Exigir que animais alimentados com ração que continha ingredientes transgênicos e produtos produzidos a partir desses animais recebam rotulagem especial para informar o consumidor desses fatos não é razoável. O que dizer a respeito do comando que exige que a rotulagem especial para alimento e ingrediente alimentar destinado ao consumo humano ou animal vendido embalado ou a granel, que contenha ou foi produzido a partir de OGM, seja incrementada com a inclusão, em destaque, de um triangulo com fundo amarelo contendo a letra T em seu interior?

Exigir que o empresário da indústria de alimentos, que usou OGM ou derivado de OGM já aprovado pelo Estado para uso alimentar na composição do produto que colocará à venda, afugente seus clientes com a introdução, no rótulo do produto, de um símbolo que está mais apto a indicar advertência na sinalização de trânsito do que um tipo de alimento é, no mínimo, irracional.

Como exercício de direito comparado, cabe observar que na União Européia o tema foi disciplinado de forma profissional. O Regulamento nº 1829/2003 do Parlamento Europeu, deixou claro que os produtos obtidos a partir de animais alimentados com alimentos geneticamente modificados ou tratados com medicamentos geneticamente modificados não estarão sujeitos aos requisitos da autorização nem de rotulagem nos termos estabelecidos pelo mencionado regulamento. Além disso, o legislador europeu não exigiu a introdução de símbolo semelhante ao que é exigido pela norma brasileira nos produtos que são vendidos na União Européia.

Evidente, portanto, que manter o sistema de rotulagem de OGM hoje vigente é insistir no desregramento, na inexatidão, no desacerto.
 
 
Reginaldo Minaré
Advogado e Diretor Jurídico da ANBio

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.