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Recuperação Judicial ou Extrajudicial: qual a opção adequada?


José Osvaldo Bozzo
mpresas em graves dificuldades financeiras têm, a rigor, duas alternativas para tentarem se reerguer: a Recuperação Judicial (RJ), ou a Extrajudicial (RE). Vários são os objetivos da recuperação judicial, aprovada pela Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.


Dentre elas, a de viabilizar a superação da crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estimulo à atividade econômica.

Não iremos aqui esgotar o assunto, muito menos opinar sobre qual das alternativas deve ser adotada. Pretendemos, na realidade, dar apenas uma sinopse daquilo que se deve atentar quando da tomada de decisão, pois alguns aspectos que consideramos relevantes, se não observados sob os mais diversos prismas, poderão impactar negativamente e diretamente nas expectativas de todos os interessados, na medida em que estejam envolvidos na negociação, sejam aqueles que atuam como consultores, ou, ainda, os contratados para atuarem como advogados de devedores ou credores.

Confesso que não me apraz tratar de determinados assuntos corporativos que tendem a imolar empreendimentos que, construídos ao longo do tempo, vieram a se tornar inviáveis, independentemente das razões que levaram a esta condição. O fato é que devemos, nestas circunstâncias, tomar providências e esperar que atitudes transparentes sejam adotadas. Cada empresa, nessa situação, deverá encarar o problema de frente e decidir qual o modelo a ser seguido.

A Recuperação Judicial é uma alternativa com grau de risco elevado, razão pela qual é fundamental que seja precedida de uma avaliação detalhada e criteriosa. Impensável imaginar que a adoção desta medida poderá ser a solução para todos os casos, nem um medicamento que cure todas as moléstias que uma empresa possa sofrer.

A RJ trata-se, a rigor, de uma construção de medidas que tendem a auxiliar as empresas a superarem seu endividamento. Eis que a legislação estabelece diversas modalidades de operações, soluções e negócios que tendem a constar do Plano de RJ para apreciação dos credores. Um fato de extrema relevância é que o Plano a ser apresentado tenha por objetivo colimado a real viabilidade de sua execução, e, portanto, necessita ser viável no seu cumprimento, mormente que atenda aos anseios e interesses não só dos credores, como também da empresa.

Em outras palavras, se o Plano for inviável, seja pelo fato de não atender aos interesses dos credores, ou por privilegiar determinada classe, estes credores certamente irão recusá-lo, gerando, consequentemente, ao juiz determinar a decretação da falência da empresa. A RJ costuma ser relativamente complexa sob o ponto de vista operacional. E mais: muitas vezes é difícil de ser posta em prática, pois se trata de uma opção de alto risco. Se para a empresa pode ser uma alternativa benéfica, para os credores, via de regra, não o é.

A lei que regula a RJ, em muitas de suas disposições, é ingrata de ser aplicada, dependendo de cada contexto (grau de risco) e do prisma que se observa, na medida em que se vão observando determinadas circunstâncias peculiares de cada empresa. De difícil entendimento, como já dissemos, a legislação da RJ, aliada ao grande volume de trabalho a que são submetidos os juízes, contribui para a fragilidade de sua aplicação. É certo que a lei existe e está aí para ser aplicada, porém, com muitas dúvidas e controvérsias na sua amplitude de aplicabilidade. Já em relação à RE, temos uma solução mais "simples", já que a empresa devedora irá negociar diretamente com os credores.


Feito isso, o Plano vai direto para o Judiciário a fim de ser homologado. É uma alternativa mais rápida e, a rigor, mais "em conta" sob o ponto de vista financeiro. Outro ponto atrativo dessa alternativa é que, diferentemente da RJ, ela não precisa ser unânime entre os credores, além de que os dispêndios para a sua efetivação são muito mais favoráveis, haja vista tratar-se de uma solução mais tempestiva, menos burocrática e mais amigável sob o ponto de vista negocial. Nesses casos, sem dúvida alguma, o devedor costuma ter uma proximidade maior com os credores.

Isto pode acabar facilitando a negociação. Basta apenas à empresa apresentar um plano e encaminhá-lo à assembléia para, juntos, credores e devedor, decidirem com mais tranquilidade e tempo, já que na RE não há limite de prazo para pagamentos. Nesta modalidade de negociação, a dívida pode ser amortizada em dez anos ou até mais, dependendo do que for proposto pelas partes.

A RJ, como costumam dizer alguns doutrinadores, por mais pragmática que possa aparentar, há de se ter muita cautela antes de ingressar nesta seara. Dificuldades ocorrerão, e é por esta razão que a empresa deverá estar munida de estratégias bem elaboradas, conhecimentos detalhados das normas legais, além de que haverá a necessidade de um amplo acompanhamento de assessores no sentido de que o plano seja discutido e que soluções sejam evidenciadas de maneira clara e objetiva.

Do contrário, estaremos diante de um possível fracasso e, por certo, a decretação da "falência múltipla" de todos os órgãos setoriais da devedora. Depreende-se do exposto acima que o tema é complexo e, portanto, difícil de esgotar todas as nuances que poderão advir no caso do ingresso em uma recuperação. São pontos de extrema relevância que não podem ser desconhecidos, tampouco subestimados na avaliação de cada caso.

Cada empresa possui situações peculiares e, por esta razão, deve ser tratada de modo a dar continuidade aos seus negócios. Tentar simplesmente enveredar para o caminho da RJ, tendo em mente tratar-se de uma alternativa segura e de fácil resolução, pode não ser a forma mais adequada. Eis o motivo pelo qual existe a RE e que, num primeiro momento, aparente ser muito mais atrativa à RJ, pois, em não se conseguindo junto aos credores um amplo acordo informal, aí sim deve a empresa partir para um plano 'B', que representa o RJ tradicional, porém numa seara muito mais arrojada, lembrando que a estratégia de RE pode, eventualmente, expor a empresa a medidas judiciais, por parte dos credores, que, no caso da RJ seria tecnicamente impraticável. Não há negócios sem que haja riscos.

Com o instituto da RJ ou da RE não é diferente. Porém, é preferível, em uma situação de iminente falência, apostar a recuar. Problemas dessa natureza devem ser resolvidos o quanto antes, e, por se tratar até de uma questão social, há de merecer um nível de segurança e de cuidados especiais por parte do Judiciário, na certeza de que os ventos soprem a favor de todos, pois a recuperação não tem caráter de ressurreição, mas, sim preventivo, devendo ser concedido somente às empresas viáveis.

* José Osvaldo Bozzo é sócio da área de Tributos da KPMG no Brasil.

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