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O futuro do etanol hidratado


ANDRE MARQUES VALIO
A discussão que venho propor neste artigo é bastante controversa, mas precisa ser encarada pelo setor produtivo e pela sociedade.
Nos grupos de discussão que abordam a temática do setor sucroenergético e também na mídia tem se falado muito a respeito da política predatória praticada pelo Governo Federal, mantendo os preços dos combustíveis descolados do mercado internacional sob a justificativa de inibir a pressão inflacionária.

Mas o que não tem chegado à grande mídia é que está havendo uma profunda mudança no perfil de produção de etanol nas usinas.
As unidades produtoras estão convertendo aceleradamente, na medida que conseguem obter recursos para investimentos, a sua capacidade de produção de etanol de hidratado para anidro.
Na época do Proálcool, a melhor relação de custo de produção para a utilização do etanol como carburante era o etanol hidratado (AEHC) com teor alcoólico de 92.6%. Entretanto, a tecnologia de destilação evoluiu muito. Naquela época, produzir etanol anidro dependia de colunas de benzeno, um produto que representava sérios riscos à saúde humana. Posteriormente, surgiram as colunas que utilizavam ciclo-hexano, um insumo oneroso, mas que apresentava muito mais segurança.
Nos dias de hoje, temos as novas colunas de destilação que estão baseadas no conceito de peneira molecular, onde os custos de operação são muito menores, pois dispensam a utilização do ciclo-hexano.
O carro flex transferiu ao consumidor o poder de escolha. A decisão está agora baseada na relação de preço entre AEHC e Gasolina C. Por isso, embora os preços do AEHC estejam regidos pelas leis de mercado, na prática isto é uma grande farsa, já que os preços da Gasolina C são regulados e constituem um teto intransponível para os preços do etanol. Porém na outra ponta, não existe uma política de preços mínimos para o combustível verde.
Por isso etanol hidratado é cada vez menos interessante de ser produzido pelas usinas e nas bombas a demanda vai se reduzindo a medida que a demanda por anidro cresce.
Considerando a tecnologia dos veículos flex fuel e considerando que o etanol anidro reduz os problemas de corrosão proporcionados pelo etanol hidratado, poderíamos pensar em uma conversão planejada e coordenada de toda a capacidade de produção do setor em anidro, quando falamos em carburantes.
Deveríamos incentivar pesquisas que demonstrem qual o consumo de veículos se estes utilizassem exclusivamente etanol anidro e o etanol hidratado nos motores com diferentes taxas de compressão. Os estudos do Proálcool foram baseados em veículos que tinham taxas de compressão de 7:1 a 9:1. Hoje as taxas de compressão variam entre 11:1 a 13:1. O que muda completamente o comportamento dos motores com diferentes combustíveis.

Como sugestão, poderíamos partir de padrões internacionais, tais como a proposta a proposta abaixo:
a) Gasolina C: 72% a 87% Gasolina A + 13% a 28% Etanol Anidro
b) Etanol C: 0% a 15% Gasolina A + 85% a 100% Etanol Anidro
Nestas novas configurações, seria possível planejar muito melhor a oferta de etanol, pois este depende do rendimento agrícola da cana-de-açúcar, onde podemos ter anos com clima muito favorável e consequente maior produção, mas também poderíamos ter o inverso, tal como um ano com anomalias, onde se encaixaria perfeitamente a estiagem prolongada em boa parte do Centro-Sul no primeiro trimestre de 2014, reduzindo a oferta de matéria-prima para a produção de combustível.
Se temos um ano com alta disponibilidade de produzir etanol, adotaríamos o cenário de 28% de etanol na gasolina C e produziríamos o etanol C com 100% de etanol. Se a oferta do produto se reduz, iniciamos um processo de redução gradativa do percentual de etanol até o limite de 13% na gasolina C e 85% no etanol C. Em outras palavras, estaríamos criando tanto para o etanol como para a gasolina uma banda de 15% que absorveria todas as variações geradas por fatores exógenos.
Tendo as bandas de mix etanol:gasolina definidas, a política de preços dos combustíveis estaria na mesma base. Neste sentido, a discussão seria em desregulamentar os preços da gasolina ou regulamentar os preços do etanol, de forma que ambos os produtores possam ser remunerados de forma racional e não-destrutiva.
Sem uma política clara de biocombustíveis, nos restará apenas lembrar com saudade de um passado heróico e glorioso, quando éramos o maior produtor mundial de energia renovável para uso veicular.
 

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