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As competências atribuídas à CTNBio são constitucionais


Reginaldo Minaré

Logo após a publicação da Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005), que regulamenta as atividades e produtos oriundos da engenharia genética, o Procurador-Geral da República, em 26 de junho de 2005, propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 3526, para suspender a eficácia de diversos dispositivos da Lei nº 11.105/05 e, ao final, declarar a inconstitucionalidade dos artigos, incisos e parágrafos contestados. Atualmente a ADI aguarda voto do relator no Supremo Tribunal Federal.

Dos dispositivos atacados destacam-se os incisos IV, VIII, XX e § 1º do artigo 14 da Lei 11.105/05. O inciso IV atribui competência à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio para analisar a avaliação de risco, caso a caso, de atividades e projetos que envolve organismo geneticamente modificado – OGM e derivado de OGM; o inciso VIII atribui competência à Comissão para autorizar, cadastrar e acompanhar as atividades de pesquisa com OGM ou derivado de OGM; o inciso XX confere à CTNBio competência para identificar atividades e produtos decorrentes do uso de OGM e seus derivados potencialmente causadores de degradação do meio ambiente ou que possam causar risco à saúde humana; e o § 1º que afirma que quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio vincula os demais órgãos e entidades da administração. Também cabe ressaltar o artigo 37 da Lei 11.105/05, que modifica a descrição do Código 20 do Anexo VIII da Lei nº 6.938/81 para compatibilizá-lo com o comando contido no inciso XX do artigo 14 acima mencionado.

Na ADI, o Procurador-Geral argumenta que com a publicação da Lei de Biossegurança, ocorreu a quebra do Sistema Nacional de Meio Ambiente, a fragmentação do processo de licenciamento ambiental e flagrante inconstitucionalidade perante o que é disposto pelo artigo 225, §1º inciso IV da constituição Federal.

Complementando a fundamentação de seu pedido, o Procurador-Geral da República afirma que todo OGM, pelo simples fato de ser OGM, é, em princípio e por natureza, potencialmente causador de significativo impacto ambiental. Entretanto, o Procurador-Geral não indica o estudo no qual fundamenta sua afirmação. Dessa forma, tal argumento não passa de opinião pessoal desprovida de qualquer respaldo científico.

Analisando os argumentos jurídicos do Procurador-Geral, constata-se que, de fato e com devido respeito, ele não compreendeu os comandos contidos na Lei nº 11.105/2005. Não ocorreu quebra do Sistema Nacional de Meio Ambiente, que continua como antes da publicação da Lei de Biossegurança se encontrava, nem houve fragmentação do processo de licenciamento ambiental, visto que a CTNBio não realiza nenhuma atividade relacionada ao processo de licenciamento ambiental, no qual pode ou não ser exigido estudo de Impacto Ambiental ou outros estudos.

A Lei de Biossegurança não fez outra coisa senão inserir, com o método de análise caso a caso, a razoabilidade no processo de avaliação e aprovação das pesquisas e uso de OGM. A legislação ambiental, especialmente a descrição do Código 20 do Anexo VIII da Lei nº 6.938/81, estabelecia de maneira aprioristica, dogmática e sem qualquer fundamento científico, que todo OGM, pelo simples fato de ser OGM, seria, em princípio e por natureza, potencialmente causador de significativo impacto ambiental e, portanto, passível de exigência de licenciamento ambiental.

Com a criação da CTNBio e a introdução da metodologia de análise caso a caso, a Comissão, que é interdisciplinar, pode, no processo de análise de risco, identificar a atividade com OGM ou derivado que possa ser potencialmente causadora de degradação do meio ambiente. Identificada essa característica, a CTNBio encaminha o processo ao órgão competente do Ministério do Meio Ambiente para que se proceda o licenciamento ambiental da atividade.

Resta claro, portanto, que a Lei de Biossegurança, ao disciplinar o tema com maior razoabilidade, muito contribuiu para conferir maior eficiência à administração pública, que é um princípio básico exigido pelo artigo 37 da Constituição Federal - CF. Por outro lado, o legislador, ao disciplinar o tema por meio de lei, outra coisa não fez senão atender ao comando previsto no inciso IV do § 1º do artigo 225 da CF, que exige que o assunto seja disciplinado na forma da lei. Nesse caso, foi disciplinado na forma da Lei de Biossegurança.

Também cabe ressaltar o questionamento do artigo 30 da Lei 11.105/05, que garante a manutenção da validade das decisões da CTNBio emitidas antes da publicação da Lei nº 11.105/05. Nesse ponto, verifica-se que o Procurador-Geral fere a garantia jurídica que se espera de um Estado Democrático de Direito. Inconstitucional, nesse caso, é o pleito do Procurador-Geral e não o dispositivo contido na Lei de Biossegurança.

Resta claro, portanto, que o sistema de biossegurança de OGM, que foi instituído pela Lei nº 8.974/1995 e mantido com poucas modificações pela Lei nº 11.105/2005, encontra-se em total harmonia com a CF e com a legislação ambiental. Além disso, a CTNBio vem desempenhando suas competências no âmbito da biossegurança de maneira irrepreensível. Até o momento, não foi registrado nenhum acidente ou dano ao meio ambiente, à saúde humana ou animal.

Efetivamente a ADI proposta não deve prosperar por falta de fundamentos jurídicos sólidos e convincentes.

 

Reginaldo Minaré
Diretor Jurídico da ANBio

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