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Agricultura sustentável: entre teoria e prática


Reginaldo Minaré

                        Atualmente, a expressão "desenvolvimento sustentável" aglutina em seu significado conceitual a preocupação da humanidade com a situação ambiental e social no planeta.

Indubitavelmente, o termo sustentabilidade representa uma daquelas palavras que as pessoas acostumam com o seu uso, mas não se preocupam muito com a definição de seu significado e quando são solicitadas a apresentarem uma definição, constatam que não possuem grande segurança para discorrer sobre o tema.

Situação é semelhante ao que ocorre com palavras como justiça, liberdade, felicidade, igualdade e outras mais que são termos conceituais e têm provocado, ao longo da história, longas reflexões e grandes discussões filosóficas em torno de seus significados.

Indicando a preferência e a necessidade de um modelo de desenvolvimento econômico e social comprometidos com o respeito ao meio ambiente, a expressão "desenvolvimento sustentável" se faz presente na pauta das mais variadas instituições.

Impulsionada pelos movimentos estudantis e hippies dos anos 1960 a preocupação com o meio ambiente ganhou o mundo e fez emergir o novo ambientalismo. As discussões ganharam intensidade e pesquisadores do "Clube de Roma" publicaram, em 1972, o estudo Os limites do crescimento. Nesse estudo, ganha destaque as quatro questões consideradas necessárias a sustentabilidade: O controle do crescimento populacional; o controle do crescimento industrial; a insuficiência da produção de alimentos e o esgotamento dos recursos naturais. Logo após, também em 1972, a Organização das Nações Unidas - ONU promoveu a Conferência sobre o Meio Ambiente em Estocolmo.

Em 1973, o canadense Maurice Strong lançou o conceito de eco-desenvolvimento, para o qual os principais princípios ou caminhos do desenvolvimento seriam: preservação dos recursos naturais e do meio ambiente; solidariedade com as gerações futuras; participação da população envolvida; satisfação das necessidades básicas; elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social e respeito a outras culturas; e programas de educação. A palavra eco-desenvolvimento foi rapidamente substituída pela expressão desenvolvimento sustentável. Boa de marketing, a expressão ganhou o mundo.

Em 1974 foi publicada a Declaração de Cocoyok, resultado da reunião da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento, onde se afirmava que a causa da explosão demográfica era a pobreza, que também gerava a destruição desenfreada dos recursos naturais.

Já em 1975 a ONU voltou a participar da elaboração de outro relatório. Preparado pela fundação Dag-Hammarskjöld, este relatório fez duras criticas às potências coloniais.

No ano de 1987 a Comissão Mundial da ONU sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento apresentou um documento chamado Our Common Future – Nosso futuro comum -, mais conhecido como relatório Brundtland, contendo um conceito de desenvolvimento sustentável. Segundo o relatório, desenvolvimento sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades.

Posteriormente, documentos como a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinada em Nova York em 9 de maio de 1992, e a Convenção sobre Diversidade Biológica, assinada no Rio de Janeiro em 05 de junho de 1992, defendem esse modelo de desenvolvimento.

Na primeira década do século 21, a questão do desenvolvimento sustentável se tornou uma preocupação mundial. A expressão tem sido usada e explorada à exaustão por ambientalistas, políticos, jornalistas, técnicos e empresários.

Entretanto, em que pese a aparente clareza do conceito, o uso da expressão de maneira generalizada e na maioria das vezes desprovida de um referencial concreto que sirva como exemplo de sua prática, tem gerado dúvidas acerca de seu verdadeiro sentido e forma de realização, sendo, em alguns casos, utilizada como fundamento para criticas feitas a determinados sistemas produtivos e imposição de barreiras comerciais aos produtos.

Recentemente o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton, convidado de honra do evento Ethanol Summit 2009, avaliou que o Brasil ainda precisa provar para o mundo que é capaz de produzir combustível renovável de forma sustentável. O que deveria ser feito para demonstrar, para provar ao mundo? Quais os elementos que ainda não foram considerados?

Diante, portanto, de um conceito que envolve assuntos de grande envergadura como atividade econômica, preservação ambiental, relações trabalhistas e bem estar social das gerações atuais e futuras, quais são ou qual é o entendimento e a orientação adequada para a aplicação do conceito contido na expressão desenvolvimento sustentável na realização das mais variadas atividades humanas, especialmente nas práticas agrícolas?

Especificamente sobre a questão ambiental, além dos temas clássicos como desmatamento, mata ciliar, queimadas e reserva legal, o debate sobre o aquecimento global introduziu nova variável, a redução de emissões.

Em Copenhague o Brasil apresentou sua meta de redução de emissões e não deverá ampliar o que foi proposto, visto que a proposta foi bem recebida e, inclusive, com certo grau de surpresa.

A proposta brasileira consta da Lei 12.187, de 29 de dezembro de 2009, que instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC. O artigo 12 da referida lei estabelece que: "Para alcançar os objetivos da PNMC, o País adotará, como compromisso nacional voluntário, ações de mitigação das emissões de gases de efeito estufa, com vistas em reduzir entre 36,1% (trinta e seis inteiros e um décimo por cento) e 38,9% (trinta e oito inteiros e nove décimos por cento) suas emissões projetadas até 2020". Por sua vez, o parágrafo único do artigo 12 dispõe que a projeção das emissões para 2020 assim como o detalhamento das ações para alcançar o objetivo expresso no caput do artigo 12 serão dispostos por decreto, tendo por base o segundo Inventário Brasileiro de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases de Efeito Estufa não Controlados pelo Protocolo de Montreal, a ser concluído em 2010.

Inventário preliminar publicado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT, em novembro de 2009, indica que a agropecuária participa com 22% das emissões de gases de efeito estufa.

Mas só o movimento ambientalista levantou a bandeira da preocupação com o futuro da humanidade? Efetivamente não.

Quando o oncólogo americano Van Rensselaer Potter, no início da década de 1970, cunhou o vocábulo composto bioética, formada pelos radicais gregos que formam a palavra bios (vida) e éthos (comportamento, ética, conduta), sua principal motivação era criar um pensamento ético que contemplasse a preocupação com o futuro.

Contemporâneo de Potter, o filósofo judeu-alemão Hans Jonas, em sua obra "O princípio da responsabilidade", apresentou uma das melhores contribuições para o campo da bioética.

Preocupado não só com um apocalipse brusco oriundo dos riscos do progresso técnico científico global e de seu uso perverso, mas também com a possibilidade de um apocalipse gradual decorrente do efeito cumulativo das ações humanas, Jonas apresenta, paralelamente ao princípio kantiano de ética clássica, um imperativo para uma ética da civilização tecnológica: "age de tal maneira que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a permanência de uma vida humana autêntica".

Dentro desse universo plural e complexo, qual o conceito ou os conceitos que as instituições representativas dos agricultores poderiam adotar?

Adotando um ou mais conceitos, como as instituições orientariam a sua aplicação nas propriedades? Quais os elementos deveriam estar presentes no sistema produtivo do Sr. José para que sua atividade produtiva fosse considerada sustentável?

 

Reginaldo Minaré
Diretor Jurídico da ANBio

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