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A revolta dos tratores


Argemiro Luís Brum

O título acima é do jornal francês Le Monde Diplomatique (janeiro 2024). Trata-se do fato internacional mais relevante neste início de ano. Estamos falando da revolta dos produtores rurais europeus, membros da União Europeia, contra a rigidez das políticas ambientalistas locais, as quais estariam sufocando sua capacidade produtiva e colocando em xeque a sobrevivência da agropecuária local. Ela coloca em discussão todo o modelo de preservação ambiental que o mundo vem tentando pôr em prática. Se, por um lado, é verdade que o mundo precisa ajustar o seu sistema produtivo a uma lógica mais ecológica e ambiental, também é verdade que nenhum sistema agrícola de produção consegue subsistir, hoje, gerando alimentos suficientes ao mundo que pode comprar, sem o uso de produtos químicos e de tecnologia avançada. O grito dos produtores europeus é um alerta para se encontrar um remédio que não mate o paciente, e também chama a atenção para “o absurdo de um sistema que os faz contribuir a sua própria destruição”. Mas o quadro é ainda mais complexo! Quando da criação do bloco econômico europeu, em março de 1957, também criou-se a Política Agrícola Comum (PAC) que tem, como objetivo, proteger a produção primária local. Ou seja, a PAC tem claro cunho protecionista no contexto da economia global. A reação dos produtores europeus igualmente passa por aí. Não há interesse em abrir seus mercados para os produtos estrangeiros. E, se está “esgotada” a discussão tarifária a respeito, coloca-se em cena o protecionismo ambiental, ecológico, ou seja, as chamadas regras não-tarifárias as quais, há anos, alertamos que viriam. Isso liquidou a construção do acordo de livre-comércio entre União Europeia e Mercosul (grande parte dos europeus não o querem), que está em negociação há mais de 20 anos. O Brasil e a Argentina são grandes perdedores com isso. Por outro lado, o mundo precisará rever a radicalização quanto ao debate ambiental, pois se é preciso ajustar muitas práticas agropecuárias, é ainda mais necessário combater a poluição e o descaso junto às práticas urbanas, que são as que mais colocam em risco o meio ambiente mundial. E disso, pouco se fala. O meio rural, via União Europeia, estaria dando um basta a esta visão parcial da realidade, a qual coloca os agricultores em geral como inimigos.

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