CI

A aplicabilidade do Direito nas questões culturais


Opinião Livre
Artistas, produtores e gestores culturais já não buscam como outrora orientação jurídica para solucionar questões voltadas apenas ao direito autoral. Tornou-se necessário ao longo dos últimos anos a absorção e aplicação das normas obrigatórias que disciplinam todas as relações contidas nesse segmento produtivo de alta complexidade. Estes profissionais buscam hoje saber, efetivamente, onde começa e onde termina sua responsabilidade em relação ao fazer e fruir cultural.
A indústria da cultura e do entretenimento eclodiu e tomou conta da maioria das relações comerciais. O segmento se ampliou e se profissionalizou, deixando para trás a intuição e amadorismo que não prescindiam, na maioria das vezes, de atuação e prevenção no campo do Direito. Por essa razão, pensar a cultura de maneira sistematizada e organizada também na área jurídica, é essencial e taxativo no universo jurídico atual.
O direito rege o fazer artístico em vários aspectos, como por exemplo, por meio de normas que protegem as obras artísticas como propriedade de seus criadores, que regulamentam o exercício da arte como atividade profissional e que incentivam as produções culturais por meio de isenções fiscais. Em suma, a cultura e o entretenimento, enquanto verdadeiros e significativos ramos da atividade empresarial, precisam se submeter aos limites legislativos.
Assim, a oferta de bens e serviços no mercado cultural passou a ficar inteiramente dependente da lapidação e sistematização de uma gama instrumental normativa correlata à área. Para que isso fosse possível, diversas ramificações do direito adaptaram àquilo que já existia especificamente para esse universo, o que resultou num novo foco da atividade jurídica, chamado por muitos de Direito do Entretenimento – Entertainment Law, já consolidado em países como os EUA.
A economia da cultura é abrangente. A diversidade dessa área juntamente com sua profissionalização, com o aumento da formalização das relações que permeiam sua cadeia produtiva, o advento de novos meios de exploração e difusão do entretenimento, bem como o crescimento das produções culturais, contribui diretamente para uma maior especificidade dos modelos negociais culturais.
Torna-se indispensável, portanto, um alicerce ampliado de ferramentas jurídicas localizadas nos vários ramos do direito, para que se sustente todo o leque de relações jurídicas voltadas à criação, produção, distribuição, consumo e fruição de bens, serviços e atividades culturais. Em outras palavras, é preciso ter conhecimento jurídico necessário à prática da gestão e produção cultural.
A título ilustrativo, podem ser citadas as seguintes relações com algumas das áreas do Direito: no Direito Constitucional estão delineados os direitos culturais e princípios jurídicos os quais vinculam todas as relações jurídicas entabuladas no setor. No Direito Administrativo é possível destacar a fiscalização e regulamentação das atividades e manifestações culturais, bem como questões atinentes à concretização dos direitos culturais por meio da aplicação de recursos públicos, diretamente por meio de fundações, autarquias e órgãos estatais, ou então via repasses de recursos à iniciativa privada e entidades do terceiro setor.
Já no Direito Tributário, além das peculiaridades na incidência de tributos, há também a existência de diversos mecanismos de incentivo fiscal, que representam hoje grande importância na estabilidade do setor cultural. No que diz respeito ao Direito Internacional destaca-se a ampla circulação de bens e serviços culturais, além da contratação de artistas e produtores culturais estrangeiros e da importação e exportação de artefatos de diferenciado valor cultural.
Na seara da Propriedade Intelectual, além da indiscutível importância dos Direitos Autorais, também se explora o trato jurídico das marcas que dizem respeito aos eventos e produtoras culturais. Em Direito do Trabalho, abarcam-se todas as relações dos profissionais contratados para desempenho de atividades ligadas ao setor.
Ao Direito Civil cabe a contratação de todos os bens e serviços necessários ao regular desenvolvimento da economia cultural, aliado a conhecimentos específicos sobre os diferentes riscos e obrigações que permeiam as atividades dos profissionais da área. Ainda, não se poderia deixar de citar a atuação correlata ao advento da internet e demais avanços tecnológicos de armazenagem e transmissão de dados – TI.
Enfim, o amadurecimento do campo de trabalho em gestão cultural trouxe consigo a exigência de um maior conhecimento no campo jurídico das ferramentas de planejamento estratégico, dos instrumentos de políticas públicas, das fontes de financiamento, do gerenciamento de espaços culturais e do constante estudo sobre os temas relacionados aos conceitos contemporâneos do campo da cultura, demandando um perfil profissional específico capaz de atender aos anseios do campo de atuação dos diversos profissionais envolvidos na área cultural.
Por Marcella Souza Carvalho
Marcella Souza Carvalho é advogada, bacharel em Direito pela Unicuritiba e pós-graduanda em Produção da Arte e Gestão da Cultura pela PUCPR. Conselheira da área da Dança no CONSEC – Conselho Estadual de Cultura do Paraná, Conselheira do Fórum de Dança de Curitiba, Bailarina e professora de Dança, integrante da Cia. Flor de Lótus de Dança Oriental.  É associada do escritório Andersen Ballão Advocacia, sendo responsável pelo Departamento de Assuntos Culturais e Terceiro Setor.  

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.