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Sobre a proteção dos direitos relativos à propriedade intelectual no campo da biotecnologia.



Reginaldo Minaré

SOBRE A PROTEÇÃO DOS DIREITOS RELATIVOS À PROPRIEDADE INTELECTUAL NO CAMPO DA BIOTECNOLOGIA.

 

 

 

A Constituição Federal - CF dispõe, inciso XXIX do artigo 5º, que: “a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País”. Elaborada em um período que já havia começado a negociação, conhecida como Rodada Uruguai, que resultou na formatação da Organização Mundial do Comércio – OMC em substituição ao Acordo Geral de Tarifas e Comércio - GATT (sigla em inglês para General Agreement on Trades and Tarifs), e na elaboração do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio - TRIPS (sigla em inglês para Trade-Related Aspects of Intelectual Property Rights), a CF trouxe a  previsão de elaboração de lei para assegurar o direito à propriedade intelectual. Em abril de 1991, o Governo Brasileiro, atendendo ao comando constitucional, enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei n° 824/91 que deu origem à Lei nº 9.279, de 1996, conhecida como Lei de Patentes.

Entretanto, a citada Lei não esgotou os compromissos assumidos pelo Brasil na esfera internacional. O artigo 27, III, b, do Acordo TRIPs, exige que seus Membros concederão proteção a variedades vegetais, seja por meio de patentes, seja por meio de um sistema sui generis eficaz, ou por uma combinação de ambos. Como o Brasil, internalizou o Acordo TRIPs, assumiu o compromisso de realizar a proteção nos termos exigidos pelo Tratado.

Antes mesmo de promulgar a Convenção da União para a Proteção das obtenções Vegetais - Upov, mas em perfeita consonância com a mesma, foi publicada a Lei nº 9.456, de 1997, conhecida como Lei de Proteção de Cultivares, que entrou em vigor em abril de 1997. Assim, o Brasil cumpriu o previsto no Acordo TRIPs e criou o seu sistema sui generis de proteção das variedades vegetais.

Elogiadas por alguns e criticadas por outros, as ações do governo brasileiro no sentido de regulamentar o direito à propriedade intelectual e a proteção de cultivares, produziu um sistema normativo doméstico de proteção compatível com os compromissos internacionais assumidos.

Todavia, antes mesmo da popularização do funcionamento do sistema de patentes estabelecido, no que diz respeito às patentes no campo da biotecnologia, mais precisamente da biotecnologia oriunda da engenharia genética, a estrutura normativa nacional está desatualizada e, sob pena de ficar em descompasso com a maioria dos países desenvolvidos, sua revisão se faz necessária com certa urgência.

Ao dispor sobre o que não é patenteável, o artigo 18 da Lei de Patentes proíbe patentear o todo ou parte dos seres vivos, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade - novidade, atividade inventiva e aplicação industrial - e que não sejam mera descoberta; e explica que para os fins da Lei de Patentes, microorganismos transgênicos são organismos, exceto o todo ou parte de plantas ou de animais, que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais.

Diante, portanto, da redação restritiva da atual Lei de Patentes, pode-se concluir que neste campo o Brasil, mesmo com toda capacidade de seus cientistas e da invejável biodiversidade existente em seu território, está longe de ocupar uma posição de vanguarda.

Atualmente, muitos países desenvolvidos realizaram ou estão realizando a revisão de suas legislações, permitindo que sejam patenteadas plantas e animais geneticamente modificados, seqüências ou seqüências parciais de genes isolados do corpo humano, e linhagens obtidas a partir de células-tronco embrionárias e somáticas.

No Brasil, no que diz respeito às plantas, essa inovação jurídica é perfeitamente compatível com o sistema sui generis que foi adotado para a proteção de cultivares. Uma alternativa seria permitir a proteção por meio de patente da a planta geneticamente modificada ou evento de transformação genética, deixando a variedade sob a proteção do sistema de proteção de cultivares.

Com relação aos animais, caso um animal só possa ser obtido através da engenharia genética, excluindo qualquer cruzamento natural, a invenção relativa a este animal poderá ser patenteada. Assim, permite-se a patente do animal evento de transformação genética e não da raça do animal.

No que diz respeito à proteção por uma patente, de seqüências ou seqüências parciais de genes isolados do corpo humano, que pode ser considerada uma forma proteção semelhante à de substâncias químicas, o debate sobre o âmbito de abrangência de uma patente nessa área constitui uma questão econômica relevante, pois o assunto está diretamente ligado à busca do equilíbrio entre o investimento e a compensação para o pesquisador/inventor pioneiro.

Sobre a proteção por patente de linhagens de células-tronco, considerando o avanço da medicina brasileira no desenvolvimento de técnica de reconstituição de tecidos com células-tronco e que a Lei 11.105/05 legitimou o uso de células-tronco embrionárias em pesquisas, constata-se que o assunto tem grande relevância para o Brasil. Todavia, deve-se buscar tratar de forma diferenciada às linhagens obtidas de células-tronco pluripotentes e totipotentes, visto que apresentam vantagens e limitações acerca do potencial de uso.

Constata-se, portanto, que diante do avanço da produção do conhecimento no âmbito da engenharia genética e do implemento da moderna biotecnologia, o Poder Público brasileiro deve estar mais atento e agir com maior eficiência com relação às questões ligadas à evolução e as implicações do direito relacionado à propriedade intelectual no campo da engenharia genética.

 

 

 

 

Reginaldo Minaré

Advogado e Diretor Jurídico da ANBio.

[email protected]

 

 

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