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Contribuinte pagará a conta mais uma vez?


José Osvaldo Bozzo
A fúria por arrecadar recursos no Brasil tornou-se sistêmica, e os exemplos dessa tese são abundantes. Lamentavelmente, percebemos que nosso Estado encontra-se totalmente perdido, sem rumo, conduzido sem a valorização de um mínimo de senso político, econômico e social. 
Depois de o Governo Federal publicar a MP 685/15 – um contrassenso paradoxal diante do nosso sistema tributário, que busca obrigar as empresas a detalhar antecipadamente à Receita Federal como têm se ajustado organizacionalmente para dirimir os efeitos drásticos da excessiva carga tributária sobre suas finanças –, nossos gestores públicos agora tentam minimizar a dramática situação econômica do País com a “criação” de mais tributos. 
O excesso de impostos e contribuições, somado à desorganização política a que o Estado brasileiro é submetido, parece remeter a um único escuso e pouco inteligente propósito: o de retirar da Receita Federal a legitimidade  para normatizar e fiscalizar a ordem tributária do País. Sobretudo, e mais uma vez, por impingir novos “presentes de grego” à sociedade. Trata-se da famigerada desordem burocrática arrecadatória. 
Não bastassem hoje as imposições tributárias já existentes, agora, mais uma vez, cogita-se o retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) – ou de outra modalidade qualquer de oneração, como a criação de uma nova faixa de contribuição do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), ou a retomada das mordidas sobre os combustíveis, com retomada da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). 
Afinal, parece que o governo acredita não serem suficientemente onerosos o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o Programa de Integração Social (PIS), a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o Imposto sobre Serviços (ISS), entre os tantos outros que já pesam consideravelmente e prejudicam a competitividade e a sustentabilidade dos contribuintes.
Fato a ser consumado caso nada mude, tememos estar chegando a um coeficiente de coerção fiscal em que o contribuinte não terá outra alternativa a não ser recorrer sistematicamente aos Tribunais. Alegará ser vítima de confisco, haja vista a transformação de nosso sistema tributário em um mecanismo abjeto destinado simplesmente à arrecadação sistemática e desenfreada de mais e mais impostos a cada novo ciclo. 
A possível criação de determinado tributo, na pior das hipóteses, se justificaria se nosso governo pudesse nos evidenciar que referida exação tende a propiciar à sociedade, por meio de um orçamento e de uma gestão pública adequada, a demonstração de que todos os requisitos de eficiência, transparência e razoabilidade, a partir de metas pré-definidas, serão atendidos. 
Mas sabemos por experiência que não é o que tende a acontecer. Talvez o mais provável seja que eventual nova imposição fiscal tenha por objetivo uma “simples tributação” cuja função primordial, senão econômica e social de extrema relevância, seja corrigir desvios, desarranjos e desatinos que ocorreram nos últimos anos. 
O fato é que observamos a carga de tributos seguir subindo para financiar irresponsabilidades travadas nos últimos governos, resilindo qualquer aspiração de crescimento autossustentado. Afinal, gastar mal o dinheiro dos contribuintes sempre foi uma característica dos arquiduques de plantão. 
Como vimos, as despesas públicas cresceram de modo irracional e insustentável. Não obstante, ao que parece, é conveniente ao governo vir agora argumentar que a carga tributária destina-se a assegurar superávits primários ou a financiar o crescimento econômico. Se a primeira opção nos parece apropriada, embora só de fachada, considerando a baixa efetividade e qualidade do ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy; a segunda sequer deveria ser motivo de justificativas, pois o crescimento não depende de gastos públicos, mas de liberdade econômica, de leis severas (aplicação verdadeira da Lei de Responsabilidade Fiscal), transparência e, portanto, valores éticos, condições estas que há muito deveriam fazer parte de nossa cultura econômica, política e social. 
Não serão 30 ou 40 bilhões de reais anuais retirados dos exauridos bolsos dos contribuintes brasileiros que resolverão nosso desequilíbrio orçamentário, mesmo que venham a ser efetivamente destinados a investimentos sérios e ao pagamento de dívidas. O problema é muito mais complexo.
 *José Osvaldo Bozzo ([email protected]) é consultor tributarista e sócio da MJC Consultores. Formado em Direito, iniciou carreira na PwC. Foi também sócio da BDO e da KPMG e professor de Planejamento Tributário na USP – MBA de Ribeirão Preto.

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